Brasil precisa estar pronto para a nova revolução industrial, afirma Gabrielli

Para José Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras, o Brasil reúne condições únicas para protagonizar a nova revolução industrial que moldará as próximas duas décadas, mas ainda não está preparado. “Temos energia renovável abundante, matérias-primas e capacidade tecnológica, mas carecemos de um projeto nacional que articule esses elementos com um empresariado comprometido com a soberania”, alerta. Em entrevista recente, ele destacou que, desde os anos 1990, a participação da indústria no PIB brasileiro caiu acentuadamente, resultando em uma desindustrialização precoce. “Fomos atingidos antes de consolidar um patamar de renda suficiente para distribuição. Não basta reindustrializar: precisamos nos preparar para uma economia intensiva em tecnologia, com sistemas autônomos, internet das coisas e alta demanda por energia e dados.”
A necessidade de uma burguesia nacional comprometida
Um dos pontos centrais de sua análise é a ausência de uma burguesia nacional capaz de apostar em inovação e desenvolvimento produtivo. Para Gabrielli, o Estado deve atuar como indutor dessa transformação, incentivando uma classe empresarial disposta a investir em produtos de alto valor agregado e a disputar mercados globais, além de fortalecer o mercado interno. “O empresariado não defende a soberania do Brasil. O agronegócio, por exemplo, mantém-se preso a um modelo agroexportador que busca lucros imediatos, sem agregar valor. As trading companies exportam commodities in natura e deixam o processamento para outros países”, critica.
Um debate estratégico para o futuro do Brasil
Essa visão orientará a participação de Gabrielli na Mesa 3 do Ciclo de Debates preparatório ao 16º Congresso do PCdoB, que acontece em 11 de agosto de 2025, no Cine Glauber Rocha, no centro histórico de Salvador. O encontro, intitulado “Mudanças estruturais para o Brasil do século XXI”, discutirá caminhos para um desenvolvimento soberano diante das transformações tecnológicas e energéticas em curso. A mediação será da deputada federal Alice Portugal (PCdoB-BA), com participações do economista Sérgio Barroso, do economista e dirigente Davidson Magalhães, do poeta e jornalista Adalberto Monteiro e do economista Diogo Santos, do BNDES.
Desindustrialização e desafio político
Doutor pela Boston University e presidente da Petrobras entre 2005 e 2012, Gabrielli explica que a desindustrialização brasileira resulta de escolhas políticas equivocadas. Ao contrário de países como a China, que investiram em cadeias produtivas sofisticadas, o Brasil manteve um perfil exportador de baixa complexidade. Ele projeta que a indústria mundial será dominada por processos integrados e automatizados, e o país precisará de força política e planejamento estratégico para ocupar espaço nessa nova ordem produtiva.
Transição energética e papel do Estado
A matriz elétrica brasileira, majoritariamente renovável e apoiada em hidrelétricas, é vista por Gabrielli como um trunfo. “A nova revolução industrial demandará mais energia elétrica, e o Brasil está à frente em fontes renováveis. O desafio é planejar a substituição de equipamentos movidos a combustíveis fósseis e ampliar a infraestrutura”, afirma. Ele cita o plano Nova Indústria Brasil (NIB), lançado em 2024 pelo governo Lula, que prevê R$ 300 bilhões em financiamentos até 2026 para impulsionar a neoindustrialização. Embora considere o plano um passo na direção certa, Gabrielli avalia que suas ações ainda não superaram as fragilidades estruturais da economia.
Soberania como eixo estratégico
Para o ex-presidente da Petrobras, a soberania nacional depende de um mercado interno robusto, redução das desigualdades e domínio sobre recursos estratégicos, como terras raras. “Sem autonomia energética, alimentar e produtiva, e sem combater as desigualdades, a soberania é inviável. O neoliberalismo nos afastou deste caminho; precisamos de políticas industriais ativas para retomá-lo”, defende.
Rumo a um projeto nacional soberano
O debate em Salvador integra as discussões preparatórias ao 16º Congresso do PCdoB, marcado para outubro em Brasília, que atualizará o Programa do partido com propostas para um desenvolvimento sustentável e soberano. A Mesa 3 promete reflexões profundas sobre o papel do Estado, a transição energética e o futuro da indústria brasileira em um cenário global de disputas tecnológicas e geopolíticas cada vez mais intensas.
SERVIÇO
O quê: Mesa 3 do Ciclo de Debates do 16º Congresso do PCdoB – “Mudanças estruturais para o Brasil do século XXI”
Quando: Segunda-feira, 11 de agosto de 2025
Onde: Cine Glauber Rocha, Centro Histórico, Salvador (BA)
Participantes: José Sérgio Gabrielli, Sérgio Barroso, Alice Portugal, Davidson Magalhães, Adalberto Monteiro e Diogo Santos
Transmissão: TV Grabois