Câmara aprova projeto que ratifica convenção contra o racismo
O projeto que ratifica a Convenção Interamericana contra o Racismo (PDC 861/17), que oferece status constitucional a políticas públicas de prevenção e punição de condutas racistas, ações afirmativas, promoção da igualdade de oportunidade na educação e no trabalho e diversidade no sistema político, foi aprovado pela Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (9).
Texto foi aprovado em primeiro turno por 414 votos a 39 e, em segundo turno, por 417 votos a 42. A matéria segue para apreciação do Senado.
A Convenção é o primeiro documento internacional juridicamente vinculante que condena a discriminação baseada em orientação sexual, identidade e expressão de gênero. Ou seja, os países que ratificarem o acordo devem se comprometer a prevenir, proibir e punir todos os atos e manifestações de racismo, discriminação e de intolerância.
Aprovado pelas comissões da Câmara desde 2018, o documento define a discriminação racial como toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha por objeto ou resultado anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em igualdade de condição de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública.
O texto trata ainda da intolerância, conceituada como “um ato ou conjunto de atos ou manifestações que denotam desrespeito, rejeição ou desprezo à dignidade, características, convicções ou opiniões de pessoas por serem diferentes ou contrárias”.
Segundo o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que presidiu a sessão do Plenário, a votação da proposta marcou um momento histórico e muito simbólico, tendo em vista que a proposta foi aprovada no momento em que o Brasil ganha consciência da necessidade de romper com o racismo estrutural. “Esse tema é mundial, foi uma resposta do Parlamento na promoção da igualdade racial”, disse.
Racismo
A Convenção lista 15 situações que se enquadram como ação repressiva fundamentada em discriminação em vez de basear-se no comportamento da pessoa ou em informações objetivas que identifiquem seu envolvimento em atividades criminosas.
Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), a aprovação do PDC 861/17 será um passo importante na implementação do Estatuto da Igualdade Racial e para que o País consiga alcançar de fato a democracia racial.
“A Convenção vai somar nessa luta que a sociedade brasileira faz contra o racismo estrutural, contra todo tipo de discriminação, para que possamos ir salvando as vidas das mulheres e homens negros no País”, ressaltou.
“É bom olhar para as favelas, para as periferias, para qual é o percentual de trabalhadores precários; é bom olhar para o perfil daqueles que ganham os mais baixos salários no Brasil; olhar para as culturas e religiões marginalizadas, ao longo da nossa história; é bom olhar para a população carcerária, qual é o seu perfil; é bom olhar para as estatísticas do Instituto de Segurança Pública, e ver quem são as vítimas dos fuzis e das armas dos agentes de segurança; ao mesmo tempo olhar também para os agentes de segurança mortos nas operações policiais brasileiras; a cor da pele das crianças que foram assassinadas nos últimos anos, que só exerciam o papel de crianças, na porta de suas casas”, observou Jandira.
O deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA) ressaltou que os fatos de descriminação são evidentes no cotidiano dos brasileiros. “Eles estão aí em todos os dias, em todos os lugares, nas favelas, nas cadeias, em todos os ambientes, nas portas dos supermercados, na violência que explode todos os dias”, apontou.
O parlamentar argumentou que a sociedade precisa avançar na elaboração de um arcabouço legal amplo, para combater a discriminação e criar as condições para que o Estado possa promover a igualdade e a convivência entre todas as raças.
“O racismo tira o oxigênio da liberdade, tira o oxigênio de uma sociedade saudável. O racismo é uma chaga social, que precisa ser banida da nossa convivência”, afirmou a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).
História
A Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância é resultado de negociações iniciadas em 2005 promovidas pela Organização dos Estados Americanos (OEA). Naquele ano, a Missão Permanente do Brasil na OEA, apresentou à Assembleia Geral o projeto para criação de um Grupo de Trabalho visando a elaboração de uma Convenção contra o racismo e todas as formas de discriminação. As primeiras propostas foram apresentadas em 2011, na III Conferência Mundial Contra o Racismo, a Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, realizada em Durban, na África do Sul.
O Brasil foi presidente do Grupo de Trabalho por quatro vezes.
Em junho de 2013, a Convenção Interamericana Contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância foi finalmente aprovada durante a 43º Sessão Ordinária da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos, em Antígua, na Guatemala.
Tramitação
Tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos são considerados equivalentes a emenda constitucional e precisam ser votados em dois turnos pelo Congresso Nacional, com aprovação de pelo menos 3/5 dos integrantes da Câmara (308) e do Senado (49).