Johnson e Juncker pediram aos parlamentares de ambos os lados apoio ao acordo

O primeiro-ministro britânico Boris Johnson e o presidente da Comissão Europeia Jean-Claude Juncker anunciaram na quinta-feira (17) ter chegado a um novo acordo Brexit para saída da União Europeia, que deverá ser votado pelos deputados neste dia 19, na primeira vez que o parlamento britânico se reúne num sábado desde a Guerra das Malvinas.

Como registrou a revista The Economist, ele tem “menos de 48 horas para conquistar os deputados”.

O novo acordo é basicamente o mesmo de Theresa May, com uma versão modificada do chamado ‘backstop’ irlandês seguidamente contestado em Londres por alegadamente deixar em aberto a manutenção indefinida do país sob as normas europeias.

O principal líder da oposição, o trabalhista Jeremy Corbyn, rejeitou o acordo, que considerou “ainda pior” do que aquele rechaçado três vezes no parlamento.

Ele tem denunciado que o ‘Brexit de Boris’ é para se jogar de cabeça no colo de Trump para fechar a toque de caixa um ‘acordo bilateral’ que manterá o país manietado aos monopólios norte-americanos. Esse acordo de última hora – ressaltou – não passa de uma “venda”

Os unionistas de Belfast, cujos 10 votos no parlamento mantiveram à tona o governo conservador nos últimos meses, já repeliram o novo acerto. Contra, também já sinalizaram os nacionalistas escoceses (SNP) e os liberal-democratas.

Pelo Twitter, Johnson vangloriou-se de que “o grande novo acordo retoma o controle”.

Já Juncker descreveu como “justo e equilibrado” o novo protocolo para a fronteira entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda. Segundo ele, o acordo alcançado é “uma prova do nosso compromisso em achar soluções”. Líderes europeus estão reunido por dois dias em Bruxelas, para endossarem o acordo.

A Grã Bretanha terá de pagar 39 bilhões de libras esterlinas à União Europeia pela saída do bloco econômico. O acordo preserva mutuamente os direitos das cidadãos europeus que vivem na Grã Bretanha, e dos britânicos radicados na UE.

Pela lei Benn em vigor, Johnson tem até sábado para conseguir a aprovação do acordo no parlamento e se não conseguir teria de pedir à UE uma prorrogação da data final.

Depois de seguidamente ameaçar com uma saída sem acordo, Johnson busca jogar essa responsabilidade para cima do parlamento, dizendo que agora tem seu “grande e belo acordo” – um que libera acordos comerciais imediatamente como o ofertado pelo amigo Trump e deixa de fora “os serviços”, isto é, os serviços financeiros, o cassino da City londrina.

“Estou muito confiante de que, quando meus colegas do Parlamento estudarem este acordo, quererão votar no sábado e nos dias seguintes”, afirmou Johnson na cúpula da UE em Bruxelas. “Esta é a nossa chance de concluir o Brexit e sair em 31 de outubro”, asseverou. O vice-líder dos unionistas de Belfast, Nigel Dodds, acusou-o de estar “ansioso demais para conseguir um acordo a qualquer custo”.

Para o trabalhista Keir Starmer, secretário-sombra da pasta do Brexit, o novo acordo “abre caminho para uma década de desregulamentação” e dará ao governo “licença para cortar” as proteções de trabalhadores, meio ambiente e consumidores.

Juncker bem que buscou dar uma força a Johnson, dizendo que “se temos um acordo, temos um acordo e não há necessidade de prolongamento”. Mas, segundo o Guardian, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk “não descartou” que haja uma prorrogação e os líderes da UE estariam deixando “a porta aberta” caso o novo acordo seja barrado no parlamento britânico.

Um alto funcionário disse que os líderes europeus “acompanhariam os eventos de sábado e refletiriam sobre os próximos passos”. Outra fonte confidenciou que a opção foi por “não interferir em um debate doméstico sensível”, mas deixando “a porta aberta” para a possibilidade de uma prorrogação.

Para aprovar o acordo, o que demanda pelo menos 320 votos, Boris precisará reatar os votos unionistas e, de quebra, de alguns dos 21 rebeldes que expulsou do próprio partido, por votarem a favor da lei que o obriga a pedir um adiamento da data do Brexit – oficialmente o próximo dia 31 –, caso não consiga apoio parlamentar para um acordo até dia 19. E arrebanhar votos de dissidentes trabalhistas.

“[Boris Johnson] disse que, com base neste acordo e nas explicações que ele pretende dar, ele tem confiança para vencer essa votação”, afirmou o negociador-chefe do Brexit pelo lado europeu, Michel Barnier. “É tudo o que posso dizer sobre isso”, se recusando a comentar se acreditava que esse era o ‘acordo final’.

No processo de chegar a alguma modalidade de acordo Brexit que não implodisse a pacificação dos conflitos na Irlanda do Norte obtida pelo Acordo de Sexta-Feira Santa de 1998, Johnson negociou diretamente com o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, com concessões de parte a parte.

Pelo acordo, como destacou Barnier, a Irlanda do Norte permanecerá no mercado único de mercadorias da UE e o código alfandegário da UE será aplicado em mercadorias vindas da Grã-Bretanha para a Irlanda do Norte.

Ao mesmo tempo, para que Johnson possa se gabar de que no seu acordo o país “todo” deixou a UE, a Irlanda do Norte legalmente permanece no território aduaneiro da Grã Bretanha.

“Então, o que fizemos para quadrar esse círculo?”, esclareceu Barnier. “As autoridades do Reino Unido podem aplicar tarifas do Reino Unido a produtos provenientes de países terceiros, desde que os produtos que entram na Irlanda do Norte não corram o risco de entrar em nosso mercado único. No entanto, para mercadorias em risco de entrar no mercado único, as autoridades do Reino Unido aplicarão as tarifas da UE.”

O que significa que a fronteira em que serão executados os controles e verificações estará no Mar da Irlanda e não na divisa entre Irlanda do Norte e a República da Irlanda, evitando uma ‘fronteira dura’. “Os controles serão feitos nos portos”, ressaltou Varadkar.

A Irlanda do Norte mantém-se alinhada a um conjunto limitado de regras da UE, incluindo as relativas a mercadorias, normas sanitárias para controles veterinários, normas aplicáveis aos produtos agrícolas e regime de auxílios estatais.

Outro compromisso de última hora foi sobre o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), em que a Irlanda do Norte seguirá as regras da UE, enquanto Londres continua responsável pela cobrança e pelas ações de execução. Caberá à Assembleia da Irlanda do Norte decidir de quatro anos em quatro anos sobre a renovação do acordo de relacionamento especial com a UE, estando previsto um aviso prévio de dois anos no caso de opção pela saída. Barnier apontou que esse processo democrático previsto é a “pedra angular” da solução acertada. “Por quê? Porque este protocolo recém-acordado não será mais substituído por um acordo subsequente entre a UE e o Reino Unido”, completou.