Aldo Arantes: Frente de esquerda ou Frente ampla?
Em Artigo intitulado Frente Ampla ou Frente Popular, Bruno Altman critica a política de Frente Ampla formulada pelo PCdoB.
Por Aldo Arantes*
Cita trecho do documento de preparação do Congresso do Partido onde afirma “é falsa a contradição entre golpistas e anti-golpistas, isso estreita a compreensão do cenário político” e conclui que “Não precisa de muito esforço para entender que essa chave de leitura, potencialmente, acena para a rearticulação, parcial ou completa, do esquema de alianças que prevaleceu nos governos Lula e Dilma”.
De fato aí reside a divergência central de nossas opiniões. Enquanto Altman nega as alianças feitas por Lula e Dilma considero que o erro não esteve nas alianças mas sim em não compreender seu caráter transitório. E, em função disto, não ter se preparado para quando elas não mais interessassem às partes.
As classes dominantes têm à sua a disposição o poder econômico, a mídia e outros aparelhos de formação da opinião pública. Face a esta realidade a esquerda, ao assumir o governo, deve adotar medidas visando se fortalecer para o inevitável embate de ideias entre as políticas e concepções defendidas pelo novo governo. Dentre outras medidas seria importante ter adotado políticas de democratização dos meios de comunicação e realizado debates na sociedade em torno do novo projeto de Nação que estava sendo colocado em prática.
Por outro lado não foram realizadas as reformas estruturais para aprofundar o processo democratização do estado, como a reforma política. Com isto permitiu-se a continuidade de uma representação política à base do dinheiro resultando num parlamento que aprovou o impeachment da presidenta Dilma. Isto porque o Deputado Eduardo Cunha havia comprado cerca de 200 parlamentares.
Pode-se argumentar que o governo não tinha forças para realizar as reformas estruturais. Todavia o empenho foi pequeno e não houve um debate na sociedade sobre a importância das reformas estruturais.
Ao não tomar tais medidas o governo ficou vulnerável à ação golpista. E a sociedades desarmada para entender o que ocorria. Toda grande mídia, apesar de financiada pelo governo, se voltou contra ele.
Em sua argumentação Bruno Altmam afirma que o PT, em seu 6º Congresso, não definiu sua política de alianças afirmando no entanto que “a orientação petista caberia melhor se o enunciado fosse Frente Popular”.
Ao definir o arco de alianças que considera mais adequada ressalta que seria composta pelas “forças progressistas, cujos recortes principais são a atitude frente ao golpe e a postura contra as reformas neoliberais”. E ressalta que seria um “pacto estratégico das correntes populares”.
Haveria que se perguntar: Lula sendo candidato venceria só com alianças dos setores progressistas?
Ora o que o PCdoB propõe é uma frente tática para resolver os problemas do momento a partir de uma análise concreta da conjuntura do país e não uma frente estratégica para reformar a estrutura do estado brasileiro.
Vivemos um momento de profundo retrocesso democrático, das conquistas sociais, políticas e da afirmação das soberania nacional. Para isto foi formada uma ampla aliança de forças entre o grande capital, sobretudo financeiro, a mídia e os partidos que fizeram oposição à Presidenta Dilma. A decorrência desta aliança foi a conquista da hegemonia política e de ideias com o crescimento da direita e da extrema direita.
O país enfrenta um verdadeiro estado de exceção. A Constituição formal tem sido substituída, na prática, pelas regras de interesse do neoliberalismo. O estado democrático de direito está sendo pisoteado. As reformas do ilegítimo governo Temer investem contra os direitos dos trabalhadores e o patrimônio público. Nestas condições o objetivo imediato é a união mais ampla de forças contra esta avassaladora onda antidemocrática e antinacional.
Portanto, a plataforma para enfrentar tal situação tem um conteúdo democrático, social e nacional. Deve incorporar todos os segmentos afinados com a plataforma tática, mesmo aqueles que temporariamente foram ganhos pelo golpe. Ganhar setores de centro e os segmentos menos politizados da sociedade é condição para a retomada da iniciativa política com amplas bases sociais.
Aliás é um objetivo fundamental em todo tipo de luta política: isolar o adversário e ganhar forças que o apoiam. Por isto mesmo, a aliança somente das forças progressistas está longe das necessidades que a luta política coloca no momento.
Acumulando forças, retomando a hegemonia política e de ideias estará aberto o caminho para as reformas estruturais que o país necessita. Querer colocar objetivos para os quais não temos forças necessárias é errar o alvo da luta e retardar a retomada do caminho civilizatório que o país trilhava.
Na Frente Ampla a formação de um núcleo de afinidades de esquerda deverá jogar importante papel. Esta afinidade implica em uma convergência de programas estratégico e tático.
A concepção de que a frente deverá ser das forças progressistas deixa claro que a Frente Popular, defendida pelo autor é, na realidade, uma frente fundamentalmente de esquerda que não atende ao momento político vivido pelo pais. Pois só a esquerda, com uma aliança restrita, não tem condições de abrir novos caminhos para o povo brasileiro.
Apesar da divergência de conteúdo, a forma da crítica foi respeitosa. No passado, muitas vezes as polêmicas entre setores de esquerda foram feitas de forma sectária. Mao Tse Tung destacava a existência de contradições antagônicas e não antagônicas no seio do povo e que elas deveriam ter distintos tratamentos.
Assim há se preservar a unidade em torno das lutas que nos unem. Todavia há que se fazer, sem sectarismo, a luta teórica no sentido de identificar qual o melhor caminho para a luta democrática e popular. Em última instância, será a prática da luta política que se encarregará de esclarecer qual a orientação mais ajustada à realidade.
*Aldo Arantes, deputado Constituinte de 1988. Membro da Comissão Política Nacional do Comitê Central do PCdoB