Foto: Ricardo Stuckert/PR

Criado em 2008 durante o segundo governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o Fundo Amazônia acaba de completar 15 anos em meio a importantes desafios. Por um lado, retomar iniciativas que foram travadas durante o governo de Jair Bolsonaro; por outro, dar conta do enorme desafio de contribuir com a preservação da floresta em meio à grave crise climática global, ao mesmo em que o país busca garantir sua soberania e o desenvolvimento social. 

Numa medida típica do negacionismo bolsonarista, o fundo foi paralisado em meio a um “revogaço” promovido pelo então presidente em 2019, que deu fim, entre outras ações, ao Comitê Orientador (Cofa) e ao Comitê Técnico (CTFA) do fundo. Somente em novembro do ano passado a decisão foi revogada, após determinação do Supremo Tribunal Federal para que o fundo fosse reativado em 60 dias. 

Segundo informado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) — responsável por captar as doações, selecionar os projetos e acompanhar e os resultados — até 2018, o fundo recebeu R$ 3,4 bilhões dos governos da Noruega (93,8% do total) e da Alemanha (5,7%), além da Petrobras (0,5%). 

Ao todo, 102 projetos foram apoiados pelo Fundo Amazônia desde a sua criação, com R$ 1,8 bilhão em valor total de apoio contratado, dos quais R$ 1,5 bilhão desembolsados até o fim de 2022. Dessas iniciativas, 60 já foram concluídas e 42 continuam em andamento. 

Desses projetos que formam a “carteira” do fundo, a maioria (58%) foi contratada junto à União, estados e municípios; outros 40% envolvem o terceiro setor e cerca de 1%, universidades. A atuação se dá nos estados do  Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. 

Ainda de acordo com o BNDES, há também um projeto internacional de monitoramento de cobertura florestal (envolvendo os países membros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica – OTCA) e outros cinco nos estados da Bahia, do Ceará, do Espírito Santo, do Mato Grosso do Sul e do Paraná, “uma vez que existe previsão legal de que até 20% dos recursos do Fundo Amazônia possam ser aplicados em outros biomas brasileiros e em outros países tropicais”. 

Retomada

Em decreto assinado no começo de janeiro, o fundo foi reestabelecido com a finalidade de captar doações para investimentos não reembolsáveis em ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável da Amazônia Legal. Os recursos vêm de doações e remunerações líquidas de aplicações. 

Com a chegada de Lula à presidência da República, o fundo também ganhou novo fôlego e países que antes se afastaram ou eram reticentes com relação à gestão ambiental bolsonarista, viram no perfil do novo governo a possibilidade de a questão alcançar outro patamar e, assim, voltaram a contribuir ou sinalizar interesse pela iniciativa. 

Nesse novo cenário, antes mesmo da posse do presidente, em dezembro, a Alemanha prometeu nova doação de US$ 35 milhões. Os Estados Unidos também direcionaram US$ 500 milhões; o Reino Unido viabilizou 80 milhões de libras esterlinas, bem como a União Europeia, com € 20 milhões (ou R$ 105 milhões) e a Suíça, com 5 milhões de francos suíços. Estes recursos ainda não entraram no BNDES.

“Se se somar o que entrou nesses anos — R$ 3,29 bilhões —, com os rendimentos de R$ 2,4 bilhões, dá o valor total de entrada de R$ 5,7 bilhões”, explicou Tereza Campello, diretora socioambiental do BNDES e ex-ministra, ao jornal Valor Econômico. Desse total, disse, R$ 3,4 bilhões estão disponíveis. “Para enfrentar o desmatamento e as novas dinâmicas, que envolvem o crime organizado, precisamos de sinergia, convergência e coerência entre essas ações, e ganhar escala e velocidade”, disse Tereza ao jornal. 

Em sua terceira reunião desde janeiro, o Cofa aprovou novas diretrizes e critérios para a aplicação de recursos, baseadas no Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), lançado em junho pelo governo federal. De acordo com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, entre essas diretrizes estão a possibilidade de municípios terem acesso a recursos a partir de editais de chamamento público, o que não ocorria até então; o valor mínimo de R$ 5 milhões por projeto e o teto de 5% do saldo disponível no fundo.

“O Fundo Amazônia volta com muita força, com muita estratégia e com recursos significativos para fazer frente ao desafio da transformação da economia na Amazônia. De uma economia predatória, com alto desmatamento, para uma economia sustentável, com desmatamento zero até 2030”, apontou o secretário executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, João Paulo Capobianco. 

Cúpula da Amazônia

Nesta semana, o tema ganha especial relevância, uma vez que acontece, nos dias 8 e 9, a Cúpula da Amazônia, em Belém (PA). Esta será a primeira vez, desde 2009, em que os oito países-membros da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), criada em 1995 para preservar a floresta, estarão reunidos. Estarão presentes os presidentes da Bolívia, Brasil, Colômbia, Guiana, Peru e Venezuela; Equador e Suriname enviarão ministros. 

O encontro foi precedido pelo evento Diálogos Amazônicos, realizado entre os dias 4 e 6 de agosto e promovido pelo Governo Federal, em parceria com o Governo do Estado do Pará, com mais de 300 eventos da sociedade civil. Os resultados das discussões serão apresentados aos presidentes amazônicos. 

Na cúpula, uma das questões que deverão estar em pauta é a necessidade de que os países desenvolvidos contribuam financeiramente, de maneira mais robusta, com os países da região amazônica a fim de que seja possível estabelecer uma política mais eficiente tanto do ponto de vista ambiental quanto no que diz respeito aos direitos das populações que vivem na e da floresta. 

“Nós vamos cuidar do nosso planeta. Essa é a mensagem. Nós vamos cuidar do nosso planeta. Quem não acredita que as coisas estão ficando feias é só acompanhar o que está acontecendo no mundo. Chove muito onde não chovia, tem seca demais onde não tinha. Faz calor demais onde só fazia frio e faz frio demais onde só fazia calor. Enquanto seres humanos, somos a única espécie capaz de destruir o lugar onde moramos. Como eu não quero destruir, vou tratar de cuidar do planeta junto com vocês”, disse Lula, em fala recente feita durante o programa “Conversa com o Presidente”. 

Com agências