A decisão é uma consequência do papel da NRA para os morticínios que afligem periodicamente o país

San Francisco, uma das principais cidades dos Estados Unidos, aprovou no dia 3 uma resolução considerando o assim chamado Cartel do Rifle, Associação Nacional do Rifle (NRA, na sigla em inglês), como “organização terrorista doméstica”.

A medida foi decidida pelo órgão legislativo da cidade, o Conselho de Supervisores, e também estabelece que “a Cidade e o Condado de San Francisco deveriam tomar todos os passos razoáveis para limitar que as entidades que têm negócios com a cidade e o condado mantenham negócios com esta organização terrorista doméstica”.

Conforme o Conselho, a decisão é uma consequência do papel da NRA para os morticínios que afligem periodicamente o país, com inúmeras vítimas inocentes, o que se agravou ultimamente com atos de caráter abertamente xenófobo. A resolução foi apresentada após o tiroteio de massa de 28 de julho no Festival gastronômico de Gilroy, no norte da Califórnia, no qual três pessoas, inclusive duas crianças, foram mortas e 17 ficaram feridas.

A que se seguiu o massacre no shopping center Walmart em El Paso, Texas, em 3 de agosto, com 22 mortos. Mais nove em Dayton, Ohio, no dia seguinte. E outros sete em Odessa e Midland, Texas, no dia 31 de agosto.

Como denunciou a conselheira Catherine Stephani, em entrevista a uma emissora de tevê de Oakland, “pessoas estão morrendo todos os dias neste país” e é isso o que a NRA continua fazendo”. Ela acrescentou que a omissão diante disso “não é uma opção”.

A resolução assinala que a Associação Nacional do Rifle usa “sua considerável riqueza e força organizacional para promover a posse de armas e incitar os possuidores a atos de violência”.

Acrescenta ainda que a NRA “espalha propaganda que desinforma e visa enganar o público sobre os perigos da violência com armas e promove posições extremistas”, em desafio à visão do público e até mesmo da maioria dos seus membros, e “minando o bem estar geral”.

A repercussão dos últimos massacres, como o de El Paso, em que imigrantes foram feitos de alvos, levou o Walmart a solicitar que seus clientes não exibam abertamente armas de fogo em suas lojas. Iniciativa que já foi seguida pela rede de supermercados de Cincinnati, Kroger.

A perfunctória medida já havia sido adotada em março pela Dick’s Sporting Goods, em 125 de suas 700 lojas, e agora deve ser acompanhada pela Starbuck, Target e Wendy’s.

Como é amplamente sabido, nos EUA é mais fácil comprar um fuzil semi-automático, uma arma de guerra, do que uma latinha de cerveja, dependendo da idade. Adquirir um adaptador que permite disparar como se fosse metralhadora, sem dificuldade e praticamente sem checagens.

Os anos se passam, e tudo continua do mesmo jeito, apesar da indignação que periodicamente atinge grandes parcelas da população, quando algum atentado armado desses maníacos causa especial comoção.

Nem escolas ou cinemas são poupados. Há dois anos, uma grande manifestação da juventude em Washington repudiou a carnificina que não cessa. Também não para a desova de dinheiro do NRA em candidaturas comprometidas com o gatilho fácil.

O que reflete a doença incurável que permeia a sociedade norte-americana, depois de anos e anos de massacres, primeiro de índios – “o índio bom é o índio morto”-, depois nas ex-colônias espanholas, e então nas guerras de agressão que desencadeou, e seus féretros de Mi Lais.

É insânia perpetrada no estrangeiro para submeter os outros povos, que volta para ciscar em casa, com a NRA lucrando a rodo em cima dessas tragédias.

Não deve ser por acaso que seu presidente atual é nada menos que Oliver North, um dos operativos de Bush Pai contra a Nicarágua e seu povo, e notório no escândalo Irã-Contras.

Para um porta-voz do Cartel do Rifle, a decisão de San Francisco de considerá-lo uma “organização terrorista doméstica” é uma “encenação ridícula” e fuga dos problemas reais, como “os sem-teto, o abuso de drogas e a disparada de pequenos crimes”.

Prometeu que a NRA “continuará trabalhando para proteger os direitos constitucionais de todos os americanos amantes da liberdade” – isto é, fazendo apologia da violência e da revanche, assim como do sacrossanto direito do cartel de seguir subornando a rodo para manter seu lucrativo e sangrento negócio em operação.

Sobrou até para o Walmart, a quem o NRA acusou de “ter escolhido vitimizar americanos cumpridores da lei, ao invés de pôr a culpa nos criminosos”. E o Walmart só pediu discrição aos portadores de rifles. Para, provavelmente, que ninguém comece a correr antes da hora.

Há três semanas, uma manifestação em Fairbanks, diante da sede da NRA, perturbou o sossego da organização terrorista doméstica, com participantes exibindo cartazes como “NRA mata crianças”, “47 crianças mortas a cada dia”, “Mercadores da Morte”, “Armas fazem ser fácil matar” e “Banam as armas de ataque”.