Desafios cruciais para o movimento sindical brasileiro
O movimento sindical brasileiro vive um momento de grandes dificuldades ao mesmo tempo em que se defronta com desafios inéditos.
O golpe de 2016, que depôs Dilma Rousseff e conduziu o usurpador Michel Temer à Presidência, deixou um rastro de profundos retrocessos na legislação trabalhista, sindical e previdenciária.
A reforma trabalhista, que vigora desde novembro de 2017, subtraiu direitos, ampliou a precarização, alongou a jornada de trabalho e foi agravada pela lei que permitiu a terceirização das chamadas atividades-fim.
Para debilitar a capacidade de reação das trabalhadoras e trabalhadores, a reforma aboliu a Contribuição Sindical, principal fonte de financiamento das ações sindicais. A medida afetou com maior dramaticidade as centrais sindicais, que amargaram uma queda de receita superior a 90%.
O chefe da extrema-direita nativa, Jair Bolsonaro, fez novas investidas contra a classe trabalhadora e promoveu uma reforma da Previdência que reduziu o valor das aposentadorias e acabou com a aposentadoria por tempo de contribuição, instituindo a idade mínima.
O resultado dessa agenda reacionária, associada à manipulação das novas tecnologias pelas grandes corporações e à ofensiva ideológica neoliberal, foi uma desestruturação ainda maior do mercado de trabalho, crescimento da pejotização e da uberização, enfraquecimento da consciência e identidade classista e fragmentação da nossa classe trabalhadora.
Tudo isso ajuda a explicar a expressiva queda da taxa de sindicalização verificada ao longo dos últimos anos, fato que contribuiu significativamente para ampliar as dificuldades de mobilização das bases do movimento sindical para a luta em defesa de suas conquistas e direitos.
Segundo as estatísticas do IBGE, em 2023, dos 100,7 milhões de pessoas ocupadas no país, 8,4% (8,4 milhões) eram associadas aos sindicatos. Esse foi o menor contingente e o menor percentual da série histórica iniciada em 2012, quando havia 14,4 milhões de trabalhadores sindicalizados (16,1%).
Ou seja, observa-se uma queda não só relativa, mas também absoluta, no número dos trabalhadores e trabalhadoras associadas às entidades, o que caracteriza uma crise de representatividade que requer uma reflexão mais profunda e autocrítica do próprio movimento para ser compreendida e superada.
A eleição de Lula no final de 2022 alterou o cenário político nacional, interrompendo a agenda reacionária e evitando uma segunda vitória de Jair Bolsonaro, que poderia se desdobrar na instalação de uma ditadura neofascista aberta, como sugere a empreitada golpista que culminou no 8 de janeiro e planejava o assassinato do presidente, do vice Alckmin e do ministro Alexandre Moraes, do STF.
Mas, é notório que a derrota da extrema direita nas eleições presidenciais não foi suficiente para alterar significativamente a correlação de forças políticas no país, uma vez que as forças conservadoras foram vitoriosas no Parlamento e contam com maioria no Congresso Nacional, onde a esquerda é minoritária e as forças aliadas às elites empresariais e latifundiárias constituem inequívoca maioria.
Desse modo, é tarefa fundamental a remoção do entulho reacionário herdado dos governos Temer e Bolsonaro e também o governo Lula acenou para a necessidade de revisão das reformas trabalhista e previdenciária, mas no Congresso a pauta é outra.
O governo federal também quer implementar a regulamentação do trabalho via plataformas digitais, onde o grau de exploração dos trabalhadores é elevado ao extremo e a jornada diária média ultrapassa 12 horas, mas a iniciativa, conduzida pelo Ministério do Trabalho, não se materializa por causa da reação das forças conservadoras.
Esses e outros temas do interesse da classe trabalhadora, como a reforma agrária, não avançam porque encontram forte oposição das classes dominantes, do Parlamento, além da hostilidade da maioria dos ministros do STF ao Direito do Trabalho e a decisões do TST sobre pejotização.
Essas mesmas forças, capitaneadas pelo capital financeiro e pelas big techs, bloqueiam qualquer mudança significativa nas políticas macroeconômicas, sujeitando o país a taxas de juros exorbitantes e a ajustes fiscais que sacrificam os investimentos públicos e a seguridade social enquanto se voltam furiosamente contra mais impostos para os ricaços e o cassino financeiro.
A verdade, mascarada pela ideologia dominante, é que interesses poderosos, no Brasil e no exterior, conspiram contra o êxito desta terceira gestão do líder petista, querem impor algemas e limites ao Palácio do Planalto enquanto alimentam as perspectivas e ações da extrema direita.
Sem quebrar a resistência das classes dominantes não será possível caminhar na direção de um novo projeto nacional de desenvolvimento ansiado pelas forças progressistas e essencial para o nosso povo.
Vivemos no mundo um momento histórico marcado pela decomposição da ordem capitalista mundial hegemonizada pelos EUA e a radicalização das contradições, das lutas de classes, das tensões internacionais e da polarização social e política, que não por acaso acompanha o processo de concentração e centralização do capital.
A tudo isto se soma a crise climática, que avança em meio à desordem global, demanda respostas imediatas, mas não tem perspectiva realista de solução nos marcos do sistema capitalista.
Em meio a esta conturbada conjuntura, presenciamos o renascimento e avanço do neofascismo, que constitui sem sombras de dúvidas o maior risco para a democracia e os direitos dos povos em todo o mundo e no Brasil é liderado pelo Clã Bolsonaro.
Diante deste quadro adverso, despertar a consciência política classista e mobilizar amplamente os trabalhadores e trabalhadoras para lutar e mudar a realidade, a partir do local de trabalho, é o principal desafio do movimento sindical e do conjunto das forças democráticas e progressistas na presente conjuntura.
Nesse sentido, é preciso sublinhar a relevância da luta pelo fim da desumana e extenuante escala 6X1 e pela redução da jornada de trabalho sem redução de salários para 36 horas semanais, aliada à isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil e maior taxação dos mais ricos.
São lutas que se resolvem no plano político e têm grande potencial educativo, podendo contribuir consideravelmente para a elevação da consciência e do grau de intervenção política da nossa classe trabalhadora.
A bandeira da redução da jornada de trabalho tem um sentido estratégico não só para a classe trabalhadora, como igualmente para a economia e para o conjunto da sociedade humana.
O anseio histórico dos assalariados por mais tempo livre é também uma resposta positiva ao extraordinário avanço da produtividade do trabalho, traduzida na robotização e na disseminação da chamada Inteligência Artificial, que reduzem o tempo socialmente necessário para a produção de mercadorias e estão revolucionando o mercado de trabalho.
O obstáculo ao fim da desumana escala 6×1 também é o mesmo que se opõe a outros projetos de interesse da classe trabalhadora: a hegemonia dos interesses capitalistas na Câmara Federal e no Senado.
É dever elementar do sindicalismo classista levar à classe trabalhadora a consciência sobre a primazia da política nas lutas que se desenrolam em nossa sociedade e isto passa por interligar as lutas concretas do cotidiano com a luta política mais geral em defesa de um novo projeto de desenvolvimento e políticas macroeconômicas (monetária, fiscal e cambial) orientadas para o pleno emprego, o crescimento sustentável da economia e o bem-estar social.
É preciso ensinar à nossa juventude trabalhadora que para pôr fim à escala 6×1 será preciso vencer a resistência das forças conservadoras e alterar a composição do Congresso Nacional, o que realça para 2026 a necessidade de ingressar na campanha política para eleger deputados e senadores comprometidos com os interesses do povo e alinhados com a pauta da classe trabalhadora.
Os objetivos mais cruciais que hoje nos desafiam são igualmente de natureza política: garantir o êxito do governo Lula, derrotar a extrema direita nas eleições presidenciais e alterar a correlação de forças no Congresso Nacional, ampliando o número de parlamentares comprometidos com a democracia, a soberania nacional e os direitos sociais.
De outro modo, não conseguiremos avançar na direção dos nossos objetivos históricos, e do socialismo, nem evitar novos retrocessos e ofensivas contra a democracia, a soberania nacional e os direitos sociais.
*Adilson Araújo é bancário e publicitário; membro Comitê Central do PCdoB e da CPN; presidente nacional da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).