Biden amplia campanha por vacinação para conter variante Delta
Com a pandemia de Covid-19 sob a variante Delta nos EUA saindo de controle e retornando ao patamar de 1.500 mortos diários, o presidente Joe Biden foi à tevê advertir que essa situação já ameaça a recuperação econômica e anunciou ordens executivas para obrigar empresas com mais de 100 trabalhadores a imunizar toda a força de trabalho ou submetê-la a testes semanais de coronavírus.
Biden também estender a obrigatoriedade de imunização a todos os trabalhadores em unidades de saúde bancadas pelo Medicare/Medicaid e não apenas as equipes de enfermagem, assim como a todos os funcionários e contratados federais.
Apesar de agora 95% dos mortos serem de não-vacinados, uma parcela não desprezível da população norte-americana, influenciada pelo negacionismo trumpista, ainda não se vacinou e rejeita até mesmo o uso da máscara facial. Cerca de 80 milhões de pessoas não foram vacinadas.
Cientistas vinham alertando que, com o atual nível de recusa nos EUA à vacinação, que em alguns estados chega a 60% e é de pelo menos 25% no conjunto do país, não é possível deter a onda de infecções da variante delta, mais contagiosa.
“Uma minoria clara de americanos, apoiada por uma minoria clara de funcionários eleitos, está nos impedindo de virar a esquina”, disse Biden na quinta-feira (9). “Essas políticas pandêmicas estão deixando pessoas doentes, causando a morte de pessoas não vacinadas”, assinalou o presidente, denunciando a atuação de governadores e parlamentares republicanos que sabotam abertamente o esforço de contenção da pandemia.
“Ser vacinado não é uma questão de liberdade ou escolha pessoal”, enfatizou o presidente. “Significa se proteger e proteger as pessoas ao seu redor”, acrescentou. “Todos pagamos pela rejeição à vacina. Por favor, façam a coisa certa”, conclamou, assinalando que os imunizantes são seguros.
As empresas devem “se assegurar de que sua força de trabalho esteja completamente vacinada ou exigir dos trabalhadores que não se vacinarem que obtenham um teste com resultado negativo pelo menos uma vez por semana”, afirmou.
“A conclusão é que: vamos proteger os trabalhadores vacinados dos colegas não vacinados. Vamos reduzir a propagação da covid-19, aumentando a proporção da força de trabalho que está vacinada nas empresas de todos os Estados Unidos”, disse.
Variante Delta
Até aqui, os democratas vinham adiando uma abordagem mais direta do impasse gerado pelo negacionismo vacinal, optando por campanhas de propaganda sobre a segurança e eficácia das vacinas, aliadas, a nível dos estados e prefeituras, de sorteios de carros e prêmios em dinheiro para quem se vacine e até distribuição de ingressos para esporte. Com a variante Delta em ação, isso não funciona mais.
“Os não vacinados lotam nossos hospitais, estão saturando as salas de emergência e as unidades de cuidados intensivos e não deixam espaço para alguém com ataque cardíaco, pancreatite ou câncer”, acrescentou Biden.
Agora, apesar de mais de 208 milhões de americanos terem pelo menos uma dose das vacinas, os EUA estão vendo cerca de 300% mais novas infecções por COVID-19 por dia, cerca de duas vezes e meia mais hospitalizações e quase o dobro do número de mortes em comparação com o mesmo período do ano passado.
Isso já afeta a recuperação da economia, como detectado pela queda da geração de empregos do patamar de 900 mil em junho-julho, para menos de 300 mil em agosto, o que atingiu particularmente a restaurantes e serviços.
“Estamos em uma fase difícil e pode durar um pouco”, alertou Biden. “Para a grande maioria de vocês que foram vacinados, entendo sua raiva por aqueles que não foram vacinados”, acrescentou. Pesquisa Axios/Ipsos realizada de 30 de julho a 2 de agosto descobriu que 58% dos americanos, incluindo 79% dos vacinados, disseram que culpam os não vacinados pelo aumento dos casos de Covid-19. Biden disse também que seu governo está trabalhando para garantir doses de reforço das vacinas de mRNA já neste mês.
“Bloqueio à saúde pública”
Biden disse que faria o que pudesse para “exigir que mais americanos sejam vacinados” para combater aqueles que “bloqueiam a saúde pública”, acrescentando que “se esses governadores [republicanos] não nos ajudarem a vencer a pandemia, usarei meu poder como presidente para tirá-los do caminho”.
Servidores federais que se neguem à vacinação poderão sofrer penalidades, até demissão.
A obrigatoriedade de vacinação já foi adotada pelo Pentágono, que considerou a não-vacinação um risco para a prontidão da tropa, e para os serviços de saúde que atendem os veteranos. As empresas serão obrigadas a concederem licença remunerada para que seus funcionários se vacinem. Passageiros que se recusarem a usar máscara nos aviões, pagarão multa.
Sem mencionarem explicitamente o anúncio da Casa Branca, a Associação Médica Americana, a Associação Nacional da Indústria e a Business Roundtable emitiram declarações de apoio à política do governo Biden contra a pandemia.
Por sua vez William Schaffner, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Vanderbilt, comparou os requisitos de vacinação ao serviço militar em tempos de guerra. “Até o momento, contamos com um exército de voluntários”, disse Schaffner. “Mas, particularmente com a variante Delta, o inimigo foi reforçado e agora um exército voluntário não é suficiente. Precisamos instituir um projeto.”
Na sexta-feira, ao visitar uma escola pública acompanhado pela primeira dama Jill, o presidente Biden reagiu a declarações de governadores republicanos de que ele estaria “exorbitando” de seus poderes, dizendo que eram eles que estavam “se esquivando de sua responsabilidade”.
“Estou tão desapontado que particularmente alguns governadores republicanos foram tão arrogantes com a saúde dessas crianças, tão arrogantes com a saúde de suas comunidades”, disse Biden durante a visita à Brookland Middle School, em Washington. “Isto não é um jogo”.
“Nem sempre podemos saber o que o futuro reserva, mas sabemos o que devemos aos nossos filhos”, acrescentou o presidente norte-americano. “Devemos a eles a promessa de manter suas escolas abertas da forma mais segura possível. Devemos a eles o compromisso de seguir a ciência.”
“A coisa mais segura que você pode fazer por seu filho a partir de 12 anos é vaciná-lo”, disse o presidente, dirigindo-se aos pais. “Você os vacinou para todos os outros tipos de coisas – sarampo, caxumba, rubéola – para eles irem à escola, para poderem praticar esportes, eles tiveram que tomar essas vacinas. Vacine-os.”
A mudança de enfoque do governo Biden possivelmente também visa evitar o desgaste que virá, quando em duas ou três semanas, ao ritmo diário de mortes atual, os EUA superarem o total de mortos da pandemia de 1918, a gripe espanhola, em que morreram 675 mil norte-americanos. Há apenas dois meses, Biden declarou prematuramente a “independência” do país em relação ao coronavírus.
Nas hostes republicanas, houve uma corrida ao Twitter para contestar a medida de Biden. Ronna McDaniel, a presidente do Comitê Nacional Republicano, chamou-a de “decreto federal não-americano e inconstitucional”. O governador da Carolina do Sul, Henry McMaster, postou: “Biden e dos democratas radicais torceram o nariz para a Constituição. Fique tranquilo, vamos lutar contra eles até as portas do inferno para proteger a liberdade e o sustento de todos os sul-carolinos”.
“@JoeBiden nos vemos no tribunal” , escreveu, em Twitter, a governadora Kristi Noem, de Dakota do Sul. Greg Abbott, governador do Texas, chamou as ações de “ataque às empresas privadas” e anunciou que emitiu uma ordem executiva “protegendo o direito dos texanos de escolher se seriam vacinados ou não”. “O Texas já está trabalhando para deter essa usurpação de poder”, postou.
Questionado na sexta-feira sobre a possível ida dos republicanos aos tribunais contra as novas medidas de vacinação, Biden retrucou: “Façam isso”.