16º Congresso do PCdoB: ‘Contradição principal é entre imperialismo e projeto nacional’

“Estamos diante de uma transição estrutural na ordem mundial, com o enfraquecimento relativo dos Estados Unidos e o surgimento de novos polos de poder, como a China.” Essa análise, unânime, foi a tônica do encontro organizado pela Fundação Maurício Grabois, no Rio de Janeiro, nesta segunda-feira (4), com a missão de aprofundar o Projeto de Resolução do Partido, rumo ao 16º Congresso. O painel foi realizado na sede da Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro (SIAERJ), pelos professores Elias Jabbour (UERJ), Ana Penido (UFF) e Luis Fernandes (PUC-Rio/MCTI), sob a mediação de Conceição Cassano, da direção nacional do PCdoB.
Com o tema “Mundo em Transição”, o evento mobilizou intelectuais, militantes e simpatizantes para discutir o cenário geopolítico global, com foco no declínio da hegemonia estadunidense, na ascensão da China e no papel estratégico do Brasil. O debate foi transmitido pela TV Grabois e tem a missão de aprofundar os temas propostos no Projeto de Resolução do Partido, rumo ao 16º Congresso, que será realizado em Brasília.
Capitalismo em crise e o socialismo chinês
O professor Elias Jabbour iniciou sua fala contextualizando o capitalismo contemporâneo, apontando que a crise de 2007-2008 foi a primeira grande falência do capitalismo neoliberal, contrariando a promessa de um mundo pós-soviético. “Ela revelou a farsa do liberalismo, com crises financeiras cada vez mais recorrentes e profundas, aumentando desigualdades dentro e entre países”, afirmou Jabbour.
Sobre a China, o professor defendeu que, desde 1978, o país reinventa o socialismo por meio de instituições de mercado. “A China cria uma formação econômico-social que entrega maior produtividade e bem-estar”, declarou. Jabbour também analisou a política de Donald Trump, argumentando que ela não foi um ponto fora da curva, mas sim a continuidade e a ruptura de um processo iniciado em 2007-2008, que intensificou a guerra tecnológica contra a China, mas sem sucesso em contê-la.

Hegemonia cultural e desafios para a defesa nacional
Ana Penido, pesquisadora em defesa e segurança, trouxe reflexões sobre a transição hegemônica. Ela destacou que, apesar da transição econômica e tecnológica favorecer a China, a hegemonia cultural dos Estados Unidos, baseada no modo de vida individualista, ainda inspira globalmente. “Cada compra de armamentos americanos por outros países dá sobrevida à sua economia, mesmo que isso não garanta vitória militar”, explicou.
Penido enfatizou que a política de defesa nacional brasileira deve garantir a capacidade de dizer “não” a potências mais fortes. Ela criticou os laços estreitos entre as elites militares brasileiras e os EUA/OTAN, que, segundo ela, são um obstáculo à soberania. A pesquisadora também abordou a articulação da extrema direita na América Latina, observando que ela constrói “Internacionais” com respostas rápidas, enquanto os governos de centro-esquerda na região carecem dessa agilidade.
Multipolaridade e o declínio da ordem unipolar
Luis Fernandes, vice-ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação, situou o debate no conceito de “mundo em transição”, que o PCdoB já vinha defendendo desde os anos 1990. Ele afirmou que estamos vivendo o desenlace de uma transição na ordem mundial, com o enfraquecimento relativo dos EUA. Segundo Fernandes, “não caminhamos para uma nova hegemonia, mas para um balanço de poder global sem uma potência dominante”.
O professor foi enfático ao denunciar a intervenção explícita dos EUA no Brasil, “tentando pressionar o Judiciário brasileiro a encerrar processos”. Ele classificou essa ação como “imperialismo clássico: a extensão da autoridade de um Estado além de suas fronteiras, apoiada por quintas-colunas internas que se apropriam da bandeira nacional”.
Questões do público e orientações futuras
O debate foi enriquecido com as perguntas da plateia e jogaram luz sobre temas como a narrativa da extrema direita contra o Brasil, a persistência da hegemonia cultural americana, as armas nucleares e sobre uma questão teórica importante: qual contradição principal surge da situação internacional atual.
Em resposta, Elias Jabbour concordou que a contradição principal é entre o imperialismo e os projetos nacionais autônomos. Ele afirmou que a China, com sua “formação socialista dentro do capitalismo global”, promove uma globalização alternativa. Ana Penido destacou a importância de pensar regionalmente para construir um polo geopolítico e ressaltou que o Brasil deve estudar exemplos como o do Irã, que construiu capacidade industrial-militar sob sanções. Já Luis Fernandes defendeu a necessidade de reconstruir um projeto nacional sobre novas bases tecnológicas e explorar as sinergias da multipolaridade.
Conceição Cassano encerrou o evento reforçando que o debate oferece orientações políticas para o 16º Congresso Nacional do Partido Comunista do Brasil, “fortalecendo a consciência nacional para enfrentar os desafios geopolíticos e construir um projeto de desenvolvimento autônomo, alinhado com o Sul Global”, finalizou.