Após 30 anos, o massacre do Carandiru voltou ao noticiário nesta semana em duas situações bastante divergentes, que refletem o momento vivido pelo país. Nesta quinta-feira (4), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, rejeitou recurso da defesa dos 74 policiais condenados, que buscava reverter a sentença. Já na terça-feira (2), a Comissão de Segurança Pública da Câmara aprovou projeto de lei prevendo anistia aos policiais. O projeto é de autoria de um deputado bolsonarista. E agora, diante da decisão de Barroso, a bancada da bala busca acelerar a tramitação do PL.

O massacre ocorreu em 1992, resultando na morte de 111 presos. O julgamento dos policiais envolvidos só aconteceu entre 2013 e 2014 e em 2018 foi anulado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. A condenação foi restabelecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2021 e a defesa recorreu ao STF que, agora, manteve a condenação.

Dois dias antes, a Comissão de Segurança Pública da Câmara aprovou o projeto, de autoria do deputado Capitão Augusto (PL-SP), que estabelece a anistia  “aos agentes de segurança pública do estado de São Paulo processados ou punidos por condutas decorrentes da ação para a contenção da rebelião”.

Nesta quinta-feira (4), o parlamentar encaminhou ofício ao presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Arthur Maia (União Brasil-BA) solicitando prioridade para a matéria. Ele também está buscando assinaturas para requerimento de urgência, para que o projeto vá diretamente ao plenário.

Segundo o deputado, o presidente Jair Bolsonaro (PL) poderá fazer um “pedido especial” junto à sua base pela aprovação do projeto e poderia, inclusive, apelar para um indulto de fim de ano caso a matéria não prospere no Congresso.

Lei não pode encobrir crimes

Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) destacou, segundo o Congresso em Foco, que o “Código Penal prevê os excludentes de ilicitude, que incluem o estrito cumprimento do dever legal. Se houve a condenação, é porque se verificou que o que se fez ali foi uma matança”. Ele argumentou ainda que a lei pode retroagir, “mas não para encobrir crimes como esses que, inclusive, já transitam em julgado”.

Orlando salientou ainda a “total assimetria na relação entre as partes” durante a operação que resultou na morte de 111 detentos e completou: “Houve uma invasão violentíssima, houve uma chacina que repercutiu no mundo inteiro e envergonhou o país. O Congresso Nacional passar pano para uma brutalidade dessa viola a legislação final”.

O médico Jamil Murad, que na época do massacre era deputado estadual do PCdoB em São Paulo, foi o primeiro parlamentar a visitar a penitenciária logo depois do massacre, a pedido da Comissão Justiça e Paz. Ele destacou que “não existe no Brasil lei permitindo que a polícia cometa esse tipo de crime que, no entanto, é praticado diariamente”.

Murad argumenta que a sociedade busca proteger e inocentar agentes públicos de segurança que cometem assassinatos contra populações empobrecidas e marginalizadas. “Isso simboliza como a elite dominante no Brasil vê o pobre, aquele que cometeu algum crime”.

Para ele, se a anistia for concedida, será “um mau uso do mandato parlamentar” por ignorar tanto a lei quanto as decisões das cortes supremas que confirmaram a condenação.

O ex-deputado concluiu dizendo que para Bolsonaro e seus apoiadores, episódios como o massacre do Carandiru não é crime. “Bolsonaro sempre defendeu a violência e a eliminação de determinados grupos. O bolsonarismo infelizmente criou um clima de violência e de estupidez na sociedade”.

 

por Priscila Lobregatte