Saiba como Bolsonaro vem sendo responsabilizado por crimes no 7 de Setembro
O ministro Ricardo Lewandowski, do STF, encaminhou à PGR notícia crime contra Bolsonaro por prática dos crimes de peculato e prevaricação durante as manifestações do 7 de setembro. O encaminhamento foi feito baseado em notícia crime do deputado federal Israel Matos Batista (PSB-DF), que alega que Bolsonaro utilizou-se da festividade para desenvolver atividade político-partidária, com envolvimento direto de seus asseclas e partidários.
Os advogados da campanha de Lula-Alckmin disseram à imprensa, ainda na quarta (7), que pretendem acionar o Tribunal Superior Eleitoral contra Bolsonaro. Vão apontar abuso de poder econômico e político por parte do presidente sob a alegação de que ele está usando o evento do 7 de Setembro para fazer megacomício de campanha. Os advogados Eugênio Aragão e Cristiano Zanin Martins destacam que os discursos foram transmitidos ao vivo, inclusive por meio da estatal TV Brasil.
O deputado Batista diz que o presidente pediu votos, atacou o adversário, destacou pontos de seu programa de governo e afirmou que se for reeleito “levará para dentro das quatro linhas da Constituição todos aqueles que porventura estiverem fora delas”.
Na visão do parlamentar, o presidente teria se utilizado das prerrogativas do cargo que exerce para satisfazer interesses pessoais, familiares e eleitorais, nas celebrações realizadas em Brasília e no Rio de Janeiro.
Mais crimes de Bolsonaro
Havia expectativa de clima de golpismo no discurso e atitudes do presidente, como ocorreu em 2021, na mesma data. Como não houve ataques explícitos a ministros do STF ou às urnas eletrônicas, parte da sociedade ficou aliviada, como se fosse um favor do presidente. Mesmo assim, Bolsonaro não perdeu a oportunidade de degradar instituições das mais diversas formas e ameaçar “extirpar” adversários. O sequestro do Bicentenário da Independência, por si só, é um grave ataque à institucionalidade democrática.
Neste mesmo dia, o presidente pode ter cometido uma série de crimes eleitorais, que podem ser objetos de Ação de Investigação Judicial Eleitoral. Os crimes poderiam resultar na cassação do registro de candidatura ou do mandato, caso eleito e empossado.
O primeiro ponto ressaltado é a possível afronta à determinação constitucional de que a administração pública deve se pautar, entre outros, pelo princípio da impessoalidade (artigo 37 da Constituição).
Na legislação eleitoral, propriamente dita, Bolsonaro pode ser enquadrado, em especial, na parte que trata de abusos passíveis de desequilibrar a correlação de forças na disputa.
A Constituição determina em seu artigo 14 o estabelecimento de regras para conter “a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Foram distribuídos convites a servidores civis lotados nos ministérios para que comparecessem ao evento, o que pode configurar coação.
O presidente também teria cometido um delito ético ao trazer ao seu lado o empresário Luciano Hang, que é uma pessoa da sociedade civil, que se encontra sob investigação policial, sem respaldo para estar em uma posição de tanto destaque ao lado de convidados estrangeiros ofuscados por ele.
Há quem defenda que houve falta de compostura no coro chamado pelo presidente de ‘imbrochável’. O discurso da primeira-dama Michelle Bolsonaro durante o ato também foi descabido, pois ela não tem cargo de estado, ela não foi eleita e não tem titulação.
Teria havido ainda o possível enquadramento por conduta vedada aos agentes públicos em campanha (art. 73 da Lei 9.504/97), propaganda irregular e desvio de finalidade.
Afronta e impunidade
A Ação de Investigação Judicial Eleitoral movida pela campanha de Lula será conduzida pelo corregedor eleitoral do TSE, Benedito Gonçalves, que toma posse nesta quinta-feira (8). É improvável, porém, que haja decisão final antes das eleições.
O vice-procurador-geral Eleitoral, Paulo Gonet Branco, monitorou os eventos e avalia eventuais transgressões à lei. Branco foi designado para a função pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, criticado por atuar de forma alinhada aos interesses do Palácio do Planalto.
É muito improvável que o presidente venha a sofrer alguma sanção mais séria que vá além de multa ou até mesmo ter o seu horário eleitoral reduzido. Estas seriam medidas plausíveis para garantir algum pudor eleitoral.
Agora, impeachment por improbidade administrativa é algo que assume caráter político, mais do que técnico. Bolsonaro tem a maioria da Câmara e da mesa diretora sob seu controle, o que inviabiliza este tipo de movimentação política.
O que configura o uso da máquina pública é algo delicado de se definir, porque a linha divisória entre o que o presidente faz como chefe de Estado e o que faz como candidato é muito tênue, desde que esse dilema surgiu com a emenda da reeleição. Se Bolsonaro desce do palanque oficial, por exemplo, e faz o discurso eleitoral em outro palco, a situação jurídica se complica.
Bolsonaro sabe perfeitamente de tudo isso e planeja com rigor suas atitudes. O abuso explícito é feito para afrontar a Justiça Eleitoral. Caso haja alguma decisão mais drástica contra sua candidatura, isso fortalece a reação de sua base de apoio e aumento o engajamento em redes.
Após o desfile militar em uma parte da Esplanada, Bolsonaro tirou a faixa presidencial, subiu no trio elétrico, em uma manifestação organizada por seus apoiadores na Esplanada dos Ministérios, e pediu para irem votar, criticou seus adversários e falou especificamente sobre o dia da eleição (2 de outubro). Com isso, se mantém no limite para criar dubiedade aos tribunais, de acordo com a opinião de alguns.
Outro aspecto diz respeito as palavras usadas. Em vez de pedir voto, pediu para as pessoas irem votar. Em vez de atacar diretamente o adversário, fala em luta entre o bem e o mal, termos subjetivos, embora esteja falando implicitamente de Lula.
“Sabemos que temos pela frente uma luta do bem contra o mal” disse Bolsonaro. “O mal que perdurou por 14 anos em nosso país. Que quase quebrou a nossa pátria. E que agora deseja voltar à cena do crime. Não voltarão. O povo está do nosso lado.”
Pela lei, Bolsonaro também tem que declarar até o próximo dia 13 (data limite para que todos os candidatos façam a prestação de contas parcial das eleições) todos os gastos para a realização dos atos eleitorais deste 7 de Setembro, incluindo a informação de eventuais custos bancados por terceiros, que se enquadram como doação de campanha.
Nesta quarta, o ministro Raul Araújo, do TSE, negou uma liminar (decisão urgente e provisória), pedida pelo PDT, para que o PL, partido do presidente, antecipasse a abertura das contas e demonstrasse gastos eventualmente realizados com o 7 de Setembro.
Em 2018, Bolsonaro omitiu da Justiça Eleitoral, sem que tenha sido punido por isso, diversos gastos de sua campanha, incluindo os detalhes de viagens que fez a pelo menos 16 cidades de 7 estados, onde ele, sua comitiva e aliados participaram de carreatas e comícios em caminhões de som.
(por Cezar Xavier)