Angela Albino: “Precisamos de mais mulheres na disputa de poder real”
Está convocada a 3ª Conferência Nacional do PCdoB sobre a Emancipação das Mulheres (3CNEM) que deve reunir cerca de 300 comunistas entre os dias 22 e 24 de maio, em São Paulo-SP. A agenda ajuda a dar consequência a prioridade estabelecida no Estatuto do partido para a luta contra a discriminação às mulheres.
O Portal PCdoB conversou com a secretária nacional da Mulher do PCdoB, Angela Albino sobre os desafios postos para Conferência. Segundo ela, a expectativa é que, com o processo que leva a plenária final do 3CNEM, o Partido atualize suas táticas para a emancipação das mulheres. Além disso, deve fortalecer as estratégias contra os retrocessos que vem sendo impostos pelo governo Bolsonaro contra as políticas de gênero, bem como buscar modos de resistir aos problemas que se acumulam nesta fase do capitalismo. Realizada em ano de eleições municipais e enfatizando as atuações locais, as conferências devem incentivar ainda mais a participação das mulheres na política.
“As conferências precisam servir para o PCdoB atualizar sua teoria, sua tática, mas também para se mostrar para a sociedade, para que mais mulheres se entusiasmem para vir para o PCdoB e para a vida política. Não tem democracia se não tiver mulheres na política”, ressaltou Angela.
Como explica a dirigente, para o PCdoB a conferência que trata de temas relativos às mulheres deve envolver o Partido como um todo – “há, inclusive, uma cota de 30% de participação masculina”, anunciou.
Todos os documentos sobre a participação neste processo de conferência foram publicados no Portal. Clique no linque e conheça: a carta de apresentação da 3ª Conferência Nacional do PCdoB sobre a Emancipação das Mulheres; o documento base para debates e os critérios de eleição de delegadas e delegados, bem como o regimento interno.
Confira a seguir a íntegra da entrevista de Angela Albino ao Portal PCdoB:
Portal PCdoB – Angela, como a conferência funciona? Como começa o processo, quem participa dele?
Angela Albino – O PCdoB tem um grande diferencial que é compreender que este tema não é um tema das mulheres do PCdoB. É do PCdoB. É sobre a emancipação das mulheres. Portanto, a gente quer envolver o coletivo partidário. Esta é a nossa tradição. É o que queremos fazer pra avançar mais na compreensão, seja de uma nova tática para tratar do tema, seja dos novos papéis que se desenham para as mulheres e para os novos fenômenos de feminismo, não é? O que é este feminismo jovem, o feminismo negro? Então, na conferência vamos nos atualizar teoricamente, atualizar nossa tática, e vamos fazer isso em todo o partido. Esta é uma questão central. Por isso a gente faz conferências municipais, distritais, regionais, estaduais e depois culmina com a nacional. Esta elabora um documento que será submetido à Direção Nacional do PCdoB. O documento, portanto, não é das mulheres. É do PCdoB. E a sua direção aprova para que seja o guia que norteia nossas ações.
Nós vamos fazer uma conferência nacional com cerca de 300 pessoas. E cada realidade de estado vai determinar como serão suas conferências municipais, ou regionais, ou estaduais. O que a gente faz também questão de preservar é uma tradição de que 30% dos delegados sejam homens. Por que assim, reafirmo, não queremos uma conferência das mulheres, é sobre a questão da mulher. E, portanto, deve envolver todo o coletivo partidário.
E qual a importância de realizar a conferência neste cenário político que estamos vivendo no Brasil?
O PCdoB tem uma grande tradição de acúmulo teórico, mas também de vivência forte de mulheres dentro do partido. Isso se traduz, por exemplo, nas grandes expressões femininas, sejam as parlamentares, seja dirigindo entidades, seja por nossa presidenta nacional, a Luciana Santos.
Este acúmulo precisa estar atualizado para este tempo de viragem política no Brasil. Vamos construir a tática mais ajustada neste momento em que o campo ultraconservador nos costumes, tacanho, retrógrado, assume o poder e trás isso como uma bandeira muito forte, uma bandeira de Estado. Além disso, esta tática precisa estar alinhada aos efeitos da fase atual do capitalismo sobre a vida das mulheres.
Como o tema é o cenário, acho importante comentar as eleições, não é? Que papel cumpre a conferência em um ano eleitoral? Você acha que ela pode ajudar no desempenho do partido?
Nós somos um partido que historicamente, e neste momento, inclusive, temos grande participação percentual de mulheres na bancada federal, por exemplo. Hoje somos proporcionalmente a maior bancada feminina na Câmara. Mas, como todo partido político, as mulheres têm uma participação que ainda tem muito espaço para crescer. E o processo de conferência, temos insistido muito para que valorize as conferências municipais e estaduais. A conferência nacional, à vista de outras que já fizemos, ela será relativamente pequena. O que de fato queremos é que os debates ocorram nos estados, nos municípios, nas regiões, para dialogar com a realidade local.
Apesar de um dos eixos importantes ser a atualização teórica, estamos centrando energia na construção da ação concreta neste momento. As mulheres são 2/3 dos analfabetos do mundo, 2/3 dos miseráveis do mundo, nós somos titulares de apenas 2% das riquezas do planeta. É obvio que dentro do capitalismo, que oprime toda a classe trabalhadora, há vivências diferentes dessa opressão. A mulher, a mulher negra, a mulher lésbica, a trans. Essas mulheres tem uma vivência de capitalismo mais cruel, mais dura. E o PCdoB tem avançado para compreender que nem é só ter uma leitura da realidade que se esgota no debate de mulheres, nem é possível achar que só o debate de classe vai dar conta das especificidades. É uma relação alquímica. Elas se interagem, essas duas dimensões e por isso é tão importante que o PCdoB coletivamente tenha o maior desenvolvimento possível sobre essas teorias e sobre a vivência.
A Manuela d’Avila usou em Florianópolis, quando era pré-candidata a presidência da República, uma fala linda, que é um bom exemplo deste fato. Na época, Temer tinha mexido na política de preços do gás de cozinha, o que fez explodir o número de queimaduras. E quem se queimava? Mais as mulheres, porque elas ficam em casa e para cozinhar, por não poder arcar com um botijão, usavam lenha, álcool. Então, é ou não é diferente a vivência de um trabalhador branco no escritório, que também é classe trabalhadora, em comparação com uma mulher negra, na periferia, com três filhos, empregada doméstica, com cinco ônibus pra pegar? É uma outra experiência. E isso é importante refletir sobre isso. Não é só uma coisa, mas também não é apenas a outra.
E já que a ênfase é desenvolver debates no local, talvez as conferências tenham uma influência interessante neste momento de eleição municipal, não é?
Sim. A gente entende que o processo das conferências não vai competir com o processo eleitoral, ao contrário, esperamos que desperte as mulheres para vida política. Nossa lema vai ser “Mais democracia, mais mulheres na política” porque temos a convicção de que é preciso trazer mais mulheres pra disputa de poder real, de poder político, pra gente poder construir avanços. Temos um deficit histórico no Brasil de representação política feminina. E sim, para o PCdoB as conferências são momento em que a gente se mostra para as mulheres e para a sociedade. E em que desejamos trazer mais mulheres para o PCdoB, para a disputa eleitoral.