Crise da Boeing se aprofundou com fiasco de recente aeronave 737 MAX | Foto: Jason Redmond/AFP

A empresa de aviação Boeing, anuncia que deve demitir 2.000 trabalhadores neste ano de 2023. Segundo o jornal que circula na cidade que sedia a empresa, o Seattle Times, as demissões atingem, além dos operários da fábrica, também funcionários dos departamentos de finanças e pessoal.

Outra empresa de grande porte, a Dell, anunciou cortes: a fabricante de computadores Dell deve dispensar 6.000 trabalhadores. O motivo anunciado pela empresa é a redução nas vendas de computadores nos Estados Unidos.

Anteriormente, a agência Sky News informou que a Microsoft vai reduzir os quadros da empresa em 5%.

Uma verdadeira onda de demissões assola os trabalhadores no país e vem se acelerando. Em dezembro do ano de 2022 as demissões atingiram funcionários da Twitter, Amazon e Netflix, entre diversas outras.

Com pesquisas dando que, entre os próprios eleitores democratas, só 38% o que quer como candidato à reeleição, o presidente Joe Biden optou, no tradicional discurso anual do Estado da União, por focar nas questões econômicas e de política doméstica, tratando de forma periférica a política externa, em busca de pavimentar enquanto pode sua condição de candidato octagenário.

Quanto ao quadro em que o discurso foi proferido, para a CNN “a maioria dos americanos diz que ele não realizou muitas coisas e muitos democratas não estão entusiasmados com a perspectiva de ele concorrer à reeleição”.

Avaliação semelhante do portal The Hill – especializado em notícias do Congresso – “apenas um quarto dos adultos dos EUA acham que as coisas estão indo na direção certa, de acordo com uma nova pesquisa da Associated Press-NORC Centro de Pesquisas para Assuntos Públicos. E a maioria dos democratas não quer que Biden busque outro mandato”.

Ao longo do ano passado, os norte-americanos se defrontaram com uma alta da inflação, prateleiras vazias de produtos com alimentos para bebês e até absorventes, e elevação dos aluguéis. Mas – registrou a CNN – quando o presidente Biden foi à Câmara agora controlada pela oposição republicana para seu discurso, “sua mensagem foi de otimismo”.

Ele reivindicou o crédito pelo progresso feito durante seus primeiros dois anos no cargo – criação recorde de empregos, fim da pandemia e volta da economia à normalidade, mais aprovação das leis da infraestrutura e da reconstrução do setor de semicondutores. E, antecipando o mote reeleitoreiro, várias vezes repetiu que “vamos concluir o trabalho”.

Segundo Biden, os problemas [que a população percebe] existem em razão da pandemia ter interrompido as cadeias de abastecimento e da guerra da Rússia na Ucrânia, que afetou o fornecimento de energia e de alimentos – como se não fossem as sanções que ele próprio decretou que tivessem realimentado a inflação.

Isso depois de Washington ter se recusado a recuar da anexação à Otan da Ucrânia pós-golpe de 2014. Ainda assim – asseverou – “estamos melhor posicionados do que qualquer outro país na Terra neste momento”.

Após o fracasso do plano Build Back Better, que estiolou no Congresso, o governo Biden aprovou em 2021 a lei da infraestrutura, de US$ 550 bilhões em novos investimentos federais ao longo de cinco anos, em estradas, pontes, transporte público, ferrovias, aeroportos, portos e hidrovias. O pacote inclui US$ 65 bilhões para a banda larga e US$ 7,5 bilhões para a construção de uma rede nacional de carregadores para veículos elétricos.

O pacote “para redução da inflação” (IRA) estabeleceu no ano passado US$ 369 bilhões para subsídios a veículos elétricos e baterias, desde que produzidos nos EUA, sob protestos dos europeus e sul-coreanos, e para a indústria de semicondutores.

TROPEÇOS

Biden destacou que, dois anos após o ataque ao Capitólio, a democracia nos EUA embora embora “ferida”, permanece “inabalada”. “Dois anos atrás, nossa democracia enfrentou sua maior ameaça desde a Guerra Civil”. Ele chamou a defender os direitos eleitorais.

Chamou a atenção também que, ao contrário dos tropeços e até desorientações mostradas repetidamente em cerimônias públicas, ironizadas pelo apelido de Joe Dorminhoco dado por Trump, Biden estava inusitadamente ‘afiado’ no discurso anual.

Com o teto da dívida pública marcado para ser atingido a qualquer momento deste ano, cuja elevação depende de um acordo com os republicanos, sob pena de paralisia da máquina governamental e até ‘default’, Biden fez meneios ao bipartidarismo e ao entendimento com o novo presidente da Câmara, Kevin McCarthy, que, aliás saiu meio chamuscado no demorado processo de eleição à presidência da Casa.

“Senhor presidente [da Câmara], não quero arruinar sua reputação, mas estou ansioso para trabalharmos juntos”, disse Biden ao iniciar seu discurso. Ele instou o Congresso a “comprometer-se aqui esta noite que a plena fé e o crédito dos EUA nunca, jamais serão questionados”.

Nesse esforço para mudar a percepção da população sobre seu governo, Biden prometeu acabar com as “taxas inúteis” para proteger os consumidores “que estão cansados de serem vistos como otários”, asseverou perceber que “muitos de vocês sentem que acabaram sendo esquecidos” em meio à turbulência econômica das últimas quatro décadas e levados a se perguntar “se ainda existe um caminho para você e seus filhos progredirem sem se afastarem. Eu entendo”.

Nessa mesma linha, Biden asseverou que “nenhum bilionário deveria pagar uma taxa de imposto menor do que um professor ou um bombeiro”. Após se dizer “escandalizado” com os lucros das empresas de petróleo, que no ano passado embolsaram “200 bilhões de dólares em meio a uma crise energética global”, o presidente propôs quadruplicar a taxação de 1% sobre a recompra de ações, expediente usado pelas corporações para inflar o pagamento de dividendos e bônus, após manobras para inflar o valor das ações na bolsa.

UNANIMIDADE

No embate com alguns deputados republicanos que o interpelaram e o xingaram de “mentiroso”, Biden saiu por cima.

Ele tinha se referido à chantagem, na renegociação do teto da dívida, de setores republicanos que pressionam por cortes na previdência e no Medicare (assistência médica aos idosos), sob pretexto de compensação.

“Gostei da conversão. Unanimidade, todos concordamos; então, não cortaremos a Previdência Social ou o Medicare”, rebateu Biden, provocando aplausos da sua bancada.

Em meio à crise que atinge a maioria das empresas norte-americanas e que as estão levando a cortes massivos, Biden enfatizou a importância de reconstruir as cadeias de suprimentos domésticas, destacando os recentes investimentos em fábricas de semicondutores (Lei CHIPS), a lei IRA (subsídios para veículos elétricos e baterias made in USA e a lei de infraestrutura.

O presidente anunciou ainda que as regras de conteúdo doméstico que já se aplicam a alguns materiais na lei IRA agora têm “novos padrões para exigir que todos os materiais de construção usados em projetos federais de infraestrutura sejam feitos na América… madeira, vidro, drywall, cabos de fibra ótica” e que estradas, pontes e rodovias americanas “serão feitas com produtos americanos”.

IMPASSES

O discurso retomou promessas sobre nova lei da imigração, de improvável aprovação no Congresso dividido, e a urgência de “retreinamento da polícia”, como forma de evitar a morte de mais negros desarmados por policiais ensandecidos e acostumados à impunidade, sob o racismo incrustado na sociedade norte-americana. Cuja vítima mais recente foi Tyre Nichols, espancado até a morte por cinco policiais tão negros quanto ele, em Menphis, depois de um incidente banal de trânsito.

A mãe dele, homenageada, considerou as palavras de Biden sobre o caso “poderosas”, mas acrescentou que o que é inadiável é a “ação”. Sem ação, “palavras são apenas palavras”, enfatizou.

Quanto à política imperial e ao mundo unipolar ‘sob regras’ de Washington, Biden foi breve, se comprometendo em prosseguir com a guerra por procuração à Rússia na Ucrânia, gabando-se de “unir a Otan” e dando a entender que as provocações contra a China não vão cessar.

“Estou comprometido em trabalhar com a China onde for possível promover os interesses americanos e beneficiar o mundo”, afirmou Biden. “Mas não se enganem: como deixamos claro na semana passada, se a China ameaçar nossa soberania, vamos agir para proteger nosso país. E foi o que fizemos”. O abate de um balão não-tripulado de pesquisa meteorológica, que acidentalmente atravessou os EUA, por causa de um vórtex ártico, com um míssil disparado de um caça furtivo de quinta geração F-22, foi considerado por analistas equivalente a “matar um mosquito com tiro de canhão”.

Nos dias que antecederam o discurso, Biden anunciou mais armas e mais dólares para o regime de Kiev e mais sanções contra a Rússia. Na Ásia, o Pentágono aumentou em quatro o número de bases militares nas Filipinas e o secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, visitou o Japão, que recentemente anunciou um plano de rearmamento.

Fonte: Papiro