Ao tomar posse o novo presidente do Chile, Gabriel Boric, é aclamado em frente ao Palácio de la Moneda (Divulgação)

Gabriel Boric tomou posse na presidência do Chile, nesta sexta-feira (11), resgatando a nacionalização do cobre realizada por Salvador Allende, e prometendo dar prioridade a “pensões e aposentadorias dignas, garantir que os estudantes não se endividem mais e que os povos originários sejam reconhecidos” e defendeu a jornada de trabalho de 40 horas semanais.

O novo mandatário defendeu que é necessário “recuperar nossa economia sem reproduzir suas desigualdades estruturais, com crescimento sustentável, nunca com zonas de sacrifício” e falou do papel do Estado e do incentivo às pequenas e médias empresas para a geração de emprego e renda.

Diante de uma multidão que coloriu com suas bandeiras a frente do Palácio de la Moneda, em Santiago, o novo presidente ressaltou que “se escutam os ecos dos que se levantaram contra a opressão”: “o povo chileno é protagonista deste processo e não estaríamos aqui sem a mobilização de vocês”.

É desta forma integrada e unitária, assinalou, que será nosso mandato, “e falo no plural, porque não se trata de algo individual, mas de um projeto coletivo”, de construção de um “país que nos protege e acolhe”.

Este compromisso com “quem habita a Pátria”, apontou o presidente, veio da proximidade, com o contato direto com os chilenos e chilenas para que saibamos “repartir de forma justa, porque não há redistribuição de riqueza quando ela se concentra em uns poucos”. Sem que Boric mencionasse o ex-presidente, a multidão levantou palavras de ordem contra Sebastián Piñera, que sai deixando um histórico de repressão com milhares de presos, mais de 400 manifestantes cegos e uma economia em frangalhos.

Conforme o novo mandatário ao longo da campanha foi ficando ainda mais clara a dura realidade em que se encontra mergulhado o Chile. “Vimos idosos cujas aposentadorias não lhes alcança para viver porque alguns decidiram fazer da Seguridade Social um negócio. Vimos famílias que não têm com o que pagar os tratamentos médicos dos seus doentes, estudantes endividados e camponeses encalacrados pela seca e pelo saque. Vimos famílias que seguem procurando os seus detidos e desaparecidos, pessoas que não deixaremos de buscar. Vimos povos originários despojados de sua terra, mas nunca de sua história”, frisou.

E de forma clara apontou que o existente “não é um conflito mapuche, mas entre o Estado chileno e um povo que tem direito a existir”. Diante de tamanho problema, assinalou, “a solução não é nem será a violência, mas diálogo, paz e direitos. Temos de reconstruir a confiança depois de tantas décadas de abuso e despojo”.

ALLENDE

Sobre o simbolismo do local em que discursava e onde o socialista Allende foi morto no golpe de Augusto Pinochet em 11 de setembro de 1973, Boric lembrou que “estas paredes foram testemunhas do horror de um passado de violência e opressão que não esquecemos e não esqueceremos”. “Por onde falamos hoje, ontem entravam foguetes e isso nunca mais pode voltar a se repetir na nossa história”, enfatizou.

Boric remarcou o fato de o povo chileno ser “profundamente latino-americano”, e da necessidade de reativar laços entre países vizinhos para “nunca se subordinar a nenhuma potência”. E especificamente sobre a questão migratória, se comprometeu a trabalhar em conjunto para recuperar o controle das fronteiras, mas sem jamais esquecer que os migrantes “são seres humanos”.

CONSTITUINTE

Em relação à Constituinte, o presidente empossado salientou que irá acompanhar “de forma entusiástica a este processo pelo qual tanto temos lutado”. “Vamos apoiar decididamente o trabalho da Convenção. Necessitamos uma Constituição que nos una, que sintamos como própria. Uma Constituição que diferentemente da que nos foi imposta a sangue, fogo e fraude pela ditadura, nasça em democracia de maneira paritária, com a participação dos povos indígenas. Uma Constituição que seja para o presente e para o futuro, que seja para todos e não para uns poucos”, enfatizou. Para o mandatário, é necessário fazer do plebiscito “um ponto de encontro e não de divisão”.

No encerramento de sua intervenção, aclamado pela multidão, Boric voltou a citar Allende, de seu exemplo e suas palavras: “Como previu há quase 50 anos Salvador Allende estamos de novo abrindo as grandes avenidas por onde passe o homem e a mulher livres para construir uma sociedade melhor. Seguimos. Viva Chile!”.