CPMI está perto de descobrir quem bancou o golpe de 8 de Janeiro
Mark Felt, o ex-número 2 do FBI, nunca disse “siga o dinheiro” (“follow the money”) ao jornalista Bob Woodward, do Washington Post, que cobria o “caso Watergate”. Mas “seguir o dinheiro” é, por regra, a melhor forma de investigar fraudes financeiras e escândalos de corrupção. Daí que William Goldman, o roteirista de Todos os Homens do Presidente, recorreu à licença narrativa para atribuir a frase-exortação a Felt – o que se ajustou bem ao grande filme de Alan J. Pakula.
Os membros da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro – que investigam o fracassado “Bolsonarogate” – têm levado a recomendação à risca. Passados mais de seis meses da invasão e depredação de sedes dos Três Poderes, o STF (Supremo Tribunal Federal) já abriu processos penais contra 1.290 acusados de participação nos atos. Em meio a esses réus, 253 ainda estão presos. Mas quem financiou uma tentativa de golpe nessas proporções?
Qualquer fonte (anônima ou pública) será bem-vinda à CPMI. Mas, antes que apareça uma versão brasileira de Mark Felt – um “Garganta Profunda” tupiniquim –, a boa notícia é que os parlamentares responsáveis pela comissão estão perto de descobrir quem bancou o 8j.
Relatórios entregues pela Abin (Agência Brasileira de Inteligência) à CPMI revelam que 12 empresas transportadoras, proprietárias de caminhões e/ou associadas ao garimpo ilegal estão no centro do financiamento ao golpe. Ao menos 272 caminhões entraram em Brasília entre o começo de novembro e 8 de janeiro para dar sustentação aos golpistas. Cerca de 65% da frota era nova ou seminova e pertencia a empresas. Por isso, a Abin sugere que caminhoneiros autônomos eram minoritários nesse bando.
Um CNPJ, o da Sipal Indústria e Comércio, de Paranaguá (PR), é o que responde por mais veículos – dez ao todo. E um CPF, o do empresário, Alexandro Lermen, vem em seguida, com sete caminhões. Os dois tiveram as contas bloqueadas.
Empresas que apoiam o garimpo ilegal aparecem igualmente com destaque no relatório. Segundo a Abin, “essas conexões evidenciam o vínculo entre a prática de ilícitos ambientais e a atuação de grupos extremistas contrários à eleição para a Presidência da República em 2022, além de permitirem identificar redes de práticas delituosas abrangendo diversas atividades, atores e verbas oriundas da exploração ilegal de recursos naturais”
Ainda conforme a agência, “em 6 e 7 de setembro de 2021, a maioria dos caminhões utilizados na invasão da Esplanada pertenciam a empresas agrícolas do ramo de transportes, sendo reduzida a participação de caminhoneiros autônomos. O mesmo pode ser dito dos caminhões enviados em comboio à Brasília a partir de 4 de novembro de 2022”.
Ao todo, a Abin fez 11 relatórios sobre atos golpistas desde o final das eleições presidenciais de 2022, nas quais Luiz Inácio Lula da Silva (PT) derrotou, em segundo turno, Jair Bolsonaro, que buscava a reeleição. Um desses relatórios aponta para o apoio financeiro mais longevo (desde 2020) do Movimento Verde e Amarelo, ligado a produtores de soja.
Outro documento diz que, a partir de 4 de janeiro, 3.875 bolsonaristas foram a Brasília em 103 ônibus fretados. Há 83 financiadores individuais e 13 entidades que ajudaram a bancar as despesas de transporte. Com a ajuda da Abin, a CPMI do 8 de janeiro “seguiu o dinheiro”. Os bolsonaristas que tanto pediram uma comissão como esta no Congresso terão muito que se arrepender.