O bolsonarismo tem perdido força em 2021, avalia a presidenta nacional do PCdoB, Luciana Santos. Em informe à reunião do Comitê Central (CC) do Partido, nesta sexta-feira (14), a dirigente declarou que o presidente Jair Bolsonaro se isolou ainda mais diante da crise sanitária, política, econômica e social do País.

Entre outros fatores que elevaram o desgaste do governo nos últimos meses, Luciana destacou a pandemia e suas variantes, além dos trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19 no Senado. “A pandemia é o vetor principal dessa grande instabilidade, que provocou alterações qualitativas no quadro político. A novidade maior é o crescente avanço da frente ampla e o isolamento de Bolsonaro.”

Mesmo no cenário internacional, o País está cada vez mais à margem das tendências geopolíticas. Se é verdade que a pandemia afetou todas as nações desenvolvidas ou em desenvolvimento, comprometendo seus “projetos de desenvolvimento soberano”, também é fato que muitas nações, ao contrário do Brasil, começam a vencer o novo coronavírus e engatar uma retomada econômica.

“Há consenso que vivemos um momento disruptivo – um ponto de inflexão, com mudanças estruturais como poucas na história. A própria onda conservadora que varreu a conjuntura política mundo afora, no bojo da crise do capitalismo, hoje, dá sinais de arrefecimento”, afirmou Luciana. Diante da pandemia e também do vigor da economia chinesa, o velho “consenso de Washington” foi posto em xeque.

“Já há quem fale em um ‘novo consenso de Washington’, marcado pelo fortalecimento do Estado Nacional, por políticas econômicas expansivas e por grandes investimentos em infraestrutura”, agrega a presidenta do PCdoB, citando, como exemplo, as novas medidas econômicas nos Estados Unidos sob a gestão Joe Biden. “São dois pacotes da Casa Branca, que, juntos, injetarão US$ 4,15 trilhões (R$ 20,7 trilhões) na economia norte-americana. Países como Alemanha e França também caminham nessa direção.”

Deterioração

Na opinião de Luciana, essas iniciativas escancaram quão “retrograda” é a política ultraliberal adotada por Bolsonaro e por seu ministro da Economia, Paulo Guedes. “Até mesmo um economista de referência entre os liberais, como André Lara Resende, denuncia essa política recessiva, critica a alta dos juros e pede o fim do teto de gastos. O Brasil está ficando para trás!”

Convertido em “pária internacional” devido ao negacionismo e à negligência de Bolsonaro no combate à pandemia, o governo brasileiro também tem reveses internos. “A população brasileira paga a conta pela falta de senso de urgência, pela subestimação da pandemia, a não compra de vacinas e adoção de uma estratégia de ‘imunização de rebanho’ que já nos custou quase meio milhão de vidas. São números de um país em guerra”, diz Luciana. “Não há uma ação coordenada do governo para fazer frente aos problemas reais do Brasil e de sua gente.”

Além da postura, dos discursos e das omissões irresponsáveis do presidente, o País está às voltas com a deterioração econômica. “Há 14,4 milhões de desempregados, uma nova onda de desindustrialização e ‘uberização’ da força de trabalho. O Brasil vai se tornando um país mais pobre, com perda de massa salarial e significativa redução dos extratos médios.” Existe ainda a ameaça da fome. “Cerca de 118 milhões de brasileiros não têm segurança alimentar – não sabem se jantam hoje ou se almoçam amanhã.”

Enquanto o Banco Central “independente” aumenta a taxa de juros, áreas sociais, como a Educação e a Saúde, perdem recursos. O investimento se contrai. A parcela do novo auxílio emergencial não chega a um terço do valor-base do benefício inicial. O alcance da vacinação contra a Covid-19 cresce lentamente. Assim, boa parte da recuperação do Brasil se baseará numa base econômica deprimida (pela recessão de 2020) e por fatores externos, como a alta no preço das commodities. “O desemprego é um dos legados do governo Bolsonaro, e tudo indica que não teremos uma redução dos indicadores”, analisa Luciana.

A frente ampla

Mais do que a rejeição popular a Bolsonaro – que bateu recorde nos meses de abril e maio –, salta aos olhos a “coleção de derrotas” que o governo vem sofrendo, nas mais distintas esferas, para além da arena internacional. Tanto no Judiciário quanto no Legislativo, a vida do governo se complica diante de tantos erros, problemas e crimes de responsabilidade. A reação ao bolsonarismo é fruto de uma frente ampla que não para de crescer e se consolidar.

“Não teríamos uma CPI tão estratégica quanto a da Covid-19 sem essa percepção generalizada de que é preciso responder a tudo que está acontecendo. As bases de apoio ao bolsonarismo vão se corroendo, e o enfrentamento ao governo já não se reduz apenas à esquerda”, afirma Luciana. “Isto é resultado da nossa política.”

Conforme a presidenta do PCdoB, a CPI, com menos de 20 dias de trabalhos, mostrou a que veio. “Já há materialidade nos depoimentos que permitem responsabilizar o governo por morosidade, como a omissão no âmbito da vacina.  Países como México, Chile e Costa Rica iniciaram a imunização ainda em dezembro de 2020, ao passo que Bolsonaro ignorou ofertas propostas por farmacêuticas como a Pfizer.”

O presidente tenta reagir indo às ruas e reafirmando o discurso negacionista junto às suas bases mais radicalizadas. Bolsonaro continua a atacar governadores e prefeitos, de modo a, no mínimo, corresponsabilizá-los pelo genocídio em curso no País. Ao mesmo tempo, busca apressar a tramitação da agenda econômica liberal no Congresso, com propostas como a reforma tributária, a reforma administrativa e as privatizações.

As dificuldades para Bolsonaro ficam particularmente visíveis nas pesquisas de intenção de voto dos brasileiros para as eleições presidenciais de 2022. Nesta semana, por exemplo, levantamento do instituto Datafolha apontou que, se o pleito fosse realizado hoje, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceria com folga Bolsonaro, por 55% a 32%, num eventual segundo turno.

Segundo Luciana, depois que o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou a suspeição do ex-juiz Sergio Moro nos processos contra Lula na operação Lava Jato e garantiu a retomada dos direitos políticos do ex-presidente, “todo o jogo político se reorganizou”. O petista avançou não apenas no eleitorado mais pobre – mas até em setores comumente associados ao bolsonarismo, como o segmento evangélico.

PCdoB

Em meio a essa conjuntura, o PCdoB realizará seu 15º Congresso no segundo semestre, tendo como prioridade o debate sobre a tática eleitoral para 2020. Além das definições nas disputas à Presidência da República, ao Senado e aos governos estaduais, o Partido deve se concentrar no desafio de lançar chapas próprias e competitivas para as eleições legislativas. Serão renovadas as assembleias estaduais e a Câmara dos Deputados – e a eleição à Câmara inclui o desafio de cumprir a cláusula de barreira. “Vamos buscar saídas contra a cláusula e a legislação autoritária”, assegura Luciana.

Antes mesmo da eleição, o cerco às legendas de oposição a Bolsonaro se intensifica, conforme visto na mudança regimental feita pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), para restringir a participação desses partidos no debate político. “O fim das coligações e a cláusula de barreiras têm como efeito prático uma reorganização do sistema partidário. As medidas restritivas afetam principalmente os partidos programáticos”, afirma Luciana. Mas o PCdoB, segundo sua presidenta, não renunciará à batalha. “Somos uma força imprescindível à democracia brasileira.”

“O ataque dos bolsonaristas à nossa defesa de uma frente ampla para isolar e derrotar Bolsonaro é uma prova da justeza da nossa orientação política. Temos de construir nossa unidade em torno das saídas que preservem nossa identidade, nossa autonomia e a atuação política do PCdoB na esfera institucional”, acrescenta Luciana.

A presidenta do PCdoB conclui: “O ano de 2022 é um divisor de águas, de intensa luta de classes. Há espaço para derrotarmos Bolsonaro e seu projeto autoritário. Mais do que nunca, sejamos firmes na luta”.