Segundo Hersh, articulação para plantar "história falsa" foi detalhada em Washington | Foto: Yahoo

O jornalista investigativo Seymour Hersh afirmou na quarta-feira (22), que a Casa Branca coordenou com o governo alemão uma operação para encobrir a ordem do presidente Joe Biden para explodir o gasoduto Nord Stream.

A trama denunciada por Hersh resultou em um artigo publicado no New York Times atribuindo o atentado de setembro passado a “terroristas ucranianos não estatais”, um “grupo pró-Kiev”, e não mergulhadores da Marinha dos EUA.

O jornalista revelou, ainda, que a operação de encobrimento foi acertada na curiosa viagem do primeiro-ministro alemão Olaf Scholz, em que este foi praticamente sozinho a Washington fazer os acertos com o próprio Biden, no início de março.

Em uma postagem em seu blog Substack, Hersh aponta que a CIA foi incumbida de preparar uma reportagem de capa em colaboração com a inteligência alemã para plantar uma “versão alternativa” das explosões do Nord Stream 2 na mídia norte-americana e também na alemã.

Ele acrescentou que isso era parte de uma armação coordenada para produzir um “apagão” de sua exposição (em fevereiro) do papel de Washington – isto é, Biden – no atentado.

O veterano jornalista de 85 anos e vencedor do Prêmio Pulitzer, é respeitado no mundo inteiro por ter trazido à luz o massacre de 500 civis em Mi Lai na guerra do Vietnã; a campanha secreta de bombardeios dos EUA no Camboja; a tortura na prisão de Abu Graib na Guerra do Iraque e a falsa atribuição de um ataque com armas químicas em Ghouta, na Síria, ao governo sírio em vez de a um grupo de jihadistas apoiados pelos EUA.

“Nas palavras da comunidade de inteligência, a agência [CIA] deveria ‘pulsar o sistema’ em um esforço para descartar a alegação de que Biden havia ordenado a destruição dos gasodutos”, assinalou Hersh, citando uma fonte anônima com acesso à inteligência diplomática.

INVENÇÃO TOTAL

“Foi uma invenção total da inteligência americana que foi repassada aos alemães e visava desacreditar sua história”, disse a Hersh uma fonte da comunidade de inteligência americana.

“Os profissionais de desinformação dentro da CIA entendem que uma jogada de propaganda só pode funcionar se aqueles que a recebem estiverem desesperados por uma história que possa diminuir ou deslocar uma verdade indesejada. E a verdade em questão é que o presidente Joe Biden autorizou a destruição dos gasodutos”, acrescentou.

Assim, o NYT publicou no dia 7 de março o artigo que alegava que “um grupo pró-ucraniano” poderia estar por trás da explosão do oleoduto e – haja coincidência – no mesmo dia o semanário alemão Der Zeit asseverou que autoridades investigativas alemãs teriam encontrado um iate de luxo, fretado por um grupo de ucranianos sob falsos pretextos, e supostamente usado para colocar os explosivos no Nord Stream.

“Não houve declarações ou entendimentos por escrito tornados públicos desde então por nenhum dos governos, mas fui informado por alguém com acesso à inteligência diplomática que houve uma discussão sobre a exposição do gasoduto e, como resultado, certos elementos da CIA foram solicitados a preparar uma reportagem de capa em colaboração com a inteligência alemã que forneceria à imprensa americana e alemã uma versão alternativa para a destruição do Nord Stream 2”, escreveu Hersh.

PRIMEIRA PÁGINA

De fato, o The New York Times, que foi um dos dois jornais que publicaram a história, admitiu no passado ter deixado a CIA revisar certas histórias antes de publicá-las. Foram as manchetes de primeira página do NYT, sustentadas nas mentiras fornecidas a Judith Miller pela CIA, que pavimentaram o caminho para a invasão do Iraque.

Em seu artigo, Hersh se refere ao papel triste a que certos jornalistas têm se prestado, no conflito na Ucrânia, e nas guerras sem fim dos EUA. “Não há evidências de que algum repórter designado para lá tenha perguntado ao secretário de imprensa da Casa Branca se Biden fez o que qualquer líder sério faria: formalmente “encarregar” a comunidade de inteligência americana de conduzir uma investigação profunda, com todos os seus ativos, e descobrir quem cometeu o ato no Mar Báltico”.

“Segundo uma fonte da comunidade de inteligência, o presidente não fez, nem fará tal investigação”, afirmou o jornalista. “Por que não? Porque ele sabe a resposta”. E a verdade em questão é que o presidente Joe Biden autorizou a destruição dos gasodutos.

A estranha visita de Scholz a Biden também foi esmiuçada por Hersh: incluia apenas dois eventos públicos – uma breve troca de elogios pro-forma entre Biden e Scholz perante a imprensa da Casa Branca, sem perguntas permitidas; e uma entrevista da CNN com Scholz por Fareed Zakaria, que não tocou no caso do gasoduto.

“Scholz havia voado para Washington sem membros da imprensa alemã a bordo, sem jantar formal agendado e não haveria uma coletiva de imprensa, como costuma acontecer em tais reuniões de alto nível. Uma reunião de 80 minutos, sem a presença de assessores na maior parte do tempo, e sem declarações ou entendimentos por escrito tornados públicos”.

Hersh também registrou o custo, para os europeus, da destruição em setembro do Nord Stream. Ele entrevistou Sarah Miller, editora de Energy Intelligence, que relatou que a explosão dos gasodutos “levou a um novo aumento nos preços do gás natural, que já eram seis ou mais vezes os níveis pré-crise”.

“As importações alemãs de gás atingiram o pico um mês depois, em outubro, 10 vezes os níveis anteriores à crise. Os preços da eletricidade em toda a Europa subiram e os governos gastaram até 800 bilhões de euros, segundo algumas estimativas, protegendo famílias e empresas do impacto”, ela acrescentou.

Fonte: Papiro