Revisitar a História é sempre necessário — para tentar compreender melhor o que se passa no tempo presente.

Por Luciano Siqueira*

Mesmo a História recente, num país com o nosso, ainda que num lapso de tempo relativamente diminuto, encerra indicativos e ensinamentos válidos.

As coisas acontecem em terra tupiniquins com velocidade incomum. Para o bem ou para o mal.

Há uma semelhança entre o pleito presidencial de 1989 e o de agora: ao fim de um ciclo político e provável início de outro, dispersão de forças na disputa pelo governo central.

Mais de vinte candidaturas se apresentaram em 1989. Ao final, no segundo turno, surpreendentemente, se enfrentaram Collor — então um outsider — e Lula, à testa de forças populares ascendentes.

Candidaturas inicialmente mais fortes, como a do próprio Ulysses Guimarães — o “Senhor Diretas” — pelo PMDB, agremiação estruturada em praticamente todo o país, se dissolveram no ar.

Collor, o “Caçador de Marajás”, empolgou parcelas crescentes do eleitorado, virou a bola da vez do complexo midiático e suplantou Lula, que não foi capaz de ampliar as alianças, num round final eletrizante.

Com a vitória do alagoano, plantou-se o ambiente para o caos em curto prazo; enquanto Lula surgia como grande liderança popular destinada a cumprir papel marcante na cena política brasileira.

No pleito de agora, estruturas partidárias, tempo de TV e recursos financeiros não estão garantindo ao candidato ungido pelo Mercado e preferido pela mídia, Geraldo Alckmin, melhor sorte do que a de Ulysses. Caminha para o fracasso.

A polarização tende a colocar em confronto, num provável segundo turno, o outsider capitão Bolsonaro — versão atualizada do paladino anticorrupção de 1989, com traços fascistóides — e Fernando Haddad, que comparece ao ringue em substituição a Lula.

Se as tendências dominantes nas pesquisas de agora se confirmarem, este será o desenho do segundo turno.

Parte substancial dos eleitores endinheirados, inclusive em São Paulo, já largou Alckmin faz tempo em embarcou na aventura Bolsonaro. Em nome do antipetismo.

Há sinais ainda débeis, mas significativos, conforme matéria da revista norte-americana Forbes, porta voz do financeiro, na semana passada, de que segmentos empresariais de grande porte e mesmo do rentismo ensaiam diálogo com Haddad, considerado por mais acessível do que Ciro Gomes, do PDT.

É possível que parcelas majoritárias do eleitorado venham a rejeitar a aventura fascistoide e viabilize uma vitória de Haddad no segundo turno.

Depende de muitos fatores — inclusive do comportamento tático do próprio Haddad e da coalizão PT-PCdoB.

A esquerda sozinha não será capaz de vencer. Movimentos ousados no sentido de atrair parte importante do centro político disperso e atores sociais de peso serão necessários.

Pois é preciso “vencer e levar”, como se diz no jargão político.

Não bastará eleger o residente, há que se enfrentar uma correlação de forças possivelmente adversa no Congresso e o ambiente movediço do Judiciário recém-alavancado a um coprotagonismo político não previsto pela Constituição.

Por ora, vale intensificar a luta — nas ruas, nas redes e em toda parte — mirando a vitória em dois turnos. Sem entretanto subestimar a dimensão dos desafios táticos que se impõem agora e, se a vitória for conquistada, “no dia seguinte”.

*Médico, vice-prefeito do Recife, membro do Comitê Central do PCdoB