Após quase um mês, Bolsonaro sanciona lei que cria linha de crédito

Sancionado pela presidência da República na terça-feira dia 19/05, com quase um mês depois
da aprovação pelo Senado Federal em 24 de abril, a Lei 13.999 de 2020 cria o Programa
Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe).
A Lei com prazo para vigorar nos próximos três meses, renováveis por outros três meses, cria
uma linha especial de crédito para capital de giro, voltada para as micro empresas e empresas
de pequeno porte e poderá ser operada pelos bancos e agentes financeiros que assim
desejarem.
A decisão de Bolsonaro em vetar um período de oito meses de carência para o início da
amortização do empréstimo é um obstáculo muito grande para os micro e pequenos
empresários financiarem recursos pelo programa.
Exatamente por se tratar de uma linha de crédito para atender o déficit de capital de giro. Sem
carência, logo no primeiro mês de execução do contrato, o tomador ao pagar a prestação do
empréstimo vai aumentar seu déficit de caixa, numa total incoerência com o propósito da
iniciativa do Congresso.
Com a carência, que precisaria ser de pelo menos seis meses, diante do horizonte de
manutenção de medidas de combate à Covid-19, a ideia é de que as empresas, retomando
seus negócios mais adiante, gerem caixa, aí sim, para absorver a totalidades de suas despesas
e o custo da parcela mensal do empréstimo.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) criticou os vetos feitos pelo presidente Jair Bolsonaro
à matéria. “Criamos no Congresso um auxílio importante para os micro e pequenos
empresários através do Pronampe. No entanto, Bolsonaro vetou a carência para o pagamento
do empréstimo e a prorrogação de prazos para pagamentos. Até agora, Bolsonaro não fez
nada pelo setor!”, denunciou no Twitter.
A lei não prevê nenhum expediente administrativo de emergência, fazendo com que o
processamento do pedido de crédito fique por conta da burocracia dos bancos, inclusive
sujeito as não incomuns travas na negociação no balcão de atendimento.
Inclusive as dificuldades que são colocadas pelos gerentes de relacionamento impelidos a
oferecer outras linhas mais lucrativas para si ou mesmo reciprocidades em desacordo com a
legislação, mas praticadas largamente.
O que já é uma desvantagem colocada ao tomador do empréstimo em tempos normais, numa
situação como a que atravessamos é uma verdadeira afronta aqueles que querem manter suas
empresas, produzir e prestar serviços.
O prazo máximo de 36 meses também é limitado, ficou curto e poderá ser também um
obstáculo para os interessados. O mais efetivo seriam 60 meses. Prazo com este ou mais, são,
por exemplo, comuns em muitos Refiz, inclusive os de duvidosa finalidade.
Recuperar os negócios depois de atravessar o tsunami da Covid-19 gerando caixa para as
despesas correntes e mais a amortização mensal do financiamento não será fácil para a grande
maioria das micro e pequenas empresa, com faturamentos de até R$ 360 mil e de R$ 360 mil a
R$ 4,8 milhões respectivamente.
A vigência de três meses do programa, renováveis por mais três meses, poderia prever uma
segunda renovação. Na melhor das hipóteses com chamado “platô” da infecção do vírus
previsto para julho, os efeitos da crise que a economia terá que superar, tendem a estender-se
para além do final do ano.
Os R$ 15,9 bilhões de dotação orçamentária para o Pronampe parecem pouco. Os pequenos
negócios empresariais são formados pelas micro e pequenas empresas (MPE) e pelos
microempreendedores individuais (MEI).
No Brasil existem 6,4 milhões de estabelecimentos. Desse total, 99% são micro e pequenas
empresas (MPE). As MPEs respondem por 52% dos empregos com carteira assinada no setor
privado (16,1 milhões), conforme o Sebrae.
Para atender para valer as micro e pequenas empresas, considerando 70% delas a um
financiamento médio de R$ 10 mil, serão necessários R$ 45 bilhões.
A taxa de juros anual máxima estabelecida pelo programa é civilizada. Igual a Selic (hoje em 3%
ao ano), acrescida de 1,25% (um inteiro e vinte e cinco centésimos por cento) sobre o valor
concedido. Não há menção de spread adicional do agente financeiro.
As empresas que obterem a linha de crédito emergencial do Pronampe não poderão demitir
seus funcionários, desde a contratação do crédito até 60 (sessenta) dias após o recebimento
da última parcela.
Ainda sobre vetos, outro deles foi o item que previa que os bancos deveriam conceder o
financiamento no âmbito do Pronampe, mesmo que a empresa tivesse anotações em
quaisquer bancos de dados, públicos ou privados, de restrição ao crédito, inclusive protesto.
A terceira pesquisa realizada pelo Sebrae, em conjunto com a Fundação Getúlio Vargas, desde
março no início da crise causada pela pandemia, demonstrou que cresceu em 8 pontos
percentuais a proporção de empresários que buscaram crédito entre 7 de abril e 5 de maio
deste ano.
O levantamento mostra ainda que 90% das empresas de micro e pequeno porte registram
queda nas receitas.
O estudo mostra ainda que 86% dos pequenos empresários que buscaram crédito para manter
seus negócios não conseguiram ou ainda têm seus pedidos em análise. Desde o início das
medidas de isolamento no Brasil, apenas 14% daqueles que solicitaram crédito tiveram
sucesso.
O mesmo estudo confirma uma tendência já identificada em outras pesquisas do Sebrae, de
que os donos de pequenos negócios têm, historicamente, uma cultura de evitar a busca de
empréstimo. Mesmo com a queda acentuada no faturamento, 62% não buscaram crédito
desde o começo da crise.
O veto indiscriminado ao acesso ao crédito pelo Pronampe às empresas com restrição de
crédito vai acabar mantendo esse cenário, visto que além dos juros estratosféricos e a
burocracia bancária, milhões de micro e pequenas empresas não obtêm crédito regularmente
devido ao uso de critérios de rigidez e formalismos exigidos delas como se fossem empresas de
grande porte.
Só que nesse momento as soluções caseiras, como empréstimos de parentes e amigos vão se
esgotar, e recorrer a agiotas é o fim. Por isso mesmo, é mais do justificável uma flexibilização
do crédito, mesmo diante de certas restrições.
O Pronampe precisava vir para salvar empresas e não para ser uma linha de crédito
melhorada. Com dois anos de recessão e três patinado no fundo do poço, quem ficou já
ganhou o atestado de sobrevivente. No entanto, nessa crise que teremos que atravessar não
haverá fôlego sem a injeção vigorosa de recurso.
Inclusive a fundo perdido, no sentido contrário do fundo garantidor que está previsto na Lei do
Pronampe que só vai onerar ainda mais os empréstimos, visto que sua operação depende de
um percentual embutido nas prestações de amortização dos empréstimos.
Para finalizar, o § 2º do artigo 3º. da lei em questão prevê que: “O valor não utilizado para
garantia das operações contratadas no prazo previsto no caput do art. 3º desta Lei, assim
como os valores recuperados, inclusive no caso de inadimplência, deverão ser devolvidos à
União, nos termos em que dispuser a Sepec, e serão integralmente utilizados para pagamento
da dívida pública de responsabilidade do Tesouro Nacional.”