Brizola Neto conviveu de perto com o avô, Leonel Brizola

Hoje, 22 de Janeiro de 2020, meu avô Leonel Brizola, se vivo estivesse, completaria noventa e oito anos. Nunca tive a pretensão, mesmo tendo convivido diariamente com ele nos últimos dez anos de sua vida, como seu secretário particular, de afirmar o que diria Brizola se hoje estivesse vivo. Mas nestes tempos obscuros em que estamos vivendo, vendo a bandeira brasileira ser usada para disseminar o divisionismo entre nós brasileiros, a maior lembrança que guardo do meu avô é a do seu inconformismo, sua indignação contra o processo de espoliação internacional que sofre nosso país e a situação de miséria em que permanece mergulhado nosso povo.

Por Brizola Neto*

Até hoje, mais de quinze anos após a sua morte, não conheci nenhum político, que ao longo de sua vida tenha lutado como ele, com tanta coerência e coragem na defesa da soberania nacional, e que tenha compreendido com tanta clareza que é a dependência econômica a verdadeira razão que explica o atraso brasileiro.

Não ouso me colocar na cabeça de Leonel Brizola para dizer o que ele estaria falando hoje, mas me recordo com muita clareza de alguns momentos da vida brasileira em que tive o privilégio de estar ao seu lado. No período das privatizações do governo de Fernando Henrique Cardoso, lembro da sua indignação com a entrega do patrimônio nacional, do desprezo que sentia por aqueles a quem chamava de vendilhões da pátria.

Brizola não se conformava em ver o governo brasileiro a serviço dos interesses estrangeiros. Não aceitava assistir passivamente o patrimônio nacional, construído pela Era Vargas, ser entregue aos grandes conglomerados econômicos. Lembro-me muito bem do episódio da venda da Cia Vale do Rio Doce, quando Brizola usou o tempo do programa partidário para convocar o povo a ir às ruas, montar barricadas, queimar pneus e tentar a todo custo impedir aquilo que ele classificava como um crime de lesa-pátria. Da mesma forma denunciou o fim do monopólio estatal do petróleo e a entrega de nossas jazidas para as multinacionais.

Recordo-me também da lição de humildade que deu em Lula e no PT, quando aceitou ser candidato a vice-presidente na chapa do petista, numa fotografia clara e historicamente invertida, em nome da união do campo progressista para formar uma frente de resistência ao entreguismo do governo FHC. Também me recordo de sua decepção no início do primeiro mandato do Presidente Lula, ao ver o banqueiro Henrique Meireles ser chamado para ser o grande condutor da política econômica e, na prática, dar continuidade aos pilares que fundamentam o neoliberalismo e impedem o Brasil de desenvolver suas forças produtivas.

Brizola morreu em 2004 sem se reconciliar com Lula. Não teve tempo para ver Lula encaminhar a mudança do marco regulatório e fim do regime de concessões para retomar o controle de nossas jazidas pela Petrobrás. Também não viu sua companheira de partido por mais de vinte anos, Dilma Roussef, chegar à Presidência da República pelas mãos do petista e realizar o leilão de Libra, o maior campo de petróleo do país. Brizola, não teve tempo para ver nem os melhores nem os piores momentos do governo Dilma que antecederam ao golpe de 2016.

Brizola não teve a tristeza de permanecer vivo para ver a farsa da ascensão de Bolsonaro à Presidência da República. Mas certamente estaria denunciando com ainda mais inconformismo e indignação o desmonte do Estado Nacional causado pelas reformas trabalhista, previdenciária e pela política de privatização promovida por Guedes e Bolsonaro. Brizola não titubearia em denunciar a ameaça que representa este Governo à própria democracia brasileira e o uso da bandeira nacional para fracionar e dividir o povo brasileiro.