A campanha mundial “16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher” foi criada pela ONU Mulheres em 1991 e é organizada anualmente em mais de 150 países com objetivo de conscientizar a população sobre os diferentes tipos de agressão contra mulheres e propor medidas de prevenção e combate à violência, ampliando também os espaços de debate com a sociedade.

O calendário internacional começa em 25 de novembro (Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres) e termina em 10 de dezembro (Dia Internacional dos Direitos Humanos). A data foi escolhida pela ONU para homenagear e lembrar a luta das irmãs Mirabal, três mulheres, mães e esposas dominicanas de classe média, conhecidas como ‘Las Mariposas’ (as borboletas), que foram assassinadas em 1960, na República Dominicana, por lutarem contra o brutal regime ditatorial de Rafael Trujillo.

No Brasil, onde a adesão teve início em 2003, a campanha começa antes, no dia 20 de novembro em razão do Dia Nacional da Consciência Negra, considerando a dupla vulnerabilidade da mulher negra. Por este motivo, o que eram apenas 16 dias, viraram “21 dias de ativismo”, também chamado de “16+5 Dias”.

A mobilização é empreendida por diversos atores da sociedade civil e do poder público e contempla as seguintes datas principais: 20 de novembro, Dia da Consciência Negra (início da campanha no Brasil; 25 de novembro – Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres; 29 de novembro – Dia Internacional dos Defensores dos Direitos da Mulher; 1º de dezembro – Dia Mundial de Combate à Aids; 3 de dezembro – Dia Internacional das Pessoas com Deficiência; 6 de dezembro – Dia dos Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres (campanha do Laço Branco); 10 de dezembro – Dia Internacional dos Direitos Humanos e encerramento oficial da campanha.

Importância da campanha

Comversamos com a secretária interina da Mulher do PCdoB, Márcia Campos, sobre a importância da campanha e, para ela, esse é “um momento especial para que se possa, no Brasil inteiro, [entre] diversos setores da sociedade, assumir o compromisso com a denúncia da questão da violência contra a mulher em todos os níveis.”

Márcia explica ainda que aqui no Brasil “a violência que se falava, que existia com intensidade, era a violência do marido – do homem contra a mulher” e que hoje existe uma violência mais generalizada, “particularmente, a violência política, que se dá de várias forma e todas elas bastante estrondosas e arrepiantes em como se pode tratar a mulher dessa forma. Mulheres que são parlamentares dentro da Casa, que deveria ser a Casa do povo, e, portanto, compor pessoas de diversas matizes: homem, mulher, negro, branca, indígena, enfim, todo mundo. E, no entanto, as mulheres quando procuram fazer as denúncias da situação da mulher brasileira dentro das casas legislativas, são atacadas pelos outros parlamentares e nem sempre são defendidas. Então essa luta ganhou muita força durante esse último período e hoje é uma luta que nós todas estamos muito imbuídas.”

Márcia afirma ainda que o governo Bolsonaro aumentou aquilo que já era ruim. Para ela, Bolsonaro “criou uma situação na sociedade em que seus apaziguados, aqueles que seguem sua opinião, acham que podem destratar mulher e tratá-las como se fossem nada. É uma luta que nós começamos a ganhar na hora que derrotamos Bolsonaro e elegemos Lula. Agora tem muita gente ainda com esse tipo de consciência. O bolsonarismo não é pequeno. Então essa vai ganhar muita força e nós vamos precisar demais do governo Lula para enfrentá-la.”

“Ainda há muitas mulheres em perigo”

Já Claudia Rodrigues, presidente da União Brasileira de Mulheres (UBM) na cidade de São Paulo e integrante do Conselho Municipal de Políticas para Mulheres (CMPM), expôs sua opinião em meio a dados e pesquisas que destacam que, apesar do número de medidas protetivas concedidas às mulheres no estado ter aumentado nos últimos anos, ainda “há muitas mulheres em perigo”. E embora “indiquem que elas estão mais dispostas a denunciar, é preciso que os poderes públicos, os organismos multilaterais e as entidades da sociedade ofereçam as informações, os meios e a segurança para que elas registrem as ocorrências e sobretudo consigam romper o ciclo da violência, sendo que autonomia financeira é um dos requisitos primordiais para esse rompimento.”

Diante disso, a dirigente destaca que “essa campanha da ONU Mulheres é parte do rol de iniciativas de proteção à vida das mulheres, para chamar a atenção para a urgência de medidas de amplo alcance e fácil acesso. E note que, aqui, estamos nos referindo apenas a violência física, nem adentramos o campo de outras espécies de violência, como a econômica, a patrimonial, a política, a institucional, a moral, a digital e outras que afetam a população feminina.”

Participação da sociedade

Cláudia também conta que, apesar de ganhar força e de existirem  diversos atores da sociedade civil e do poder público engajados com a campanha, “não existem comandos nem ações centralizadas”, segundo ela “movimentos, entidades e coletivos organizam suas atividades conforme seus objetivos e possibilidades, e as iniciativas normalmente ocorrem nos territórios ou áreas de abrangência de quem as realiza – em algumas ocasiões, podem se unificar às pautas gerais e ao calendário de luta dos movimentos sociais e feministas. Em geral, são debates, palestras, oficinas, rodas de leitura, exibição de documentários e outras formas de conscientização.”, disse.

“No caso da UBM de São Paulo, fazemos rodadas de conversas nos núcleos, que se localizam em favelas na periferia da cidade, onde os índices de violência e demais vulnerabilidades são altos e os serviços de atendimento são escassos. Convidamos líderes feministas, autoridades públicas e especialistas em políticas de combate às violências e incentivamos as mulheres a buscarem informações e se organizarem em redes de apoio locais. Uma prática da UBM é fornecer o celular de contato das nossas diretoras regionais para casos de emergência nos bairros e também temos grupos de WhatsApp em cada núcleo, o que nos ajuda nas mobilizações para as atividades.”, disse a dirigente.

Ao ser questionada sobre a adesão e participação da sociedade nesse movimento, Cláudia disse ao Portal Vermelho que “o combate às violências precisa ser cotidiano e contínuo, em todos os espaços públicos e privados, em especial como atividade educacional, no ambiente escolar. Isso significa fazer campanhas de conscientização nas escolas sobre assédio, abusos e todo tipo de violência sexual que as meninas sofrem em casa; e também para que as escolas cada vez mais se tornem espaço de acolhimento às crianças vítimas e de denúncia desses crimes.”

Claudia Rodrigues – Foto Karla Boughoff

Para ela, a campanha dos “21 Dias de Ativismo” ajuda a dar visibilidade ao problema e atrair mais organizações interessadas em soluções “mas é insuficiente para que, de fato, haja uma grande mobilização da população. Ainda são poucos os grupos, movimentos e segmentos que se engajam, não só nesta iniciativa especificamente, mas em outras ações de combate ao machismo, à misoginia, à homofobia e ao racismo – que são crimes entrelaçados, no caso do Brasil.”, concluiu.  

“Tenho esperança de que o novo governo que assumirá em janeiro retome as políticas públicas de enfrentamento à violência e de amparo social, psicológico e econômico para todas as mulheres e meninas que vivem expostas a agressões, abusos, assédio, exploração e morte. Que se faça um chamado aos meios de comunicação, às plataformas da internet, às instituições e a todos os setores organizados para um mutirão pelo fim das violências.”, completou.

 Violência

A dirigente da UBM/SP também disse ao Portal Vermelho que, segundo pesquisas, “existe em vários países, Brasil incluído, uma pandemia de violência contra mulheres e meninas que afeta uma em cada três pessoas da população feminina em algum momento da sua vida. Metade das mulheres mortas em todo o mundo foram assassinadas por parceiros ou familiares. Em comparação, apenas um em cada 20 homens foram mortos nas mesmas circunstâncias.”

Segundo ela, “no Brasil, quinto país com maior taxa de homicídios de mulheres, especialistas entendem que feminicídio é epidemia, com 1.319 casos registrados em 2021. Um crime que deixa 2 mil órfãos por ano no país. No Estado de São Paulo houve 136 registros em 2021. Outros tipos de crime também são altos aqui: 38.428 registros de lesão corporal dolosa contra mulheres no ano passado e 10.644 estupros e estupros de vulneráveis, que abarcam mulheres e pessoas menores de 14 anos ou cujas condições de saúde as impedem de discernir ou resistir ao crime.”, disse.

Balanço anual do Disque 100 (Disque Direitos Humanos) indica que o país registrou 17.288 casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes em 2019, sendo que mais de 14 mil vítimas eram meninas.

A Delegacia de Defesa da Mulher Online do Estado de São Paulo registrou mais de 60 mil boletins de ocorrência de vítimas de violência doméstica em dois anos de pandemia, de abril de 2020 a abril de 2022. Dessas, 10 mil vítimas tiveram medidas protetivas autorizadas pela Justiça. No entanto, os casos de violência são bem mais numerosos, porque os boletins pela internet correspondem a apenas 24% do total de registros.

Câmara dos Deputados

A Câmara dos Deputados, por meio da Secretaria da Mulher, assina nesta quarta-feira (23), às 18 horas, no Salão Nobre, o Pacto Nacional pelos Direitos da Mulher. A solenidade integra as atividades da campanha pelos “21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres”.

O pacto é um instrumento público, a ser assinado por diversas entidades e instituições, que tem por objetivo construir um esforço conjunto entre os Poderes Legislativo, Executivo, Judiciário, sociedade civil organizada e outros parceiros, para avançar na concretização e alcance efetivo dos direitos pelas mulheres e meninas brasileiras.

O instrumento público vai se valer de ações articuladas e integradas para difundir, promover e fortalecer os direitos humanos das mulheres em dez áreas temáticas:

  • Igualdade no mundo do trabalho e autonomia econômica
  • Economia do cuidado
  • Acesso ao bem-estar e à saúde
  • Enfrentamento a todas as formas de violência
  • Participação igualitária nos espaços de poder e decisão
  • Acesso democrático à cultura, ao esporte, ao lazer e à comunicação
  • Planejamento urbano (mobilidade e outros)
  • Inclusão e segurança digital
  • Meio ambiente e desenvolvimento sustentável, e
  • Educação para a igualdade

Confira a programação da Câmara para os “21 dias de ativismo” aqui

Conselho Nacional de Justiça

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) também promove ações durante o período. Segundo os organizadores, “a campanha representa para o CNJ um marco no aprofundamento das políticas de combate à violência de gênero, feminicídio e outras formas de agressões no âmbito do Judiciário. A campanha, bem como outras ações, desenvolvidas pelo Conselho Nacional de Justiça, estão em sintonia com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) previstos na Agenda 2030, elaborados pela Organização das Nações Unidas (ONU). Em especial, o ODS 5, que visam estimular ações para o alcance da igualdade de gênero e o empoderamento de todas as mulheres e meninas.”

Confira os materiais de divulgação disponibilizados pelo CNJ para o período aqui

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com informações de agências*