Blair destruiu informe de ministro que julgou ilegal invadir Iraque
Durante o mandato do primeiro-ministro do Reino Unido Tony Blair (1997-2007), seu secretário de defesa, Geoff Hoon, ordenou que se queimasse um memorando secreto que questionava a legalidade da invasão do Iraque em março de 2003. A revelação foi feita no livro de memórias “See How They Run” (Veja como eles funcionam), publicado em novembro do ano passado.
Quando a informação foi divulgada pela primeira vez, em 2015, Blair e sua imprensa tentou reduzi-la a “um disparate”. Mas Hoon agora traz detalhes do “acobertamento”.
Na obra, Geoff Hoon faz um histórico do posicionamento britânico, e relata as pressões que recebeu do ex-chefe do Estado-Maior da Defesa, Mike Boyce, para dar instruções sobre o avanço das tropas da Inglaterra no Iraque, principalmente no que diz respeito ao que poderia ser feito ou não em termos legais.
Em revelações que ampliam a condenação à concessão de título de cavaleiro, recentemente entregue ao ex-primeiro-ministro e líder do Partido Trabalhista, Hoon informou que o chefe de gabinete de Blair, Jonathan Powell, o instruiu “em termos inequívocos” a destruir o documento.
Felizmente, os registros que comprovam os crimes cometidos na invasão continuam guardados em um local “seguro”, sustenta Geoff Hoon. “Do que sei, ainda estará lá”, enfatizou. Vale lembrar que os assassinatos de civis ocorreram desde antes da agressão, realizada a pretexto da existência das “armas de destruição em massa de Saddam Hussein”. Foram atrocidades antecedidas pelo longo bloqueio, que causou a morte de civis, incluindo crianças iraquianas, por falta de medicamentos. As crianças eram impedidas até de usar lápis na escola, pois sua importação foi proibida, sob o pretexto de que o grafite podia ser utilizado em usinas nucleares.
DESAPARECER COM AS PROVAS
As instruções para desaparecer com as provas que incriminavam o governo Blair teriam sido pedidas a um procurador-geral, que respondeu ao pedido com um “parecer muito longo e detalhado” segundo o qual as tropas britânicas só deveriam avançar caso o primeiro-ministro acreditasse que seria do interesse nacional invadir o país.
“Fizeram-me chegar uma cópia [do parecer] em condições de grande secretismo. Disseram-me que não deveria partilhar a informação com ninguém. Não sei se mais alguém recebeu uma cópia”, escreveu o antigo titular da pasta da Defesa no livro. Segundo Hoon, não era aquele o parecer esperado pelo governo britânico que, por isso, foi instruído a não partilhar com Mike Boyce, a pessoa que o havia solicitado.
“Quando Peter Watkins, meu secretário à época, questionou Jonathan Powell [então chefe de gabinete de Tony Blair] sobre o documento, e perguntou o que era suposto fazer, disseram-lhe, em palavras que não deixam dúvidas, para o ‘queimar’”.
DENÚNCIAS DOS CRIMES E ASSANGE
A repercussão da denúncia e os detalhes das atrocidades cometidas estão servindo agora como combustível para que mais de 750 mil pessoas ampliem a mobilização por justiça e retirem de Blair o seu título de cavaleiro. Além da monstruosidade das tropas britânicas e dos Estados Unidos no Iraque, o ex-primeiro ministro deve explicações sobre sua repugnante ação conjunta no Afeganistão.
Aliás, quem está sofrendo as consequências de expor os crimes ingleses e norte-americanos tanto no Iraque, quanto no Afeganistão, é o jornalista Julian Assange, cuja estadia na lúgubre prisão de Belmarsh já completa 1.000 dias. Esta nova denúncia de Hoon torna ainda mais intenso e fundamentado o clamor pela liberdade para o jornalista australiano.