O Congresso Nacional voltou a tratar da reforma política. Comissões especiais já funcionam na Câmara dos Deputados e no Senado para organizar os temas a serem tratados e as sugestões de alterações. Nesta nota, o PCdoB expressa sua opinião sobre a reforma política.

Essa reforma tem sido um assunto relevante e recorrente na pauta da sociedade brasileira, refletindo a necessidade de aperfeiçoar nosso sistema político, mas que, até agora e infelizmente, ainda não foi possível concretizar. A última tentativa de aprovação da reforma ocorreu em 2007, mas a votação resultou inconclusa.

Pesaram para essa frustração o fato de que, para algumas forças políticas, a oportunidade de aperfeiçoar o sistema político é encarada como uma maneira de estabelecer regras eleitorais que as beneficiem diretamente.

O PCdoB não pensa assim. Nosso partido considera que uma reforma política só se justifica na medida em que amplie a liberdade partidária e o leque de opções ideológicas e políticas disponíveis à escolha do eleitor. Vale dizer, uma reforma que aprofunde a democracia enquanto modo de governar com a participação mais abrangente possível do povo e de respeito à representatividade das minorias.

Listas preordenadas e financiamento público

O centro do atual processo de reforma volta a ser mais uma vez o sistema eleitoral do voto proporcional e a forma de seu financiamento. Desta vez, o debate sobre a substituição da atual lista partidária pós-ordenada deve se polarizar entre aqueles que, como nós, defendem o pluripartidarismo proporcional com a adoção da lista preordenada e os que advogam o chamado “distritão”, que restabelece o voto majoritário para eleição de parlamentares, ou algum outro sistema derivado dele. Essa polarização vem se firmando em decorrência de um consenso cada vez maior de que as opções de sistema distrital – o distrital puro ou o distrital misto – estão inviabilizados, dada a impossibilidade de dividir o país em distritos.

A nova opção do chamado “distritão”, na verdade, não passa de um retorno ao sistema de voto majoritário vigente até a década de 1960, que privilegia personalidades que, graças ao apoio do poder econômico ou de máquinas governamentais, alcançam grandes volumes de votos. Essa é uma opção que marginaliza o papel dos partidos, que passam a ser um aglomerado de personalidades e seus projetos individuais.

Partidos são as instituições que melhor organizam e fornecem coerência às demandas e às forças políticas em sociedades crescentemente complexas, sozinhos ou em alianças. No entanto, o que também é bom, eles estarão sempre limitados pela quantidade de votos – de representação – que conseguem conquistar. Por isso defendemos o sistema eleitoral da lista preordenada, que além de fortalecer a figura do partido, simplifica a tarefa do eleitor em distinguir as propostas políticas e o controle posterior da ação parlamentar dos representantes da legenda em que votou.

A lista preordenada é a lista transparente por excelência. Ao contrário da atual lista pós-ordenada pelo eleitor, na preordenada é fácil saber quais serão os prováveis eleitos. Na lista atual, o eleitor pode escolher em quem votar, mas geralmente, não elege o que escolheu. A preordenada também é vantajosa ao eliminar a enorme quantidade de campanhas eleitorais individuais em busca de uma boa colocação na lista.

Por fim, a opção da lista preordenada é a que melhor se adéqua ao financiamento público e exclusivo de campanha. Esta é outra mudança que defendemos com grande convicção. A substituição do atual sistema financiamento exclusivamente privado às campanhas eleitorais concederá à competição eleitoral uma muito melhor igualdade de condições entre os que disputam o voto do eleitor, aumentando a chance de que o cidadão tenha acesso a uma maior quantidade e variedade de propostas políticas. Ao eliminar o financiamento privado, também estaremos eliminando a maior fonte de corrupção nas eleições e no exercício de cargos públicos. Assim, defendemos que o financiamento público deve ser aplicado às campanhas eleitorais.

Dessa maneira, o PCdoB tem compromisso com essa reforma política e estará empenhado por meio de seus representantes na Câmara e no Senado para que ela gere mais democracia, mais liberdade partidária, mais opções de escolha para o eleitorado e mais facilidade de controle dos legisladores eleitos.

Queremos saudar, assim, as deliberações da comissão especial do Senado, que aprovou a sugestão de adotar a lista preordenada e o financiamento público e exclusivo de campanha.

Entretanto, não desconhecemos as dificuldades que essas propostas terão de se concretizar, e nem descuidamos da possibilidade de a reforma vir a servir apenas para adoção de medidas que sejam contrárias à ampliação da liberdade dos partidos e dos eleitores.

O casuísmo do fim das coligações

Nesse sentido, chamamos a atenção para a possibilidade de que todo esse processo seja paralisado pela ação dos grandes partidos, vindo a resultar apenas, por exemplo, na proibição da coligação proporcional. Esta proibição vem sendo defendida por alguns setores da sociedade civil e, em especial, pelos grandes partidos. Reclamam que a coligação distorceria o resultado do voto do eleitor, que seria desinformado sobre as consequências de seu voto. Não concordamos com essa crítica.

Na realidade do presente sistema político-eleitoral, as coligações são direito democrático dos partidos políticos. Barrar a reforma do atual sistema e pretender apenas a proibição das coligações seria um casuísmo intempestivo.

As coligações geram listas públicas, em que a informação sobre todos os partidos que a compõem, e os seus respectivos candidatos, é divulgada de forma obrigatória em todas as peças da propaganda eleitoral, permitindo ao eleitor médio informação suficiente sobre as consequências de seu voto. A presumida desinformação do eleitor contida na crítica à coligação tem mais a ver com a visão elitista sobre a suposta “incapacidade” do eleitor do que com a realidade.

As coligações são importantes para a eleição de prefeitos e, principalmente, vereadores nos pequenos e médios municípios brasileiros, onde poucos partidos alcançam o cociente eleitoral para as Câmaras Municipais.

Mesmo se adotada a lista preordenada, defendemos que se mantenha ainda a liberdade da coligação, dada a transparência para o eleitor. Há exemplos no mundo, como é o caso de Portugal, em que os dois institutos coexistem. Não sendo a coligação obrigatória, mas apenas uma livre decisão de cada partido, não há sentido em proibi-la. Basta que aqueles partidos que não a aceitam se neguem a delas participarem. A coligação faz parte do repertório de instrumentos dos partidos, que são livres para atuarem sozinhos ou em aliança para alcançarem seus objetivos de representação. Elas integram a liberdade de ação partidária garantida como direito fundamental em nossa Constituição.

Ressalte-se, ainda, que o fim das coligações, combinado com a manutenção do cociente eleitoral, ampliará a quantidade de votos descartados quando do cálculo de eleitos, implicando a não representação de largos contingentes da sociedade. Ou seja, o fim das coligações – em um país extenso, complexo e desigual – aumentará a distância entre o sistema institucional e o povo, afetando a legitimidade dos representantes. Esta reflexão fica ainda mais nítida quando lembramos que o país possui mais de 5.500 municípios, de modo que o fim das coligações atingirá inclusive parlamentares eleitos por partidos hoje tidos como grandes – intensificando os efeitos negativos da medida.

O fim da coligação decorre do entendimento dos grandes partidos de que, sem ela, eles elegerão mais parlamentares, eliminando de forma artificial e autoritária a livre vontade dos partidos de formarem alianças para alcançarem seu legítimo objetivo de crescerem na representação do eleitorado. A pretensão é congelar a atual correlação de forças, impedindo a diversidade partidária e a oxigenação da política. O que seria de pequenos partidos do passado que tiveram, graças às coligações, a oportunidade de crescer e podem, agora, governar o Brasil?

Entendemos que a reforma política deve servir para dar mais e melhores opções de escolha e de controle aos eleitores sobre seus representantes. E não para restringir essas opções ou para favorecer, artificialmente, o congelamento do atual quadro partidário em nosso país.

Brasília, 28 de abril de 2011
A Comissão Política Nacional do PCdoB