A rosa que inspira e a solidão que dói, por Luciano Siqueira
Tão logo terminei a apresentação do tema, cuidei de deixar o auditório em função da agenda apertada. Mas não resisti à interpelação do cidadão de meia-idade, traços rudes e olhar triste:
– Prefeito, o senhor me emocionou com aquela rosa vermelha.
Por Luciano Siqueira*
– Como assim? Deu para entender a idéia de que, no cotidiano do nosso trabalho, precisamos imitar os bons poetas que enxergam o sentido universal e a beleza do desabrochar de uma rosa?
– Entendi, sim, o que o senhor quer dizer com isso. Não dá pra gente ficar preso às pequenas coisas, é necessário ligar o que a gente faz com a luta do povo para mudar o Brasil.
– Então, ótimo.
– Mas o que mais emocionou foi quando o senhor disse que a rosa vermelha simboliza a luta e o amor.
– Sim…
– Porque já não aguento encarar a minha solidão.
Pronunciou as últimas palavras com a voz embargada, os olhos marejados, tomado de profunda emoção. E ficamos por alguns segundos a olharmo-nos, sem nada dizer, um tanto embaraçados. Com um aperto de mão forte, tentando expressar minha solidariedade, arrematei:
– Pois é, a vida tem dessas coisas. Não basta colher rosas, é preciso ter a quem ofertá-las.
Saí apressadamente, com a consciência de que ali ficara um homem solitário e triste, que se encorajara a trocar duas palavras com o vice-prefeito, abrindo-se em sua melancolia; e, ao invés de uma palavra de estímulo, colhera uma sentença fatalista.
Durante o resto do dia não consegui me concentrar no trabalho. Persistia a imagem tocante do homem solitário e a sensação incômoda de que não soubera confortá-lo.
Agora, relembrando o fato, dá um desejo enorme de voltar a encontrá-lo, quem sabe para refletirmos juntos sobre as agruras de quem vive na cidade grande, marcada por um ambiente de tensões e conflitos que desumanizam e embotam a sensibilidade. A solidão, mais do que uma desventura pessoal, parece um fenômeno coletivo que se avoluma e ameaça a própria condição humana. Decresce a vida em comunidade na medida em que as pessoas se auto-enclausuram em suas residências, temerosas da violência.
Urge trabalhar por uma cidade saudável que valorize o poético gesto de colher e ofertar rosas vermelhas.
*Luciano Siqueira é Médico, vice-prefeito do Recife, membro do Comitê Central do PCdoB
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(PL)