Bolsonaro afina em live e não fala dos R$ 89 mil na conta de Michelle
Jair Bolsonaro deixou à mostra o roteiro usado por ele na live desta quinta-feira (28). Foi possível ler no papel, que ficou em cima da mesa, que, no item 7, ele pretendia “botar um ponto final na questão envolvendo Queiroz e a Primeira Dama”. No decorrer da apresentação, porém, ele pulou este item, que apareceu riscado, e não deu explicação nenhuma para a pergunta que o país inteiro faz. Por que Queiroz depositou R$ 89 mil na conta de sua mulher, Michelle Bolsonaro?
O Ministério Público do Rio de Janeiro descobriu, através da quebra de sigilo bancário dos envolvidos no esquema de lavagem de dinheiro que o então deputado Flávio Bolsonaro montou junto com Queiroz em seu gabinete na Assembleia Legislativa do Rio, que o ex-assessor de Flávio e depositou 21 cheques na conta de Michelle Bolsoraro no valor total de R$ 72 mil acrescidos de outro depósito, feito por sua mulher, Márcia Oliveira, no valor de R4 17 mil, perfazendo o total de R$ 89 mil.
Desde que esses depósitos vieram a público, Bolsonaro tem perdido várias vezes as estribeiras quando é perguntado sobre o assunto. Numa dessas ocasiões, no início da semana, ele ameaçou um jornalista do jornal “O Globo” que, durante uma visita de Bolsonaro à Catedral de Brasília, quis saber dele o motivo dos depósitos. Ele respondeu que sua vontade era encher a boca do repórter de “porrada” e que o jornalista ele era um “safado”. Logo em seguida, milhares de internautas começaram a fazer a mesma pergunta. Na quinta, questionado novamente, Bolsonaro chamou o repórter de otário.
Pelo que pareceu, ele estava decidido a esclarecer tudo durante a live desta quinta-feira. Pelo menos era isso o que estava escrito no sétimo item dos assuntos que ele pretendia abordar no programa. Pretendia, mas não abordou. Está difícil para o presidente esclarecer esse assunto. Até porque, na primeira vez que veio à tona, através do relatório do Coaf (Conselho de Controle e Acompanhamento Financeiro), um cheque de R$ 24 mil depositados por Queiroz na conta de Michelle, o presidente justificou dizendo que tinha sido um empréstimo que ele tinha feito a Queiroz. Não apareceu nada disso em suas prestações de contas, mas, tudo ficou por isso mesmo.
Agora, quando a quebra dos sigilos descobre depósitos regulares num valor muito maior de Fabrício Queiroz na conta da primeira-dama, a versão do empréstimo foi para o espaço. Bolsonaro está tendo grande dificuldade de produzir outra versão para o escândalo. Por isso o nervosismo dele quando é questionado sobre a motivação dos depósitos e a origem desse dinheiro. A prisão de Queiroz e de sua mulher, há dois meses, provocou um grande alvoroço no Planalto. O advogado da família, que estava escondendo Queiroz, foi afastado do caso. Bolsonaro, que vinha atacando o STF e o Congresso quase diariamente, amenizou seu discurso, com medo do que estava por vir.
Amigo do presidente há 30 anos, Queiroz foi flagrado pelo Coaf movimentando uma quantia milionária (R$ 7 milhões entre 2014 e 2017) recolhendo parte dos salários de funcionários fantasmas do gabinete de Flávio e do próprio Jair Bolsonaro. Ele recolhia o dinheiro público desviado da Assembleia Legislativa do Rio e repassava para Flávio Bolsonaro e os demais familiares do presidente. Os 21 depósitos feitos na conta de Michelle Bolsonaro foram feitos durante o tempo em que Queiroz operava o esquema criminoso de dentro do gabinete do filho do presidente.
O MP-RJ afirma que há fortes evidências de que uma organização criminosa se instalou no gabinete e criou um esquema de lavagem de dinheiro comandado por Flávio Bolsonaro e Queiroz. Os investigadores seguiram o dinheiro desviado e concluíram que um dos destinos dos recursos, além dos familiares do deputado e do presidente, inclusive a primeira-dama, era a loja de chocolate – uma franquia da Kopenhagem – que Flávio possui num Shopping da Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. Os recursos desviados dos fantasmas entravam na loja em dinheiro vivo e Flávio sacava o dinheiro lavado na forma de lucros retirados do negócio.
Outra linha de investigação é a participação da milícia do Rio das Pedras no esquema da lavagem de dinheiro do gabinete. A mãe e a ex-mulher de Adriano da Nóbrega, um ex-capitão da PM, ligado a Queiroz, que virou chefe da milícia do Rio das Pedras e do Escritório do Crimes, uma espécie de central de assassinatos das milícias, Raimunda Veras Magalhães e Danielle Queiroz, respectivamente, eram funcionárias fantasmas doo gabinete de Flávio. Elas repassavam os salários para o deputado, através da conta de Queiroz, e também para o próprio Adriano, que viria a ser morto no início deste ano no interior da Bahia.