Para Lula, proposta da UE para acordo com Mercosul é inaceitável
Em sua passagem pela Itália, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva classificou como “inaceitável” a carta da União Europeia ao Mercosul, prevendo punições aos signatários que descumprirem metas ambientais. Ao mesmo tempo, o assessor especial da Presidência, Celso Amorim, destacou que a relação entre os blocos não pode ser “neocolonial”.
A declaração do presidente foi dada nesta quinta-feira (22) durante coletiva de imprensa em Roma. O presidente defendeu que seja estabelecida “uma relação mais moderna e civilizada entre União Europeia e América Latina” e argumentou que a proposta apresentada “não está em conformidade com aquilo que é o sonho de países da América Latina, como o Brasil, que querem ter o direito de recuperar a sua capacidade de industrialização”.
Lula acrescentou que o país “já teve um PIB industrial de 30%. Hoje, o nosso PIB é apenas 10%. Significa que o Brasil se desindustrializou. Nós precisamos voltar à industrialização. A carta adicional que a União Europeia mandou para o Mercosul é inaceitável. É inaceitável porque eles colocam punição para qualquer país que não cumprir o acordo de Paris”.
O presidente completou lembrando que“nem eles cumpriram o Acordo de Paris. Os países ricos não cumpriram o Acordo de Paris, o Protocolo de Quioto, não cumpriram as decisões de Copenhague. É preciso que a gente tenha um pouco mais de sensibilidade, um pouco mais de humildade. Nós estamos preparando a nossa resposta para a União Europeia e vamos ver se a gente se coloca de acordo para fazermos um acordo que favoreça os dois continentes. Um jogo de ganha-ganha e não um jogo de ganha-perde ou de perde-perde”.
Ao sair de Roma, Lula viajou a Paris, onde se reúne com o presidente francês Emmanuel Macron. Um dos principais pontos do encontro será o acordo. Ele abordará a aprovação, na semana passada, pela Assembleia Nacional da França, de uma resolução contra a ratificação do acordo Mercosul-UE. A medida foi considerada dura pelo presidente brasileiro.
Na coletiva, ainda na Itália, Lula disse: “Não é correto você estar discutindo o acordo e alguém achar que pode colocar punição a um parceiro no acordo. Um acordo pressupõe uma via de duas mãos, sabe? Todo mundo precisa fazer, todo muito tem de ceder, todo mundo precisa conquistar alguma coisa”.
Sobre a França, declarou: “Eu sei que os franceses são duros porque não é de hoje que a gente tenta negociar entre União Europeia e Mercosul. E todo mundo sabe da dureza dos franceses em defesa da sua agricultura. Todo mundo sabe. Mas é normal que eles sejam assim. Mas também é normal que a gente não aceite. Entre eles quererem e a gente não aceitar cria-se a oportunidade de se estabelecer uma negociação. Eu vou discutir com o Macron, sim”.
“Relação neocolonial”
Na avaliação feita ao UOL pelo assessor especial da Presidência, Celso Amorim, “é muito bom ter um acordo com a União Europeia, até para ajudar no equilíbrio mundial e para o nosso equilíbrio. Não queremos só China e EUA. Mas não pode ser uma relação neocolonial”. Ele acrescentou que “um acordo deste precisa ser baseado na confiança, e não na desconfiança” e classificou a carta da UE, com essas condições, como “muito infeliz”.
Além do protecionismo em relação a questões agrícolas mencionado por Lula e da obrigatoriedade de cumprimento do Acordo de Paris, outro aspecto que o governo brasileiro quer rever diz respeito às licitações públicas — cujo valor anual no Brasil fica em torno de US$ 150 bilhões. Segundo os termos estabelecidos para o pacto, as empresas europeias poderiam participar da concorrência, o que prejudicaria as nacionais.
O acordo Mercosul-UE foi aprovado em 2019, após 20 anos de negociação. Para entrar em vigor, no entanto, precisa ser ratificado pelos parlamentos de todos os 31 países dos dois blocos. Em março, a UE enviou uma carta ao Mercosul, estabelecendo novas condições, entre as quais a previsão de aplicação de sanções aos países signatários em caso de descumprimento de metas ambientais.
Em encontro recente com a presidente da Comissão Europeia, braço executivo da UE, Ursula Von der Leyen, Lula expressou as preocupações do país com as novas imposições.
Com agências