O vice-presidente da República e presidente do Conselho Nacional da Amazônia Legal, Hamilton Mourão, fala à imprensa, após a terceira reunião do colegiado, no Palácio Itamaraty em Brasília

Bolsonaro deixou o vice-presidente, Hamilton Mourão, fora da delegação brasileira que será despachada para a Cúpula do Clima (COP 26) das Nações Unidas, entre as duas primeiras semanas de novembro, em Glasgow, na Escócia.

Mourão preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal, que é responsável por monitorar dados sobre o bioma e coordenar as ações de combate a incêndios florestais, mineração e desmatamento ilegais, e também gerencia atividades de órgãos civis ligados ao Meio Ambiente e militares das Forças Armadas, quando mobilizados.

Comandar a delegação brasileira era um desejo explícito de Mourão. Ele havia pedido ao presidente para ser o representante máximo do país na conferência da ONU.

“Na nossa delegação, temos a turma das Relações Exteriores e a turma técnica do Meio Ambiente. Teria de ter uma terceira pessoa que coordenasse isso e fosse o árbitro de nossos interlocutores. Procurei me apresentar para isso”, disse Mourão ao Estadão, em meados de junho.

No entanto, Bolsonaro o escanteou da missão e, em mais um sinal de hostilidade ao seu vice, decidiu escalar o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, para a tarefa.

“Eu vou ser o chefe da comitiva, como todo ano foi, junto ao Itamaraty nas negociações”, disse ontem o ministro Leite que completou, “estamos montando a comitiva, deve sair um decreto apresentando”, explicou Leite.

Segundo diplomatas, Mourão poderia dar mais peso político à comitiva. Porém, Bolsonaro prefere que Mourão fique reduzido a representar o governo Bolsonaro em outros foros menores, como a terceira reunião do Pacto de Letícia, onde Mourão falou novamente sobre a COP.

Desprezo

Em julho, Bolsonaro comparou o general Hamilton Mourão a um “cunhado” que tem que “aturar”. Para o chefe do Executivo, o vice-presidente é pessoa indesejável e descartável.

“O Mourão faz o seu trabalho, tem uma independência muito grande. Por vezes aí atrapalha um pouco a gente, mas o vice é igual cunhado, né. Você casa e tem que aturar o cunhado do teu lado. Você não pode mandar o cunhado embora. Então, estamos com Mourão, sem grandes problemas, mas o cargo dele é muito importante para agregar aí. Dele, não. O cargo de vice é muito importante para angariar simpatias quer seja para candidatura à Presidência, governador ou prefeito”, apontou em entrevista à Rádio Arapuan.

Em 15 de junho, Bolsonaro convocou uma reunião ministerial e deixou de fora o vice-presidente da República, que, desde o início do governo, participava de todas as reuniões.

Ao chegar ao seu gabinete, Mourão foi perguntado por jornalistas se havia sido chamado para o evento. “Não, não fui convidado”, respondeu.

“Sinto falta”, prosseguiu Mourão. “A gente fica sem saber o que está acontecendo”, disse. “É importante que a gente saiba o que está acontecendo, né? Paciência, né? C’est la vie [é a vida], como dizem os franceses”, acrescentou o vice.

Desde fevereiro Mourão já era excluído das reuniões e disse à época que não estava incomodado com a situação. “Não fui convidado. Não fui chamado. Então, acredito que o presidente julgou que era desnecessária minha presença. Só isso”, disse na oportunidade.

Bolsonaro já demonstrara sua hostilidade contra Mourão desde novembro de 2019, em uma reunião com deputados, quando disse que seu vice deveria ter sido o deputado federal “príncipe” Luiz Philipe de Orleans e Bragança. Segundo Bolsonaro, ele “deveria ter sido meu vice, e não esse Mourão aí. Eu casei, casei errado. E agora não tem como mais voltar atrás”.