Diana Conrado, do PCdoB, é 1ª mulher trans a compor gestão da Prefeitura do Rio
A cidade do Rio de Janeiro passou a ter, nesta semana, a primeira pessoa trans a fazer parte do quadro de gestores da prefeitura. Essa tarefa caberá à comunista Diana Conrado, nomeada para comandar a Coordenadoria de Diversidade Sexual (Ceds).
Em meio a um cenário político nacional e internacionalmente marcado pela ascensão da extrema-direita e, com ela, toda ordem de preconceito, discursos de ódio e violência contra populações minorizadas, a nomeação é mais um avanço rumo ao fortalecimento dessa frente de lutas.
Mulher negra transsexual, oriunda da classe trabalhadora, Diana é advogada formada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro, pesquisadora, ativista dos direitos humanos e LGBTs e pós-graduanda pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp) da Uerj.
À frente da coordenadoria, ela diz que há dois grandes desafios. “Um deles é não permitir e lutar para que não haja retrocessos nas políticas públicas para a população LGBT na cidade do Rio, tendo em vista que nós estamos num momento um pouco nebuloso ainda. E também vivemos um cenário onde vemos alguns retrocessos mundialmente no que se refere a direitos e avanços que a comunidade já tinha adquirido”, aponta.
Diana lembra de recuos recentes advindos da mudança da política de checagem e mediação de conteúdo anunciada pela Meta — dona do Facebook e Instagram, entre outras redes —, bem como o fim das políticas de diversidade, equidade e inclusão tanto por parte desta empresa como da Amazon, Walmart e McDonalds, entre outras gigantes que atuam em vários países, inclusive, o Brasil. Tal posicionamento revela um alinhamento com o ideário extremista de Donald Trump, que assume a Casa Branca no dia 20.
“Temos visto retrocessos em série, por exemplo, das políticas de inclusão e da garantia de proteção a essa população por grandes empresas, que estão abandonando seus programas de inclusão e deixando as pessoas LGBTs mais expostas e mais vulnerabilizadas na internet, o que é uma situação bastante crítica”, lamenta Diana.
Ela completa dizendo que “infelizmente, iniciativas como essas podem gerar outros impactos para além da lógica corporativa dessas grandes empresas, que deveriam ser um exemplo positivo para outras, mas estão seguindo por um caminho bem tortuoso no que se refere à política de inclusão para a população LGBT”.
Outro desafio colocado, explica, é avançar nas políticas voltadas a essa população. “O que queremos é não só defender e proteger as políticas públicas já existentes, mas também tentar ampliá-las para garantir um impacto positivo na vida da população LGBT carioca, que ainda é muito carente de políticas públicas específicas e desse olhar de urgência, haja visto que essa população ainda luta por direitos básicos que já estão garantidos para a população como um todo. Nosso segmento ainda encontra muitas barreiras institucionais e sociais para gozar de seus direitos. Então, precisa de políticas públicas que mitiguem essas dificuldades”.
Trajetória
Diana lembra que sua trajetória no ativismo LGBT começou “mais a partir de uma necessidade do que de um desejo”. Ela acrescenta que na condição de “jovem trans, negra, com poucos recursos, com uma família que não me apoiava, eu me aproximei do ativismo social organizado. E nesse ambiente eu fui acolhida”.
Ela explica que nesse meio entendeu que “poderia lutar não só por mim, mas pela coletividade, por todas essas pessoas transsexuais e travestis que faziam à época e ainda fazem parte de um grupo minorizado que não tem acesso às coisas mais básicas: saúde, trabalho, moradia, às vezes alimentação, direito à sua personalidade, à sua identidade, direito ao seu nome, a fazer escolhas sobre o seu próprio corpo”.
Foi assim que, em 2015, começou a se aproximar de algumas organizações sociais, especialmente o PreparaNem, projeto que oferecia cursinho preparatório para o Enem voltado a pessoas LGBTs na cidade do Rio. Também participou do projeto Damas, coordenado pela prefeitura, que promoveu a formação profissional para travestis e transexuais visando a reinserção social desses públicos.
Além disso, conta que passou a fazer parte do Fórum Nacional de Travestis e Transsexuais Pretas e Pretos em âmbito nacional, do Grupo pela Vida e do Grupo de Diversidade Niterói, entre outras iniciativas.
“A partir dessas experiências, fui me conectando com ativistas que me ensinaram muito, comecei a me organizar nessas instituições e fui convidada para atuar em âmbito estadual e nacional”, completa.
Mais adiante, foi para a Uerj, onde cursou Direito. “O ativismo social também contribuiu muito para a minha decisão de ser advogada porque eu queria ter o poder de conhecer os direitos que a gente possuía e como usá-los, como reivindicá-los. Porque, em tese, os direitos seriam iguais para todos, mas na prática nós vemos constantes violações desses direitos”.
Em 2023, por convite da deputada estadual do Rio, Dani Balbi — da qual foi assessora parlamentar —, Diana passou a integrar o PCdoB. “Na minha atuação no gabinete dela, coordenei o Grupo de Trabalho LGBT. E nós conseguimos fazer bastante coisa, apresentar diversos projetos para essa população, estabelecer uma ótima relação com os movimentos sociais e, assim, entender melhor as demandas dessa população, que é tão diversa”.
Nesse processo, uma das missões do mandato é garantir reserva de vagas para pessoas trans nas universidades. “Nessa luta, já tivemos êxito em algumas instituições, como a Universidade Federal Fluminense (UFF), a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) e na Universidade Federal Rural (UFRRJ)”.
Pelas redes sociais, Dani Balbi comemorou a nomeação: “Sua trajetória como ativista e sua luta incansável pelos direitos LGBTQIAP+ são inspiradoras e merecem todo o reconhecimento. É uma honra ter contado com sua dedicação e competência no nosso gabinete, onde sempre trabalhou com compromisso e sensibilidade em defesa da diversidade e da igualdade”.
Sobre a indicação do partido para que ela ocupasse o posto, Diana acredita que resulta dessa rica bagagem adquirida tanto no ativismo como no meio acadêmico e parlamentar. O partido no RJ também se manifestou, destacando que “sua contribuição para a cidade maravilhosa será fundamental na luta por vida digna para a população LGBTQPN+ do Rio”.
Diana conclui enfatizando: “Tenho um compromisso muito genuíno com o avanço das políticas para a população LGBT e com o impacto positivo que o poder público pode ter para essa população, para mudar a vida dessas pessoas”.