Freddy Mamani, vice-chanceler da Bolívia: "Água não deve ser transformada em mercadoria" | Foto: MRE/Bolívia

Em evento organizado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), a Bolívia defendeu “o acesso à água como um direito humano fundamental, que não deve ser transformado em mercadoria ou objeto de especulação comercial”, entre outras propostas que podem ser incorporadas à agenda de ação regional, que será apresentada à Organização das Nações Unidas (ONU) em março.

A posição boliviana foi reiterada pelo vice-ministro do Exterior da Bolívia, Freddy Mamani, e pelo vice-ministro de Água Potável e Saneamento Básico, Carmelo Valda, nos Diálogos Regionais sobre A Água na América Latina e no Caribe 2023: rumo à Conferência Mundial da Água das Nações Unidas (ONU), realizada entre os dias 1º e 3 de fevereiro, em Santiago do Chile.

“A Bolívia assim se expressou em 2009, em sua Constituição Política do Estado, não só estabelecendo que todos têm direito ao acesso universal e equitativo aos serviços básicos de água potável, mas também o acesso à água constitui um direito humano que não está sujeito concessão ou privatização”, esclareceu Freddy Mamani.

O evento das Nações Unidas, sublinhou Mamani, analisar o progresso do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e avaliar os compromissos dos países da região para acelerar sua implementação com base em uma transição hídrica sustentável e inclusiva no âmbito da Agenda 2030, além de promover a troca de experiências e aprendizados para acelerar as metas da Década de Ação pela Água 2018-2028. Com base nisso, visa estabelecer uma agenda de ação regional a ser apresentada em Nova Iorque, nos Estados Unidos.

Além de destacar os avanços do país na gestão dos recursos hídricos e na cobertura de água potável e saneamento, a comissão boliviana deu grandes contribuições, incluindo a luta pelo desenvolvimento econômico integral e sustentável, pela erradicação da pobreza e pela capacidade de garantir uma resposta institucional adequada a futuras pandemias, permitindo o pleno gozo da vida e de todos os direitos humanos.

Entre as prioridades foi proposta a necessidade de proteger e conservar as fontes de água, o acesso equitativo e justo a este precioso recurso para todos os usos, promovendo a participação de mulheres, jovens, povos indígenas camponeses originais, afrodescendentes e grupos vulneráveis, reforçando as capacidades dos gestores e administradores de água.

Os representantes bolivianos defenderam que os países desenvolvidos e as empresas públicas e privadas sejam incentivadas a flexibilizar os mecanismos de liberação de patentes, de propriedade intelectual e/ou licenças compulsórias ou voluntárias, e a fortalecer a institucionalidade dos órgãos e mecanismos transfronteiriços de gestão de bacias, criados entre os Estados. Além disso, propuseram a facilitação da produção local de alimentos, com alta qualidade nutricional e práticas regenerativas e que priorizem a conservação da agrobiodiversidade, como forma de enfrentar as atuais crises de saúde pública, hídrica e climática.

Sob a presidência de Evo Morales, do Movimento Ao Socialismo (MAS), o país foi o primeiro a criar o Ministério da Água, em 2006.

“No momento em que todo o planeta passa por uma grave crise hídrica, mais do que nunca é imprescindível recordar a importância estratégica da luta do nosso povo pela nacionalização da água”, declarou o pesquisador e cientista social Porfirio Cochi, lembrando especificamente das gigantescas manifestações que começaram nas ruas de Cochabamba em abril de 2000 “contra a criminosa concessão à Águas del Tunari, dirigido pela multinacional inglesa Bechtel”.

“Em outubro de 1999, o Congresso da República havia aprovado a Lei de Água Potável e Esgotos Sanitários dando sinal verde à privatização da água em todo o país, o que representaria aumentar os lucros para os estrangeiros e colocar o preço nas nuvens para os consumidores. Nas ruas, a resposta foi um não retumbante ao governo de Hugo Banzer”, enfatizou o pesquisador.

Na avaliação de Porfirio Cochi, com base em uma trágica experiência que custou a vida de centenas de pessoas, “é fundamental honrar a heroica luta empreendida por tantos homens e mulheres para que o patrimônio público siga sendo respeitado, assegurando o interesse coletivo, o bem comum por cima do cifrão”. “Assegurar o acesso universal à água e à alimentação é essencial e estão consagrados como direito fundamental na Constituição boliviana”, concluiu. Naquele período, a empresa francesa Suez aplicou tarifas de escorcha e muitos bolivianos pobres tiveram cortado o fornecimento de água.

Fonte: Papiro