Butantan pede registro de vacina contra dengue: “Um avanço para a ciência do país”
O Instituto Butantan entregou nesta segunda-feira (16) à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) os documentos para a aprovação de sua vacina contra dengue, a primeira do mundo em uma única dose. Se aprovada, o instituto terá condições de produzir 100 milhões de doses para o Ministério da Saúde pelos próximos três anos.
Os três pacotes de informações sobre o imunizante encaminhados à Anvisa compõem a última leva de documentos necessários ao processo de autorização para a fabricação da chamada Butantan-DV.
“É dos maiores avanços da saúde e da ciência na história do país e uma enorme conquista em nível internacional. Que o Instituto Butantan possa contribuir com a primeira vacina do mundo em dose única contra a dengue mostra que vale a pena investir na pesquisa feita no Brasil e no desenvolvimento interno de imunobiológicos”, diz Esper Kallás, diretor do Butantan. “Vamos aguardar e respeitar todos os procedimentos da Anvisa, um órgão de altíssima competência. Mas estamos confiantes nos resultados que virão”, continua.
Os ensaios clínicos envolvendo os testes foram concluídos em junho deste ano, com o último participante completando 5 anos de acompanhamento. Na primeira fase, a vacina mostrou 79,6% de eficácia na prevenção de casos sintomáticos de dengue. Na terceira etapa dos estudos, essa eficácia aumentou para 89% na proteção contra dengue grave e sintomática, além de garantir segurança e eficácia prolongadas por até cinco anos.
A Butantan-DV é tetravalente – com proteção contra os 4 tipos da doença – e poderá ser aplicada em pessoas entre 2 anos de idade e 60 anos incompletos. Com essa iniciativa, o Instituto, avalia Kallás, atingiu um marco muito importante na ciência de produtos médicos no país.
Os testes envolveram uma faixa mais ampla de idade que todas as vacinas que foram estudadas até hoje, informa. “Foi testada entre crianças com 2 anos completos até adultos com 60 anos incompletos”, explica o professor. Ele acrescenta que “já há dados de segurança de indução de resposta”, o que “a gente chama de resposta imune e proteção contra a dengue, nessa faixa etária bem ampla da população”.
Os primeiros estudos para produção da vacina contra a dengue no Brasil tiveram início no final da década de 1990, se consolidando a partir dos anos 2000, com uma inovação que surgiu em um laboratório nos Estados Unidos, explica o diretor do Butantan.
“Quando ainda era um protótipo”, prossegue Kallás, “a tecnologia foi trazida para o Butantan e vários processos de desenvolvimento foram estabelecidos pelo Instituto”. Foi “aqui no Brasil que houve o grande investimento através de Fapesp, Governo do Estado de SP, BNDES e Ministério da Saúde”, para “a implementação dos estudos de avaliação clínica dessa vacina”, explica o diretor do Instituto. “O financiamento foi fundamentalmente nacional”, destaca.
Kallás destacou ainda que vem mantendo tratativas com o Ministério da Saúde sobre o processo de desenvolvimento da vacina e que há interesse em viabilizar o produto, mas ainda há alguns percalços. “É óbvio que há interesse (pelo imunizante). Inclusive falas da própria ministra da Saúde salientando a importância do desenvolvimento da vacina do Butantan”, diz.
“A gente vem discutindo com eles (representantes da pasta) de que maneira a vacina pode ser utilizada. Mas ainda tem um caminho para andar”, ressalta. “O que a gente imagina é que a gente vai consolidar o combate à dengue com o uso da vacina no país nos próximos anos”.
A fábrica de imunizantes, localizada no Centro Bioindustrial do Butantan, passou por uma inspeção e teve suas instalações aprovadas pela Anvisa. Caso receba autorização para a produção da vacina, o Butantan deverá encaminhar um pedido de autorização de preço à Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos.
O próximo passo será a análise pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do Sistema Único de Saúde (Conitec), que avaliará a integração do imunizante ao Sistema Único de Saúde. Nessa etapa, serão verificados aspectos como a redução de internações e o absenteísmo no trabalho, além dos benefícios e riscos a longo prazo para a população brasileira.
Em 2024, os casos de dengue mais do que triplicaram no país. De acordo com o Ministério da Saúde, até 7 de outubro o Brasil registrou 6,5 milhões de prováveis incidências da doença. O imunizante é uma resposta importante no enfrentamento do problema, hoje um desafio para as autoridades. E estudos recentes indicam que o cenário pode se agravar devido as mudanças climáticas, com anos cada vez mais quentes.
O Brasil já tem um imunizante disponível contra a dengue, a Qdenga, que começou a ser aplicado este ano, se tornando o primeiro país no mundo a oferecer a vacina na rede pública. No entanto, ela é produzida no exterior, precisa ser ministrada em dose dupla e, com isso, o volume entregue pela farmacêutica só atendia 10% da demanda nacional.
Fonte: Página 8