A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) divulgou nota
repudiando à Medida Provisória 927 que, entre outras medidas, permitia a suspensão dos
contratos de trabalho por até 4 meses sem garantia de remuneração ao trabalhador, publicada
na noite do último domingo (22).
Para a Associação, as “medidas impactam direta e profundamente na subsistência dos
trabalhadores, das trabalhadoras e de suas famílias, assim como atinge a sobrevivência de
micro, pequenas e médias empresas, com gravíssimas repercussões para a economia e
impactos no tecido social”.
“A Medida Provisória nº 927 retira dos trabalhadores e das trabalhadoras as condições
materiais mínimas para o enfrentamento do vírus e para a manutenção de básicas condições
de subsistência e de saúde. E, na contramão do que seria esperado neste momento, não
promove qualquer desoneração da folha ou concessão tributária – com a exata e única
exceção do FGTS, parte integrante do salário. Há omissão, que se converte em silêncio
injustificável, quanto à proteção aos trabalhadores e às trabalhadoras informais. É notável a
desconsideração sobre a justiça e a progressividade tributárias. Ademais, a forte, e necessária
participação estatal, assumindo parte dos salários, não aparece como solução”, diz a nota.
O artigo 18 da MP – que após muitas críticas será revogado, segundo Bolsonaro anunciou em
seu Twitter – facultava ao empregado “a possibilidade de se prolongar a suspensão do
contrato de trabalho por até quatro meses, sem qualquer garantia de fonte de renda ao
trabalhador e à trabalhadora, concedendo-lhes apenas um ‘curso de qualificação’, que
dificilmente poderão prestar em quarentena, e limitando-se a facultar ao empregador o
pagamento de uma ajuda de custo aleatória, desvinculada do valor do salário-mínimo.”
A entidade afirma que a medida vai na contramão da ações de proteção ao emprego adotadas
pelos principais países do mundo como a França, Itália, Reino Unido e Estados Unidos, países
centrais na capitalismo mundial. Assim, “a MP nº 927, de forma inoportuna e desastrosa,
simplesmente destrói o pouco que resta dos alicerces históricos das relações individuais e
coletivas de trabalho, impactando direta e profundamente na subsistência dos trabalhadores,
das trabalhadoras e de suas famílias, assim como atinge a sobrevivência de micro, pequenas e
médias empresas, com gravíssimas repercussões para a economia e impactos no tecido social”.
“Em pleno contexto de tríplice crise – sanitária, econômica e política, a MP nº 927 lança os
trabalhadores e as trabalhadoras à própria sorte. Isso acontece ao privilegiar acordos
individuais sobre convenções e acordos coletivos de trabalho, violando, também, a Convenção
nº 98 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A medida, outrossim, torna inócua a
própria negociação, ao deixar a critério unilateral do empregador a escolha sobre a
prorrogação da vigência da norma coletiva”, diz nota.
A ANAMATRA denuncia ainda que a MP “suprime o direito ao efetivo gozo de férias, porque
não garante, a tempo e modo, o adimplemento do 1/3 constitucional. Também como se fosse
possível institucionalizar uma “carta em branco” nas relações de trabalho, a referida MP
obstaculiza a fiscalização do trabalho, conferindo-lhe natureza meramente “orientadora”.
“Ao apenas pedir o sacrifício individual das pessoas que necessitam do trabalho para viver, a
MP nº 927 indica que soluções que impliquem em pactos de solidariedade não serão
consideradas, tais como a taxação sobre grandes fortunas, que tem previsão constitucional; a
intervenção estatal para redução dos juros bancários, inclusive sobre cartão de crédito, que
também tem resguardo constitucional; a isenção de impostos sobre folha de salário e sobre a
circulação de bens e serviços, de forma extraordinária, para desonerar o empregador.”, diz a
nota.
O documento afirma que as inconstitucionalidades da Medida Provisória nº 927 são óbvias e
defende que “a Constituição de 1988 deve ser invocada sobretudo nos momentos de crise,

como garantia mínima de que a dignidade dos cidadãos e das cidadãs não será
desconsiderada”.
“ A Constituição confere à autonomia negocial coletiva, e aos sindicatos, papel importante e
indispensável de diálogo social, mesmo, e mais ainda, em momentos extraordinários.
Estabelece a irredutibilidade salarial e a garantia do salário-mínimo como direitos humanos.
Adota o regime de emprego como sendo o capaz de promover a inclusão social. Insta ao
controle de jornada como forma de preservação do meio ambiente laboral, evitando que a
exaustão e as possibilidades de auto e de exploração pelo trabalho sejam fatores de
adoecimento físico e emocional”, defende a Associação.
“ A presente crise não pode, em absoluto, justificar a adoção de medidas frontalmente
contrárias às garantias fundamentais e aos direitos dos trabalhadores. Impor a aceitação
dessas previsões, sob o argumento de que ficarão todos desempregados, não é condizente
com a magnitude que se espera do Estado brasileiro. Os poderes constituídos – Executivo,
Legislativo e Judiciário – e a sociedade civil são corresponsáveis pela manutenção da ordem
constitucional. Em momentos como o presente é que mais se devem reafirmar as conquistas e
salvaguardas sociais e econômicas inscritas, em prol da dignidade da pessoa humana e do
trabalhador e da trabalhadora, do desenvolvimento sócio-econômico e da paz social”, conclui
a nota.