Mais uma vez o presidente Jair Bolsonaro ofende o sofrimento do povo brasileiro. A última foi
chamar de “minoria barulhenta” as pessoas que aguardam o auxílio emergencial de R$ 600,
destinado aos trabalhadores informais, desempregados e cidadãos de baixa renda que
simplesmente ficaram sem meios de sobrevivência em face da pandemia do coronavírus.
“O Pedro Guimarães, presidente da Caixa, que vai falar alguma coisa sobre o pessoal que caiu
em (inaudível), que está sob análise. É uma minoria barulhenta, uns realmente têm razão,
outros se equivocaram e outros não têm direito”, disse, em vídeo nas redes sociais.
A afirmação se dá quando, após um mês do início da liberação do auxílio emergencial, as
extensas filas e aglomerações continuam a se multiplicar em todo o país, levando milhões de
pessoas às agências da Caixa Econômica na tentativa de sacar o dinheiro.
Os empecilhos que as pessoas têm encontrado para terem o dinheiro na mão são tão
absurdos, beirando o surreal, que faz parecer que tudo não passa de uma manobra da equipe
econômica para que, ao fim de todo o processo, milhares de cidadãos não consigam mesmo
receber e o recurso retorne aos cofres do governo.
Além de toda a dificuldade para acessar e fazer funcionar o aplicativo Caixa Tem, mesmo para
aqueles que têm acesso à Internet, celulares de última geração e facilidade com o mundo
digital – o que um universo inteiro da população brasileira não tem, sobretudo os mais
necessitados -, os erros são constantes.
Pessoas que conseguem ultrapassar a barreira do cadastramento e ter seu benefício
devidamente aprovado contam que, no minuto em que estão prestes a ter acesso ao código
para transferir ou sacar o dinheiro, depois de horas de tentativas por dias seguidos, aparece na
tela do celular respostas como “seu número não consta”, “CEP inválido”, “aplicativo
desatualizado”, etc, etc, ou simplesmente “erro”.
Isso para os que já tiveram o recurso creditado na Poupança Digital aberta pela Caixa. Para os
30 milhões que nem conseguiram ter seu cadastro aprovado e os 13 milhões que terão que
refazer o cadastro, o drama é ainda maior.
As histórias absurdas, de pessoas que se enquadram nas regras para receber o benefício e não
conseguem, têm sido colhidas nas filas e em inúmeras reportagens em todo o Brasil, e
narradas em sites e jornais. Como o caso da desempregada Adeyula Barbosa, divulgado na
quinta-feira pelo G1.

Conforme a reportagem, Adeyula teve seu pedido de auxílio negado após a Carteira de
Trabalho Digital apontar que ela tem dois empregos em aberto e que, para enorme surpresa,
um deles é de “presidente da República”, cargo que supostamente assume na Secretaria de
Educação do Espírito Santo, onde vive, na periferia de Vila Velha.
Parece chacota, como as que o presidente real nos lança todos os dias, mas não é. A
desempregada, que teve seu último emprego formal como cuidadora em uma escola, e teve
seu contrato encerrado em agosto de 2019, diz que já procurou esclarecer o erro em vários
órgãos, mas não obteve respostas.
Ela conta que consultou o site do auxílio emergencial no dia 7 de abril e que 20 dias depois
apareceu a negativa. “Estava lá algo como ‘cidadão com emprego formal’, como se eu
estivesse trabalhando”, diz.
Segundo ela, começou a pesquisar o que significavam aquelas siglas. “Consegui consultar a
Rais (Relação Anual de Informações Sociais), depois resolvi baixar a Carteira de Trabalho
Digital, para saber se estava com o mesmo problema. Lá, estava a ocupação de ‘presidente da
República’. Fiquei espantada. Como? Uma cuidadora escolar que não tem nada a ver com o
presidente da República. Não tinha lógica aquilo. Não imaginava um erro desse”, disse.
Adeyula tem dois filhos, de 11 e 7 anos. O marido ainda está empregado, mas seu salário foi
reduzido e todos os benefícios cortados por conta da crise do coronavírus. Ela segue, como
milhões de cidadãos, à espera do auxílio, que era para ser “emergencial”.