Trabalhadores e estudantes tomaram a capital guatemalteca exigindo respeito às urnas do 1º turno | Foto: AFP

Milhares de guatemaltecos saíram às ruas nesta segunda-feira (24) para exigir respeito à decisão soberana das urnas e garantir a presença do oposicionista Bernardo Arévalo, do Movimento Semilla (Semente), no segundo turno, no próximo 20 de agosto, contra a candidata neocolonial Sandra Torres, que respalda o desastroso governo de Alejandro Giammattei.

Desde cedo, trabalhadores e estudantes mobilizaram a capital guatemalteca demonstrando a crescente insatisfação com as manobras do Ministério Público e dos tribunais que colocam em risco a frágil democracia do país ao desconsiderar o resultado das eleições realizadas em 25 de junho.

“A situação é tão absurda”, denunciou o dirigente da União Sindical de Trabalhadores da Guatemala (Unsitragua), Julio Coj, que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) demorou 17 dias para oficializar o resultado das eleições e indicar o nome de Arévalo. “Tudo porque recursos judiciais apresentados pelos perdedores foram acolhidos pelo Tribunal Constitucional”, acrescentou. Isso autorizou uma segunda revisão dos registros que coletaram os votos, que finalmente terminou com a confirmação pelo TSE de que não houve mudanças que alterassem os resultados.

“Inicialmente Giammatei quis impor a lei-mordaça contra quem luta contra a corrupção, a pobreza e a impunidade, agora quer um jogo de cartas marcadas, retirando da disputa a Bernardo Arévalo, que é o candidato das forças nacionais e populares”, afirmou Julio Coj. Na avaliação do sindicalista, “a pressão da população será essencial para barrar a tentativa dos golpistas”.

“Vale lembrar que vivemos um período bastante duro, em que armaram a imposição de novos magistrados para fazer com que, uma vez sequestradas as instituições, todos esses poderes paralelos, toda essa estrutura delitiva fique à frente do Estado”, acrescentou o líder da Unsitragua.

Uma das principais bandeiras dos protestos é a renúncia da procuradora-geral Consuelo Porras, por considerar que é ela quem lidera a “criminosa e ilegal judicialização do Movimento Semilla”.

Os manifestantes também aumentaram o tom contra o governo e o presidente “mitomaníaco, corrupto, medíocre e ladrão de Alejandro Giammattei”. “É ele quem está interferindo no processo eleitoral, com Miguel Martínez (amigo próximo do presidente e ex-funcionário do governo), junto com sua promotora e amiga, a promotora da impunidade Consuelo Porras”, denunciou o ativista Sergio Morataya.

A Promotoria Especial contra a Impunidade, chefiada pelo procurador Rafael Curruchiche, muito próximo de Porras, obteve o apoio de uma ordem judicial para suspender a legalidade do Semilla, alegando que teria cometido supostas irregularidades na coleta de assinaturas de militantes.

A armação chega ao nível da desfaçatez, pois, no mesmo dia 12 de julho, uma hora antes do TSE anunciar oficialmente quem iria para o segundo turno, Curruchiche anunciou que estava abrindo um processo-crime contra Semilla por fatos ocorridos em 2017 e 2018.

O Ministério Público iniciou uma investigação e nas últimas duas semanas o juiz Fredy Orellana ordenou duas vezes busca ao TSE e expediu mandado de prisão contra a autoridade responsável, apesar das liminares concedidas pelo Tribunal Constitucional.

O tribunal da mais alta hierarquia do país corrigiu o plano e disse que, de acordo com a Lei Eleitoral e dos Partidos Políticos, a legalidade de uma organização política não pode ser suspensa enquanto decorrem as eleições, mas deixou o caminho aberto para que o Ministério Público prossiga com a perseguição e a investigação criminal contra membros do partido.

Na mesma segunda-feira, apontou o La Jornada, “o Parlamento Xinca, formado por autoridades ancestrais de uma das quatro etnias do país, apresentou três denúncias contra Porras, Curruchiche e Orellana, respectivamente, acusando-os de resoluções que violavam a Constituição”. Estes se juntam a outros que já caem contra os mesmos funcionários por se intrometer nas eleições.

“A história da Guatemala registra acontecimentos marcantes: a obscena presença dos Estados Unidos e seu braço imperial, as corporações bananeiras – especialmente a United Fruit Company – que saquearam o país, esvaziaram-no de seus recursos e impuseram governos autoritários. E sua contrapartida: os governos revolucionários de Juan José Arévalo (1945-1951) – pai de Bernardo – e Jacobo Arbenz (1951-1954), que iniciaram uma série de reformas políticas e sociais inéditas no país: reforma agrária, nacionalização dos recursos naturais, ampliação dos direitos trabalhistas, seguridade social, educação, política externa soberana, busca pela unidade dos Estados centro-americanos”, recordou o jornalista Mariano Vázquez.

Fonte: Papiro