Atingidos que perderam familiares no rompimento da barragem de Brumadinho em Minas Gerais consideram desrespeitosa a alegação da mineradora Vale sobre valor da indenização às vítimas ser “absurdo”.

“Absurdo mesmo é a Vale ter escolhido matar as pessoas”, afirmou a representante da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Córrego do Feijão (Avabrum).

Horas após a Vale ingressar com recurso contra a sentença do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 3ª Região, de Minas Gerais, que prevê pagamento de R$ 1 milhão por cada um dos 131 trabalhadores mortos na tragédia do rompimento da barragem, Josiane Melo, que perdeu a irmã grávida naquele dia, mostra-se indignada com a argumentação da mineradora para se negar a efetuar o pagamento.

Em entrevista ao portal O Tempo na última terça-feira (6), ela se pronunciou em nome dos integrantes da Avabrum, criticando a postura da Vale.

“Absurdo é nós estarmos a cerca de 900 dias com 10 joias (vítimas) enterradas na lama de sangue. Absurdo é a Vale recorrer de todos os processos de indenização das famílias. Na verdade, não nos causa espanto a fala da Vale”, pondera.

Josiane por pouco não foi uma entre as 270 pessoas soterradas pelos rejeitos da barragem rompida. Funcionária da Vale, ela estava de folga no dia da tragédia. O mesmo não aconteceu com a irmã dela, Eliane Melo.

As indagações e acusações feitas por Josiane referem-se a um recurso perpetrado à noite de segunda-feira (5) pela Vale no TRT, recorrendo à sentença que obriga o pagamento de R$ 1 milhão por cada um dos 137 trabalhadores mortos no rompimento da estrutura do Córrego do Feijão – um total de R$ 137 milhões. Através do documento, a equipe jurídica da mineradora alegou que o valor definido é ‘absurdo’ e ‘exorbitante’.

Em contrapartida, a Vale ofereceu um montante seis vezes menor.

“Considerando-se a média salarial aproximada dos empregados da ré, correspondente a R$ 3.300,00 a indenização máxima por ofendido seria de R$ 165.000,00”, defendeu a mineradora privada à Justiça.

Pelas contas dos executivos da Vale, a vida de cada trabalhador soterrado pela lama de Brumadinho valeria “no máximo” o equivalente a 50 salários que estes funcionários receberia. Em 2020, a mineradora reportou um lucro líquido de 4,1 bilhão de dólares aos seus acionistas.
Também por meio do documento, a Vale negou saber da iminência do rompimento em Brumadinho. “Igualmente inverídico o registro de que ‘os riscos do rompimento da barragem e respectivas consequências eram conhecidos e foram conscientemente negligenciados pela requerida”.

“A indenização de significa apenas 9 horas do lucro atual da Vale”

A Ação Civil Pública (ACP) que levou à condenação da Vale obrigando o pagamento de R$ 1 milhão por trabalhador morto é de autoria do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Extração de Ferro e Metais Básicos de Brumadinho e Região (Metabase-Brumadinho), representado pelos advogados Luciano Pereira e Maximiliano Garcez.

O recurso apresentado pela Vale ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT), para Garcez, demonstra a insensibilidade com que a mineradora lida com a reparação das famílias atingidas na tragédia em Brumadinho. “O ato da empresa de recorrer de condenação em valor diminuto, especialmente se comparado com seus lucros, acerca de dano moral terrível sofrido pelos mortos, demonstra profunda insensibilidade”, disse.

Por meio de nota, o advogado alegou que, segundo o lucro trimestral da Vale, a mineradora levaria apenas 255 segundos para obter como lucro o valor necessário à indenização de cada um dos 137 trabalhadores mortos no Córrego do Feijão.

“A Vale continua agindo de modo cruel e insensível quanto ao terrível sofrimento que causou aos trabalhadores mortos. A indenização significa apenas nove horas do lucro atual da empresa, ou 4 minutos e 15 segundo por trabalhador”.

Segundo Garcez, a Vale lucrou R$ 30,5 bilhões no primeiro trimestre de 2021, o que representa cerca de R$ 14 milhões de lucro por hora. “Ínfimas 9,7 horas de lucro da Vale seriam suficientes para indenizar os 137 milhões pelo valor previsto na sentença, a ser destinado a cada um dos 137 trabalhadores diretos da Vale mortos em Brumadinho, fruto da ganância desenfreada da empresa”, disse.