O lançamento da pré-candidatura à Presidência da República de Manuela D’Ávila, ex-deputada federal e atualmente deputada estadual no Rio Grande do Sul, movimentou o cenário político. As reações foram variadas: houve quem celebrou a sua entrada na disputa como uma possibilidade da esquerda apresentar novas opções para a sociedade, enquanto os outros questionaram a decisão do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) de lançar uma candidatura própria, o que poderia colocar em xeque a construção de uma ampla aliança de esquerda ainda no primeiro turno nas eleições presidenciais de 2018.

Por Alexandre Santini*

Em primeiro lugar, não há normalidade nas eleições presidenciais de 2018. É uma eleição que acontecerá após uma ruptura institucional – o golpe parlamentar de 2016 – que jogou o país em uma crise política sem precedentes. Há um processo de judicialização e criminalização da política, hoje comandado por uma casta de juízes e procuradores cujo compromisso com a democracia é, no mínimo, duvidoso. Todas as forças políticas do país vivem um momento de incerteza e instabilidade.

No canto direito do ringue, temos Aécio, apanhado em flagrante. Após receber 40 milhões de votos em 2014 contra Dilma, o (quase ex) senador mineiro é hoje um morto-vivo da política, desidratado em suas pretensões eleitorais. Deve se concentrar em Minas Gerais para sair da eleição pelo menos com um mandato de deputado federal, que lhe dê garantias de imunidade e foro privilegiado. Os caciques do PMDB estão com o filme queimado, a começar pelo “presidente” e seus auxiliares diretos, pegos com a boca na botija em tenebrosas transações. O PSDB lança seus balões de ensaio como Dória e Alckmin, com pouco sucesso. O nome de Luciano Huck entrou na jogada. E a direita moralista e conservadora fala grosso com a presença consolidada de Jair Bolsonaro como forte candidato à Presidência.

À esquerda do ringue, Luiz Inácio Lula da Silva aparece como franco favorito, vencendo em todos os cenários de primeiro e segundo turnos, e ampliando a sua vantagem à medida que a crise econômica se aprofunda, com efeitos drásticos sobre a vida da população mais pobre. Apesar da campanha diuturna da mídia e da perseguição judicial, Lula é a encarnação de um período de estabilidade econômica, aumento do emprego, da renda e do consumo, ampliação do acesso à educação e políticas sociais distributivas. Lula é hoje, mais que um político, o único líder de massas vivo no Brasil, e talvez no mundo. As caravanas que tem feito pelo Brasil demonstram isso. Lula pavimenta, nos braços do povo, seu caminho para o retorno à presidência em 2018.

No entanto, a condenação em primeira instância por Sergio Moro e a perseguição judicial-midiática de que é vítima lançam sombras de incerteza sobre a sua candidatura. O PT tira algum proveito eleitoral desta instabilidade e cria a narrativa de uma eleição plebiscitária, onde ou se está com Lula ou se está contra Lula. A realidade, no entanto, é que independente da necessária defesa da candidatura do ex-presidente como garantia mínima de um pleito eleitoral democrático, é necessária a construção de uma ampla coalizão de centro-esquerda em torno de uma agenda comum que combata e supere o momento crítico que vive o país. Esta é uma aliança que será importante para ganhar, mas, principalmente, para garantir as condições de governar o país pós-2018.

Neste contexto, as candidaturas de Manuela D’Ávila, Ciro Gomes, e mesmo as especulações em torno do nome de Guilherme Boulos, líder do MTST, demonstram que a esquerda tem alternativas e boas opções de nomes. Desde um ex-governador e ex-ministro experiente como Ciro, a novos quadros como Boulos e Manuela, que se projetam não só para 2018, mas em um horizonte de futuro para os próximos 20 anos. Manuela e Boulos dão mais destaque a temas importantes para uma agenda da esquerda no século 21: direito à moradia, a questão da mulher, o feminismo, o direito à cidade, as novas tecnologias, etc.

O PCdoB vai percorrer o Brasil com a sua candidata Manuela D’Ávila, apresentando seu programa e suas propostas para o país, procurando construir ao lado das forças progressistas uma agenda e um programa que livre o país do retrocesso. O partido mais antigo do Brasil insere o nome de uma jovem mulher e mãe, de 36 anos, no debate presidencial, o que por si só já se configura num belo desafio.

O PCdoB esteve ao lado de Lula desde 1989, demonstrando grande lealdade a ele e a Dilma (às vezes, mais que o próprio PT) nos bons e nos maus momentos. Seguramente, não será este partido que colocará obstáculos a uma unidade ampla da esquerda em torno de Lula ou de qualquer outro nome, se lá na frente essa possibilidade se confirmar.

Cada jogada enseja infinitas possibilidades, e a consequência da mexida de uma peça será percebida alguns lances mais à frente, como nos jogos de tabuleiro. Aqueles que dizem que o lançamento da pré-candidatura de Manuela D’Ávila atrapalha a unidade da esquerda são jogadores de dama. Os que estão entendendo que contribui com a unidade jogam xadrez.

*Alexandre Santini é gestor cultural, dramaturgo e escritor. Formado em Teoria do Teatro pela UNIRIO e mestre em Cultura e Territorialidades pela UFF. Foi diretor de Cidadania e Diversidade Cultural do Ministério da Cultura entre 2015 e 2016. Atualmente dirige o Teatro Popular Oscar Niemeyer, em Niterói (RJ) e é autor do livro Cultura Viva Comunitária: Políticas Culturais no Brasil e na América Latina(ANF Produções)

Fonte: Agência de Notícias das Favelas