Nesta quinta-feira (5), Jair Bolsonaro vetou integralmente o projeto de lei que proibia as expulsões de imóveis durante a crise da Covid-19. Aprovado na Câmara e no Senado, o texto buscava impedir o despejo em imóveis urbanos determinados pela Justiça até 31 de dezembro deste ano.

De acordo com levantamento da campanha Despejo Zero, apenas durante a pandemia, de março de 2020 até 6 de junho de 2021, foram identificados 14.301 casos de famílias despejadas no país e mais de 84 mil correm o risco de perder suas moradias no próximo período.

A medida atinge a população mais vulnerável, que sem ter onde morar acaba em ocupações de imóveis abandonados ou inutilizados para que não tenham que viver em baixo da ponte, e também a população que vive de aluguel.

Nos últimos 12 meses, o IGP-M (Índice Geral de Preços ao Mercado), indicador convencionalmente usado para o reajuste de aluguéis, acumulou um aumento absurdo de 33,83%. O índice é calculado e divulgado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). O avanço do índice tem impactado os contratos de locação que, para efeitos de comparação, elevou um aluguel de R$ 2 mil para R$ 2.676 com a aplicação do reajuste.

A decisão de Bolsonaro em vetar o projeto coloca em risco milhares de brasileiros que tiveram sua renda reduzida na pandemia não só com a inflação do preço do aluguel, mas também dos preços de itens básicos como alimentos, gás de cozinha e gasolina. E a justificativa de Bolsonaro para essa crueldade foi a de que a medida “daria salvo-conduto para ocupantes irregulares de imóveis públicos” que agem de “má-fé”.

No entanto “má-fé” só pode ser a de um presidente que, em meio à maior crise já vista nas últimas décadas, deixa milhares de famílias desamparadas. De acordo com dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a população em situação de rua chegou a quase 222 mil brasileiros em março de 2020. Com a pandemia e o agravamento da crise econômica esse número possivelmente aumentou em 2021. Essa é uma conclusão fácil de se chegar ao andar pelas ruas de São Paulo e das grandes cidades do país.

Isso tudo quando o desemprego e a subocupação (pessoas que trabalham menos do que poderiam ou gostariam) atingem 22 milhões de brasileiros. Segundo o Ipea a falta de moradia atinge justamente trabalhadores informais, como guardadores de carros e vendedores ambulantes. Famílias que sempre tiveram segurança de um teto agora dependem da solidariedade e da ajuda de terceiros para comer e da companhia de outras famílias na mesma situação para terem segurança nas calçadas, praças e ocupações populares.

Boa parte dos trabalhadores que perderam suas moradias atuavam nos serviços onde a informalidade (que hoje corresponde a 40% dos ocupados) é grande. Setores como bares e restaurantes, casas de shows etc., que dependem do movimento nas ruas, ainda não se recuperaram dos impactos da pandemia, mesmo que as pessoas tenham voltado a circular mais com o avanço da vacinação.

Para os quase 15 milhões de brasileiros desempregados, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad-Contínua), do IBGE, que reúne dados do trimestre encerrado em março, o projeto representa uma garantia de que terão um teto sobre suas cabeças no fim do dia.

Analistas estimam, porém, que esse número pode ser maior, uma vez que a pandemia impôs ao IBGE a necessidade de coletar parte das informações por telefone e porque trabalhadores podem ter deixado de procurar vaga na pandemia. O Instituto considera desempregado apenas quem procurou trabalho no período da pesquisa.