A Revolução do socialismo e internacionalismo proletário
“O socialismo continua sendo uma necessidade objetiva da evolução da civilização humana. E, nessa ótica, o socialismo e a sociedade sem classes, o comunismo, são o ideal supremo a justificar a existência e a atividade do Partido Comunista”.
Por José Reinaldo Carvalho*
O ensaio sobre os 100 anos da revolução soviética “A revolução do socialismo e internacionalismo proletário” foi escrito pelo jornalista e Secretário de Política e Relações Internacionais do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), José Reinaldo Carvalho. Este texto, do qual publicamos, abaixo, uma versão resumida, serviu como base para a intervenção de José Reinaldo no dia 02 de novembro durante o Encontro Internacional de Partido Comunistas e Operários (EIPCO), que está ocorrendo em São Petersburgo e Moscou, com a presença de 103 organizações revolucionárias. A delegação do PCdoB no 19º EIPCO, contou ainda com as participações de Jandira Feghali, deputada federal e membro do Comitê Central do PCdoB e Socorro Gomes, presidenta do Conselho Mundial da Paz (CMP) e também membro do CC. Em nome do PCdoB, José Reinaldo leu sua intervenção da tribuna do palácio Tauride (Tavrichesky, em russo) onde em 1917 Vladimir Lênin apresentou as célebres Teses de Abril. Nesse link o leitor tem acesso ao texto completo do ensaio ou pode baixar a versão em PDF – A Revolução do socialismo e internacionalismo proletário.
“Comemora-se em todo o mundo no dia 7 de novembro o centenário do mais importante acontecimento político e social da história da humanidade – a Grande Revolução Socialista na Rússia. Os meios de comunicação das classes dominantes estão repletos de artigos e ensaios enxovalhando a revolução e a construção do socialismo. Procuram rebaixar o significado da efeméride e mandam sua depressiva mensagem: nada a comemorar. Mas o proletariado consciente, os partidos comunistas e revolucionários, os amantes da paz, os que combatem em todo o mundo por transformações políticas e sociais, opondo-se à barbárie capitalista, têm sim, tudo a comemorar.
Foi uma epopeia que se escreveu não apenas durante os breves e intensos “dez dias que abalaram o mundo”, mas uma gesta iniciada muito antes, pelo “grande povo russo”, para usar a expressão de seu maior escritor, Leon Tolstói. Na Revolução russa, pensadores revolucionários e homens de ação de épocas anteriores, ativistas políticos, agitadores e organizadores da luta contra a autocracia czarista e, desde o início do século 20, o Partido Bolchevique, sob a direção de Lênin, com todos os revolucionários de sua geração, desempenharam papel decisivo, quando se exigiu a intervenção do fator subjetivo. Mas sem a plena mobilização da atividade criadora das massas populares, fruto de prolongado e aturado acúmulo de forças, não é possível o progresso social nem empreender o salto civilizacional. O que, por sua vez, requer o protagonismo das massas e das classes, condição determinante para o desempenho do papel do indivíduo.
Na sociologia e na historiografia do período pré-marxista, assim como nos tempos atuais, de hegemonia do pensamento burguês, predomina a opinião de que o papel determinante no desenvolvimento da sociedade é desempenhado pela “grandes figuras”, “os eleitos”, a chamada elite, enquanto as massas populares não são outra coisa senão mão de obra e “carne de canhão”, uma multidão passiva, ignorante, sem capacidade criadora, que se dirige às cegas para onde as conduzem os líderes. Esta manifestação de idealismo e subjetivismo teve a sua mais completa refutação na Revolução russa e toda a torrente de acontecimentos subsequentes, ao longo de décadas de construção do socialismo.
A revolução vitoriosa em 1917, com a consequente instauração do regime socialista e o início da construção da nova sociedade, trouxe para a cena dos conflitos sociais e geopolíticos a contradição entre os dois sistemas opostos, o socialista e o capitalista.
Na vitória da Revolução russa foi decisivo o papel dirigente desempenhado pela classe operária, por meio do Partido Bolchevique. O proletariado russo dentro de um tempo curto tinha feito duas revoluções democrático-burguesas e conquistado autoridade como dirigente do povo na luta contra o absolutismo, para derrubar a burguesia e instaurar a ditadura do proletariado.
Criou-se no país uma grande força social: a aliança da classe operária com o campesinato pobre, o qual, pela própria experiência e o grande trabalho dos bolcheviques, convenceu-se de que somente sob a direção do proletariado conquistaria a liberdade, a terra, a paz. A organização dos sovietes como poder revolucionário era a encarnação dessa aliança.
A condição decisiva para a vitória foi a direção política-ideológica do Partido Bolchevique, que entrelaçou a verdade geral do marxismo-leninismo com a prática revolucionária do próprio país. Ele conseguiu unir a luta do proletariado pelo socialismo, a luta dos camponeses pela terra e contra a exploração e a violência dos latifundiários, a luta de libertação nacional dos povos oprimidos da Rússia contra a opressão nacional e luta de todo o povo contra a guerra imperialista. O Partido conseguiu separar as massas da influência dos partidos oportunistas e derrotou as suas tentativas e do Governo Provisório de impedir o desenvolvimento e a vitória da revolução socialista.
Variados fatores externos, que abordaremos adiante com mais detalhes na sequência influíram na vitória da Revolução de Outubro.
Peculiaridades do auge revolucionário
O auge revolucionário na Rússia, entre fevereiro e outubro de 1917 foi marcado por um fenômeno peculiar, cuja solução foi a insurreição armada e a tomada do poder pelos bolchevique: a dualidade de poderes surgida a partir da Revolução de Fevereiro.
As contradições de classe na Rússia se agravaram ainda mais durante a Primeira Guerra Mundial. O proletariado sofria a dupla exploração dos capitalistas nacionais e estrangeiros. Mais da metade do proletariado concentrava-se em grandes empresas. Esta concentração facilitava a organização e dava força à sua luta. A feroz exploração, o regime policial, a luta imperialista e a constante atividade do Partido Bolchevique entre as massas faziam com que o movimento operário assumisse acentuado caráter político.
Os quadros e agitadores bolcheviques atuavam vivamente entre as massas nas cidades, no campo e no front de guerra. Em cada greve e ação de massas ouviam-se as palavras de ordem “Abaixo o czarismo!” “Abaixo a guerra!”. Em 27 de fevereiro de 1917, essas manifestações se transformaram em insurreição em Petrogrado. Os trabalhadores explodiram depósitos de armas, armaram-se e politicamente se forjou a aliança com os soldados, em sua maioria camponeses. Os soldados não só se recusaram a atirar contra os insurretos, mas na maioria dos casos se uniram a eles. Em uma semana o poder do czar foi derrubado em toda a Rússia. Realizava-se, assim, o programa mínimo do Partido Bolchevique e a primeira etapa da revolução russa, que tinha começado em 1903.
É a partir daqui que surge este fenômeno original da Revolução Russa que foi a dualidade de poderes, a característica marcante de todo o desenvolvimento da situação política do país até a tomada do poder pelos bolcheviques, nove meses depois. A caracterização de tal situação e o manejo tático e estratégico concentraram a disputa de posições políticas e condutas práticas entre os principais sujeitos políticos do processo revolucionário russo: mencheviques, socialistas-revolucionários e bolcheviques.
A análise de Lênin sobre o momento histórico que a Rússia atravessava após a revolução de fevereiro e o rigor com que tratava o novo governo democrático constituem um desmentido a todas as falsificações da história que tentam traçar um perfil do líder revolucionário antagônico ao que ele de fato foi. Em As tarefas do proletariado na nossa revolução, o líder bolchevique caracteriza em termos rigorosos o poder surgido da revolução de fevereiro:
“O velho poder czarista, que representava apenas um punhado de latifundiários feudais, que comandava toda a máquina do Estado (exército, polícia, funcionalismo), foi derrotado, afastado, mas não recebeu o golpe de misericórdia” (…) “O poder de Estado passou na Rússia para as mãos de uma nova classe, a saber: da burguesia e dos latifundiários aburguesados. Nesta medida a revolução democrático-burguesa na Rússia está terminada”(…) Encobrindo-se com uma fraseologia revolucionária, este governo nomeia para os postos de comando partidários do antigo regime. Este governo esforça-se para reformar o menos possível todo o aparelho da máquina de Estado (exército, polícia, burocracia), pondo-o nas mãos da burguesia. O novo governo começou já a pôr toda a espécie de obstáculos à iniciativa revolucionária das ações de massas e à conquista do poder pelo povo a partir de baixo – única garantia de êxitos reais da revolução” (…)
Depois de arrolar uma série de outras razões, Lênin chegava à conclusão de que “o novo governo burguês não merece, nem mesmo no campo da política interna, nenhuma confiança do proletariado, e é inadmissível que este lhe preste qualquer apoio”.
Em março de 1917, os sovietes de deputados operários, camponeses e soldados, criação tipicamente popular, peculiar das etapas anteriores da Revolução Russa (1903), irromperam com inaudita força política e orgânica. Pela via revolucionária conquistaram as liberdades democráticas, libertaram os prisioneiros políticos e instauraram comitês representativos dos soldados ao lado dos comandos militares. Era um momento de ebulição, revolvimento das classes sociais, em que a numerosa pequena burguesia imprimia ao processo o caráter política e ideologicamente flutuante, próprio de seu caráter de classe. Pela força numérica dos seus partidos – os socialistas-revolucionários e os mencheviques – a pequena burguesia dava o tom do movimento revolucionário e hegemonizava os sovietes, em disputa com os bolcheviques. Predicavam o caráter burguês da revolução e consideraram imperioso apoiar incondicionalmente o Governo Provisório.
Assim, como resultado da vitória da revolução democrático-burguesa de fevereiro e da derrocada da autocracia czarista, foram criados simultaneamente dois poderes das classes opostas: de um lado, o poder dos operários e camponeses, representado pelos sovietes, que constituíam a única organização ampla e democrática dos trabalhadores, camponeses e militares revolucionários, e, de outro lado, o poder da burguesia, representado pelo Governo Provisório.
A dualidade de poderes não podia continuar por longo tempo; terminaria com a consolidação do poder da burguesia ou com a emergência do poder dos trabalhadores, questão que só seria resolvida pela luta política de classes.
O povo armado criou os sovietes de deputados operários, camponeses e de soldados como órgão e poder e obedecia somente a estes, por isso o Governo Provisório não podia exercer seu poder sem a aprovação dos sovietes. A burguesia foi temporariamente obrigada a substituir a política de violência contra o povo por uma política de engodo. O Governo Provisório mantinha-se graças ao apoio dos chefes socialistas-revolucionários e mencheviques. Tentava ganhar tempo a fim de se fortalecer e visava a despertar nas massas a ilusão no parlamentarismo burguês, fazendo esforços para enganá-las declarando que o problema da paz, da terra e do pão se resolveria por um órgão “representativo do povo”. Enquanto isso, a própria eleição desse órgão, a Assembleia Constituinte, era adiada.
O Partido Bolchevique lançou a palavra de ordem de desconfiança completa no Governo Provisório. Atuava para afastar as massas da influência dos socialistas-revolucionários e dos mencheviques e esclarecê-las de que as demandas em nome das quais foi feita a revolução não poderiam ser atendidas pelo Governo Provisório. Os bolcheviques também explicavam às massas que o Governo Provisório não daria a terra aos camponeses, porque a maioria das terras estavam hipotecadas aos bancos. Por outro lado, estando ligado aos imperialistas da Entente, o Governo Provisório era a favor da continuidade da guerra imperialista e pensava que a vitória militar lhe daria possibilidade de impedir a continuidade da revolução.
A conquista da liberdade, da terra, da paz e do pão só poderia ser assegurada pelo poder do proletariado. Assim, era necessário derrubar o Governo Provisório e seus apoiadores. Por isso, Lênin terminou seu primeiro discurso em Petrogrado, depois de retornar do exterior, com o chamamento “Viva a Revolução Socialista!”
O poder político, essência da revolução
Quando se torna necessário substituir a velha ordem por uma nova, as classes reacionárias recorrem a todos os meios de que o Estado dispõe, incluindo a violência, o que pressupõe não apenas fatos episódicos, mas uma violência sistêmica. O Estado monopolizado pelas classes dominantes assume manifestamente sua essência ditatorial por meio de diferentes formas de governo, incluindo aquelas em que as liberdades individuais e coletivas são negadas. É isto que torna indispensável a destruição da máquina estatal burguesa como condição para construir instituições estatais novas, que abram caminho ao exercício do poder pelas classes trabalhadoras.
Não se trata apenas de uma mudança de governo, de alterações nos gabinetes ministeriais, de alternância entre partidos que representam diferentes facções das classes dominantes ou mesmo interesses imediatos e parciais dos trabalhadores, por meio de eleições. Mas de uma tarefa complexa que envolve as forças armadas, os aparatos policiais, o poder judiciário, a administração, o sistema educacional, a mídia etc.
Diferentes setores da social-democracia, alguns invocando Marx e Engels e opondo-os a Lênin argumentaram em sentido contrário, apresentando como conceito ultrapassado a destruição do aparato estatal do Estado burguês enquanto tarefa essencial da revolução dos trabalhadores. Substituíram este conceito por diferentes tipos de “controle” e “mudanças democráticas” que levariam a uma transformação gradual do caráter do Estado. Na verdade, a rejeição à ideia de derrocada do estado burguês se confunde aqui com o próprio rechaço à ideia de revolução, que pode assim ser substituída por um fantasioso exercício do “poder democrático” mediante reformas, colaboração de classes, desenvolvimento cultural e civilizacional, impulsionados por coalizões democráticas, lutas eleitorais, compartilhamento de gestão, incluindo a cooperação internacional.
A essência do poder da revolução é constituir-se como o novo tipo de Estado que expressa e defende os interesses e aspirações vitais da classe operária e demais massas trabalhadoras, um instrumento para enfrentar as classes até então dominantes e construir o socialismo. O caráter de classe e a missão do poder de Estado dos trabalhadores se manifesta em todas as ações que realiza.
Viragem estratégica e tática
O ponto de viragem na estratégia e na tática revolucionária do Partido Bolchevique, em 1917, foi a elaboração programática de Lênin sintetizada nas famosas “Teses de Abril”, que constituíram o plano do Partido Bolchevique para a passagem da primeira etapa da revolução, em que a burguesia empalmou o poder, à segunda etapa, que derrocaria a burguesia e instauraria o poder dos trabalhadores. Para alcançar esse objetivo, era indispensável que o Partido Bolchevique conquistasse as massas populares. Por isso Lênin propôs que o Partido saísse à frente do movimento revolucionário e conquistasse no calor da luta a autoridade de dirigente das massas; que realizasse um trabalho persistente e paciente, para convencer as massas de que suas demandas só seriam atendidas se o Partido Bolchevique conquistasse o poder; e que explorasse os erros táticos do Governo Provisório e dos partidos menchevique e socialista-revolucionário, a fim de desmascará-los aos olhos das massas e afastá-las da sua influência.
Em 18 de abril de 1917, o Governo Provisório declarou que continuaria a guerra “até a vitória final”. O Partido Bolchevique explorou esse erro tático e dirigiu as grandes manifestações de 20 e 21 de abril com as palavras de ordem “Abaixo a Guerra!” e “Todo o poder aos sovietes!” A burguesia utilizou os métodos habituais de dividir o movimento operário e o povo; criou o governo de coalizão no qual ao lado dos representantes da burguesia entraram os socialistas revolucionários e os mencheviques. Este ato de traição fez com que a vanguarda da classe operária, o proletariado industrial, se ligasse mais estreitamente com os bolcheviques. Apesar disso, no primeiro Congresso dos Sovietes de toda a Rússia, realizado em junho em Petrogrado, a maioria dos delegados ainda era composta por socialistas revolucionários e mencheviques, que demandaram o apoio ao governo de coalizão. Defenderam a coalizão com a burguesia, afirmando que na Rússia não havia nenhum partido político em condições de tomar e manter todo o poder. Lênin respondeu: “Há um tal partido, o nosso partido não recusa isto, está pronto para em qualquer situação tomar o poder”. Lênin argumentou que somente o poder do proletariado poderia dar a terra aos camponeses, o pão aos trabalhadores, e lutar contra a guerra imperialista e por uma paz democrática e justa.
Compartilhando o poder, socialistas revolucionários e mencheviques adotaram o discurso da burguesia russa sobre a guerra, que já não tinha caráter imperialista, mas seria uma “guerra em defesa da revolução”.
O ambiente geral favorecia a luta, mas não tinha ainda amadurecido a situação revolucionária propícia à insurreição armada, tarefa decidida pelo 6º Congresso do Partido Bolchevique, realizado na ilegalidade em julho de 1917. As massas trabalhadoras urbanas e o campesinato ainda estavam fortemente influenciadas pelos socialistas revolucionários e mencheviques. A insurreição dos trabalhadores de Petrogrado ficaria isolada e se fosse precipitada a vanguarda do proletariado seria destruída.
Contrariando todas as teses estereotipadas de que a Revolução foi um golpe de Estado, fruto do voluntarismo leninista, num magistral texto intitulado “Sobre os Compromissos”, de setembro de 1917, Lênin vislumbra, em face da evolução do quadro político, a possibilidade do desenvolvimento pacífico da revolução, sob determinadas condições.
Revelando maestria no manejo tático, o líder revolucionário propunha um acordo com os mencheviques e socialistas revolucionários para assegurar que todo o poder fosse entregue aos Sovietes:
“O nosso partido, como qualquer outro partido político, aspira ao domínio político para si. O nosso objetivo é a ditadura do proletariado revolucionário. Meio ano de revolução confirma, com extraordinária clareza, força e eloquência, a justeza e a inevitabilidade dessa exigência, precisamente no interesse da revolução atual, pois de outro modo o povo não obterá nem uma paz democrática, nem a terra para os camponeses, nem a completa liberdade (uma república inteiramente democrática). O curso dos acontecimentos em meio ano da nossa revolução, a luta das classes e dos partidos, o desenvolvimento das crises de 20-21 de Abril, de 9-10 e 18-19 de Junho, de 3-5 de Julho e de 27-31 de Agosto mostraram-no e demonstraram-no.
Agora começou na revolução russa uma viragem tão brusca e tão original que, como partido, podemos propor um compromisso voluntário, não certamente à burguesia, nosso inimigo de classe principal e direto, mas aos nossos adversários mais próximos, os partidos pequeno-burgueses democráticos “dirigentes”, os socialistas-revolucionários e os mencheviques.
Só como exceção, só por força de uma situação especial que, evidentemente, se manterá apenas por um período muito curto, podemos propor um compromisso a estes partidos e, em minha opinião, devemos fazê-lo.
Compromisso é, da nossa parte, o nosso regresso à reivindicação de antes de Julho: todo o poder aos Sovietes, governo de socialistas-revolucionários e mencheviques, responsável perante os Sovietes.
Agora e só agora, e talvez durante alguns dias apenas, ou uma-duas semanas, um tal governo poderia criar-se e consolidar-se de modo inteiramente pacífico. Poderia garantir com uma probabilidade gigantesca um movimento pacífico para a frente de toda a revolução russa e possibilidades extremamente grandes de grandes passos em frente do movimento mundial para a paz e a vitória do socialismo.
O compromisso consistiria em que os bolcheviques, sem pretender uma participação no governo (impossível para um internacionalista sem a realização efetiva das condições da ditadura do proletariado e do campesinato pobre), renunciassem à apresentação imediata da reivindicação da passagem do poder para o proletariado e para os camponeses pobres e aos métodos revolucionários de luta por esta reivindicação.
Lênin apresentava suas condições para o compromisso: “A condição, por si mesmo evidente e não nova para os socialistas-revolucionários e mencheviques seria a plena liberdade de agitação e a convocação da Assembleia Constituinte sem novos adiamentos, ou mesmo num prazo mais breve.
Os mencheviques e os socialistas revolucionários, como bloco governamental, concordariam (supondo que o compromisso se realizava) em formar um governo inteira e exclusivamente responsável perante os Sovietes, com a transmissão para as mãos dos Sovietes de todo o poder, incluindo o local. Nisto consistiria a “nova” condição.
Por mais difícil que seja agora (depois de Julho e Agosto, dois meses que equivalem a duas décadas de tempos sonolentos, “pacíficos”) esse compromisso, parece-me que existe uma pequena possibilidade para a sua realização, e essa possibilidade é criada pela decisão dos socialistas-revolucionários e mencheviques de não entrar num governo juntamente com os democratas-constitucionalistas”.
O fim da dualidade de poderes e a insurreição
O Governo Provisório cumpria os desígnios das classes dominantes, no que não poupava ameaças ao movimento revolucionário. O presidente do Governo Provisório, Kerenski, chegou a ameaçar reprimir “a ferro e fogo” as ações comandadas pelos bolcheviques. A burguesia ameaçava instaurar uma ditadura militar. Até a restauração monárquica era considerada uma opção válida. Nesse quadro entra em ação o golpe o general Kornílov, que juntamente com os imperialistas da Entente, investiu contra a base principal dos bolcheviques em Petrogrado, em agosto de 1917. Os bolcheviques fizeram um chamamento aos operários e soldados da cidade para enfrentar com armas a contrarrevolução. Os trabalhadores responderam a esse chamamento criando novas unidades da Guarda Vermelha. Os agitadores bolcheviques esclareceram os militares dos batalhões de Kornilov sobre os objetivos do complô contrarrevolucionário desse general. Tudo isso fez com que as forças contrarrevolucionárias fossem derrotadas graças à luta das massas sob a direção dos bolcheviques.
A derrota do complô de Kornilov mudou inteiramente a correlação de forças entre a revolução e a contrarrevolução. Já não era possível seguir a política de conciliação dos socialistas revolucionários e dos mencheviques com os capitalistas e latifundiários. Os camponeses compreenderam que por trás das pretensões de instaurar a ditadura militar estavam os latifundiários que não queriam entregar a terra aos camponeses e que a política dos socialistas-revolucionários, independentemente de suas intenções, servia a esses propósitos. Os soldados se convenceram de que o governo burguês pretendia prosseguir a guerra imperialista. Para os trabalhadores das nações oprimidas tornou-se claro que se fosse instaurada a ditadura militar seria impossível acabar com a opressão nacional.
Os acontecimentos se precipitavam. Durante os meses de setembro e outubro foram tomadas medidas para a preparação militar dos trabalhadores; foram dadas orientações e atribuídas tarefas aos marinheiros no Báltico e batalhões militares revolucionários. A insurreição em Petrogrado e em Moscou aceleraria a vitória da revolução em todo o país. Também a burguesia concentrava forças contrarrevolucionárias na capital. O tempo não esperava. Em 10 de outubro de 1917 na reunião do Comitê Central do Partido Bolchevique foi aceita a proposta de Lênin de organizar imediatamente a insurreição armada. Sob a direção do Partido Bolchevique criou-se o Comitê Militar Revolucionário para a preparação e direção da insurreição. Ao descobrir o plano insurrecional, o governo burguês enviou em 24 de outubro as forças contrarrevolucionárias para atacar sedes e jornais do Partido Bolchevique. A Guarda Vermelha rechaçou essas forças. O jornal do Partido saiu com um chamamento ao povo para derrubar o Governo Provisório. Lênin chegou clandestinamente ao Smolni, onde estava o Comitê Central do Partido Bolchevique e se pôs à frente do centro dirigente da revolução. Sem esperar a reunião do 2º Congresso dos Sovietes de toda a Rússia, a insurreição armada começou em 24 de outubro de 1917. À noite, os batalhões operários ocuparam escritórios governamentais, correios, estações de trem, pontes etc. O cruzador “Aurora” apontou seus canhões para o Palácio de Inverno, onde estava o Governo Provisório. O Palácio de Inverno foi cercado pela Guarda Vermelha e os marinheiros do Báltico. Na manhã de 25 de outubro proclamou-se a queda do Governo Provisório.
Na noite de 25 de outubro (7 de novembro), o Palácio de Inverno foi atacado e invadido. Os membros do Governo Provisório foram presos. Em Petrogrado triunfou a insurreição armada, preparada e dirigida pelo Partido Bolchevique liderado por Lênin. Caiu o poder da burguesia. Começava uma nova era.
Com a vitória da Revolução Socialista de Outubro, a instauração do poder soviético na Rússia, realizou-se a segunda etapa da Revolução: a da transformação da revolução democrático-burguesa em revolução socialista.
Nesse contexto, a premissa para a tática e a estratégia leninistas foi a análise do caráter da época, a partir da identificação das contradições fundamentais do sistema capitalista chegada à etapa imperialista: a contradição entre o trabalho e o capital, agravada com o advento dos monopólios e o capital financeiro; a contradição entre as nações e os povos oprimidos e o imperialismo, gerada pela pressão e a exploração dos povos, com as políticas neocolonialistas, com a cumplicidade da burguesia reacionária de cada país onde, de uma ou outra maneira, se submetiam à sua influência; a nova realidade do sistema capitalista na etapa imperialista gerou também a contradição entre as potências em luta por uma nova divisão do mundo.
O contexto externo – a guerra mundial
Na cadeia de acontecimentos que fazem parte do desencadeamento deste grande conflito que foi a Primeira Guerra Mundia, lugar de destaque é atribuído pela historiografia ao assassinato do herdeiro do trono do Império Austro-Húngaro, Franc Ferdinand, em Saraievo, por um membro de uma organização nacionalista sérvia, a 27 de junho de 1914.
Foi o pretexto para que rufassem os tambores de guerra e os canhões começassem a troar. Os círculos mais agressivos daquele império exploraram o fato para atacar e ocupar a Sérvia, o que, na conjuntura geopolítica da época, só podia ser feito após entendimentos com a Alemanha, grande potência em ascensão.
Os imperialistas germânicos consideravam que a situação era favorável para fazer a guerra, tendo em conta que a Rússia e a França, potências rivais, não estavam militarmente preparadas. Pesavam ainda no julgamento alemão as dificuldades momentâneas da Inglaterra, envolvida no conflito interno em torno da questão irlandesa.
O debate principal entre as forças do socialismo envolvia duas posições antagônicas – participar do esforço de guerra ao lado da própria burguesia ou transformar a guerra imperialista em luta revolucionária. As lideranças dos partidos socialistas da Inglaterra, França, Alemanha, Áustria-Hungria, entre outros, assumiram o lado da “suas” burguesias, fazendo chamamentos aos trabalhadores a “defender a pátria” numa guerra injusta.
Para Lênin, a posição que os socialistas tomaram posteriormente levou o movimento a uma fatal divisão e à bancarrota da Internacional Socialista.
Lênin insistia em que os revolucionários deviam compreender as causas desse fracasso. Ele considerava que a essência ideológica e política do oportunismo da Segunda Internacional era a substituição da luta de classes pela colaboração entre as classes, a negação do caminho e dos métodos da luta revolucionária.
O Partido Bolchevique, dirigido por Lênin, encetou uma luta sem quartel contra o imperialismo e os oportunistas da Segunda Internacional. Foi incansável a atividade dos bolcheviques russos para desmascarar o caráter imperialista da guerra.
Foi com esse pano de fundo que os bolcheviques elaboraram uma tática revolucionária, que se expressava na palavra de ordem – “Transformar a guerra imperialista em guerra civil!” – o que na prática significava dizer aos trabalhadores recrutados para as fileiras dos exércitos beligerantes que apontassem suas armas contra as próprias burguesias e governos, e tomassem o poder político.
Esta posição tornou-se um divisor de águas no seio do movimento socialista internacional, no qual surgiu também uma ala de esquerda revolucionária e internacionalista. No seio do mais poderoso partido social-democrata da época, o alemão, foi formado, em 1916, o grupo “Spartacus”, sob a liderança de Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, o único deputado que no parlamento votou contra o orçamento para a guerra.
Desde então guerra e paz, estratégia e tática revolucionárias, socialismo e internacionalismo são exigentes temas que polarizam os partidos e organizações dos trabalhadores em todo o mundo.
Revolução internacionalista
O conjunto das realizações da Revolução de Outubro e da luta pela construção do socialismo que se lhe seguiu tem conteúdo e forma de acontecimentos épicos e não há propaganda negativa nem leitura niilista, nem mesmo a renúncia capitulacionista a seu legado que apaguem essa epopeia da memória dos povos ou esgotem sua força inspiradora nos atuais e futuros embates revolucionários.
Essa força inspiradora provém dos seus grandiosos feitos e de sua repercussão internacional. A Revolução Russa tornou-se paradigmática para o mundo porque fez saltar pelos ares um império reacionário, que Lênin chamava de “prisão dos povos”. Sobre seus escombros, surgiu ao cabo de uns poucos anos uma nova civilização humana, uma economia desenvolvida, um povo culto e digno. Sob a influência soviética cresceu o movimento operário nos países capitalistas, desenvolveu-se a luta anticolonial nos países dependentes. A Revolução Russa soergueu um Estado soberano e instrumentalizou um Exército poderoso que se constituiu na força capaz de derrotar o mais feroz inimigo da humanidade – o nazi-fascismo. A Revolução Russa e o socialismo soviético estiveram presentes como inspiração, influência indireta e apoio moral na grande Revolução chinesa, na Revolução cubana, na Resistência vietnamita. Até mesmo a adoção, pelos países capitalistas, do Estado de “bem-estar” resultou, a par das lutas sindicais e políticas nos países capitalistas, da influência da Revolução de Outubro e do socialismo na URSS.
A Revolução Socialista de Outubro e o Estado soviético por ela fundado exerceram enorme impacto no mundo e influência na organização e levantamento do movimento revolucionário mundial. Mostraram às massas trabalhadoras de outras nações o caminho da luta emancipadora, inspiraram-nos com a força do exemplo, impulsionaram o movimento operário e de libertação nacional durante toda uma época histórica. A Revolução de Outubro impactou nas lutas contra o sistema capitalista tanto nas metrópoles quanto nas colônias e países dependentes e aprofundou ainda mais a crise desse sistema.
A Revolução russa e a subsequente construção do socialismo no país eurasiático se produziram em circunstâncias mundiais e nacionais peculiares, cuja expressão geopolítica mais importante, à época, foi a Primeira Guerra Mundial. O esgotamento do regime czarista criou as condições para a eclosão de movimentos revolucionários, desde o início do século 20 (revolução democrática de 1903-1905).
A Revolução de Outubro quebrou a frente do imperialismo mundial, derrubou a burguesia na Rússia, levou ao poder o proletariado em um sexto do território mundial e criou as condições para a liquidação de todas as formas de exploração e opressão do homem pelo homem.
A vitória da revolução abriu uma nova época na história contemporânea, a época da revolução proletária e nacional-libertadora, da criação da frente revolucionária do proletariado e dos povos oprimidos contra o imperialismo.
Por todas essas razões, a Revolução de Outubro foi uma revolução com caráter internacionalista.
O agravamento das contradições de classe e a influência das lições da Revolução de Outubro fizeram que desde 1918 se desenvolvessem grandes batalhas de classes na Europa e na Ásia.
Nenhum outro acontecimento político-social, como a Revolução Russa, materializou com tamanha dimensão a palavra de ordem lançada seis décadas antes por Marx: “Proletários de todos os países, uni-vos”! Se bem não tenha resultado na revolução proletária mundial – esta era a expectativa dos bolcheviques e de todo o movimento revolucionário à época -, a revolução socialista de 1917 teve extraordinário impacto internacional, exerceu influência direta sobre acontecimentos subsequentes, mudou a face do mundo e deixou marca indelével em todo o século 20.
Mudava a face do mundo, abria-se nova época na história da humanidade. Realizada no auge da guerra entre grandes potências que rivalizavam para dominar o planeta, a Revolução russa estabeleceu o contraponto essencial com o sistema imperialista. Desde então, a disjuntiva entre o capitalismo (imperialista) e o socialismo tornou-se uma das contradições essenciais da época. Os embates políticos, as guerras e as revoluções nacional-libertadoras e socialistas do século 20 eclodiram e desenvolveram-se tendo esses antagonismos como fatores objetivos condicionantes.
O poder estatal socialista que emergiu em 1917, internacionalista por natureza, tornou-se o vetor preponderante na luta pela paz mundial e o progresso social, um incontornável fator a neutralizar os efeitos da agressividade do imperialismo e a influenciar positivamente as lutas dos trabalhadores e dos povos.
Ecos da Revolução Russa no Brasil
Ao contrário do que ocorrera na maioria dos países europeus, assim como na Argentina, no Chile e Uruguai, o PC do Brasil não nasceu da ruptura de um grande e influente partido social-democrata, mas de uma cisão no movimento anarquista. Foi dos embates políticos e ideológicos entre os setores avançados do proletariado brasileiro e sobretudo duma luta entre comunistas e anarquistas que resultou a formação dos primeiros agrupamentos comunistas, que mais tarde se uniriam para constituir o Partido Comunista do Brasil.
O historiador brasileiro Nelson Werneck Sodré, marxista estudioso da história do Brasil e dos comunistas, assinalou que o Partido Comunista “nasceu e cresceu como consequência necessária do processo de formação da classe operária brasileira e do desenvolvimento de suas lutas. Sua fundação respondeu a uma exigência do movimento operário que já mostrara, nas primeiras décadas do século 20, a carência de um partido político operário revolucionário”.
O documento comemorativo do 90º aniversário do Partido Comunista do Brasil (2012) assinala: “Quando o movimento operário brasileiro enfrentava uma crise de perspectiva, os bons ventos da vitoriosa revolução socialista na Rússia, de 1917 – que já sopravam pelo mundo –, chegaram ao Brasil. O triunfo dos trabalhadores russos mostraria aos operários brasileiros um caminho novo: o da necessária organização do proletariado em partido político independente, de classe, tendo como objetivos a conquista do poder político e a implantação do socialismo”.
O Congresso de fundação do Partido Comunista do Brasil realizou-se em 25, 26 e 27 de março de 1922. Os dois primeiros dias de trabalho ocorreram na cidade do Rio de Janeiro. Mas, devido a ameaças policiais, a sessão do último dia foi transferida para Niterói. Contou com a participação de nove delegados que representavam 73 comunistas. Já no início de sua existência, o Partido aderiu às 21 condições para ser membro da Internacional Comunista.
Um balanço necessário: esplendores e sombras
A revolução de 1917 foi propulsora do progresso social. Partindo de uma base econômica atrasada, em poucas décadas a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas tornou-se um dos países mais prósperos e socialmente mais avançados do mundo. Sobre os escombros do antigo regime, surgiu uma nova civilização humana, uma economia desenvolvida, realizou-se imenso progresso material e espiritual, conquistou-se a justiça, a igualdade, nasceu um povo culto e digno. São incomparáveis as conquistas sociais, as reformas estruturais, os saltos civilizacionais operados pelo novo ordenamento político do Estado proletário baseado na aliança operário-camponesa.
A luta pelo socialismo, como fenômeno histórico, é fruto também de suas circunstâncias. Na Rússia o novo poder defrontou-se com a guerra civil em que as classes derrocadas contaram com o apoio de 14 exércitos estrangeiros numa ação contrarrevolucionária durante três anos.
Os primeiros tempos da construção do novo regime conheceram o comunismo de guerra e a NEP – Nova Política Econômica. Seguiram-se a conflitiva coletivização do campo e a industrialização vertiginosa, em meio a uma luta de classes exacerbada e a tumultuadas lutas políticas nos órgãos de governo e no partido dirigente. Enquanto promovia a industrialização acelerada, o país viu-se diante da circunstância de preparar-se para a guerra, num quadro mundial em que a revolução, depois de um período de ascensão e de vitórias parciais na Alemanha, Hungria e Sérvia, entrava em refluxo.
O Período de industrialização acelerada, de fins dos anos 20 do século passado até o começo da Segunda Grande Guerra, foi o mais florescente do ponto de vista econômico e social, de um impressionante, incomparável e irrepetível desenvolvimento, em que se exigiu tudo das massas trabalhadoras e do partido, período de mobilização total, quando se trabalhava e vivia em permanente campanha e em ambiente de cerco. Por outro lado, talvez residam nesse período – marcado por uma acerba luta de classes, por atos de sabotagem e ameaças de agressão pelos inimigos externos e internos, em que se exigiu também centralização absoluta no comando da vida econômica como na política –, as causas estruturais para que o regime soviético assumisse as características que assumiu, com resultados gloriosos, mas também com erros que o debilitaram. O heroísmo da façanha soviética, e a urgência do esforço de edificação somado à inexperiência, levaram a direção comunista a atuar com a noção do socialismo pleno e mesmo do comunismo imediato e ao abandono de qualquer ideia de transição longa. A mentalidade de cerco e a necessidade de comando ultracentralizado para garantir a mobilização total e permanente do povo fecharam o regime, que não chegara a desenvolver a institucionalidade democrática socialista – a democracia de massas, popular, dos sovietes, essência da ditadura do proletariado, segundo a formulação clássica do marxismo-leninismo. Isto acabou por alienar da governação do país as massas populares, o único sujeito criador e transformador da História. Não se equacionou satisfatoriamente a antinomia entre o desenvolvimento extensivo e o intensivo, com repercussões negativas na produtividade e no atendimento de demandas básicas das massas populares quanto a bens e serviços.
Cada período da construção do socialismo teve sua importância e história, próprias. Foram circunstâncias que para o bem e o mal construíram o conjunto da obra e se integraram no esforço criador da nova sociedade.
Uma luta sempre atual
Para os comunistas, a Revolução triunfante em 1917 será sempre uma fonte de inspiração nos combates que se realizam na atualidade, sob novas condições, na resistência à ofensiva do sistema capitalista contra os trabalhadores e os povos e para abrir caminho à nova etapa da luta pelo socialismo.
Objetivamente, a extinção da União Soviética, no início dos anos 1990, marcou uma viragem negativa na evolução do quadro mundial. Sendo resultado de uma contrarrevolução, cujos primeiros sinais se manifestaram a partir do 20º Congresso do Partido Comunista da União Soviética (1956), a derrota da Revolução soviética implicou inaudito retrocesso na situação política internacional, quadro em que a burguesia, o imperialismo e toda a reação mundial arremetem contra todas as conquistas democráticas, sociais, civilizacionais da humanidade.
A derrota do socialismo, para a qual concorreram também fatores externos ligados à pressão e ao cerco dos países imperialistas, criou uma situação inteiramente nova no mundo. Como já assinalamos, no terreno das ideias deu azo à negação dos valores da Revolução de Outubro. No terreno político ensejou o surgimento de uma correlação de forças extremamente desfavorável aos que lutam por uma sociedade liberta da exploração capitalista. Hoje é corrente a visão de que o socialismo foi definitivamente derrotado e saiu da cena histórica como realidade e perspectiva.
Não compartilhamos esta visão. O socialismo continua sendo uma necessidade objetiva da evolução da civilização humana. E, nessa ótica, o socialismo e a sociedade sem classes, o comunismo, são o ideal supremo a justificar a existência e a atividade do Partido Comunista. Ao reafirmarmos os princípios e os ideais de Outubro de 1917, simultaneamente nos aferramos à realidade da época e à do país em que atuamos. Hoje parece claro que está sepultada a ideia do “comunismo súbito”. O exame atento da História indica que a construção do socialismo e o alcance de uma sociedade tão avançada quanto o comunismo – sociedade sem classes, reino da abundância, liberdade triunfante sobre a necessidade – é tarefa para muitas gerações que atravessará diferentes épocas históricas.
Para os comunistas brasileiros, a Revolução triunfante em 1917 será sempre uma fonte de inspiração nos combates que se realizam, sob novas condições, na resistência à ofensiva do sistema capitalista contra os trabalhadores e os povos e para abrir caminho à luta pelo socialismo, nas novas condições do século 21.”
*Jornalista e Secretário de Política e Relações Internacionais do PCdoB
Fonte: Resistência