Aras diz que Bolsonaro não cometeu crime ao vazar inquérito
O procurador-geral da República, Augusto Aras, escolhido a dedo para o cargo por Bolsonaro, decidiu pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) o arquivamento do inquérito contra o presidente da República por vazamento de dados sigilosos sobre ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O acobertamento de Bolsonaro por Aras contraria escandalosamente o inquérito da Polícia Federal, apontando que Bolsonaro teve “atuação direta, voluntária e consciente” no crime de violação de sigilo funcional.
Na sua manifestação, Aras diz que as informações divulgadas pelo chefe do executivo federal não estavam protegidas por sigilo e que, portanto, a publicidade desses dados “não constitui crime”. O que não é verdade.
Em 4 de agosto do ano passado, Jair Bolsonaro divulgou em uma live e nas suas redes sociais a íntegra de um inquérito sigiloso da PF sobre uma invasão de hacker a sistemas e bancos de dados do TSE, que tramitava na corte desde 2018 em conjunto com uma investigação da Polícia Federal. Segundo o TSE, a invasão não representou riscos às eleições de 2018.
Bolsonaro tentava desacreditar a Justiça Eleitoral e as urnas eletrônicas para emplacar seu voto impresso, que depois foi rejeitado pelo Congresso. Da live participou também o deputado o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), que teve acesso ao material sigiloso.
Na época, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) notícia-crime contra Bolsonaro pela divulgação ilegal dos documentos sigilosos. A suspeita era de delito cometido “por parte do delegado de Polícia Federal que preside as investigações, do deputado federal Filipe Barros (PSL) e do presidente da República, Jair Messias Bolsonaro. O delito foi a passagem ilegal ao mandatário de informações confidenciais contidas no inquérito da Polícia Federal que investiga o ataque hacker sofrido pelo Tribunal em 2018”.
Augusto Aras se baseou no seu pedido de arquivamento ao STF no depoimento do delegado da PF, Victor Neves Feitosa Júnior, responsável inicial das investigações do caso da invasão do hacker, que disse que não adotou regime de segredo de Justiça no inquérito. Foi Victor Neves Feitosa quem passou o material irregularmente para o deputado Filipe Barros. O ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro César Barbosa Cid, também foi implicado no vazamento pela PF.
O delegado foi afastado do caso pelo ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito no STF.
Para Moraes, o levantamento do sigilo pelo delegado da Polícia Federal e o compartilhamento dos documentos pelo presidente e o deputado bolsonarista configuraram o crime de divulgação de segredo com potencial prejuízo à administração pública.
Em seu relatório ao ministro Alexandre de Moraes, a delegada Denisse Ribeiro, responsável pelo inquérito, apontou que Filipe Barros e Jair Bolsonaro “tiveram acesso em razão do cargo de deputado federal relator de uma comissão no Congresso Nacional e de presidente da República, respectivamente, conforme hipótese criminal até aqui corroborada”.
“Os elementos colhidos apontam também para a atuação direta, voluntária e consciente de Filipe Barros Baptista de Toledo Ribeiro e de Jair Messias Bolsonaro na prática do crime previsto no artigo 325, §2°, c/c [combinado com o] 327, §2°, do Código Penal brasileiro, considerando que, na condição de funcionários públicos, revelaram conteúdo de inquérito policial que deveria permanecer em segredo até o fim das diligências”, diz o relatório da delegada da PF.
Assim delegada pediu que Bolsonaro fosse prestar depoimento sobre o caso. No dia marcado, 28 de janeiro, ele não apareceu na PF para depor.
Mas em novo relatório para Moraes, a delegada disse que o fato de Bolsonaro não ter ido ao depoimento sobre o inquérito não impediu a análise do caso. “Decorrido o prazo estabelecido, não houve atendimento à ordem judicial mencionada, inviabilizando-se a realização do ato e a consequente obtenção da perspectiva do sr. Jair Messias Bolsonaro a respeito dos fatos. Essa situação, entretanto, não teve o condão de impedir a correta compreensão e o esclarecimento do evento”, escreveu a investigadora.