O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), abraçou o bolsonarismo com a cara e a coragem que lhe faltam na gestão da maior cidade da América Latina. A primeira demonstração de vassalagem ocorreu em fevereiro, quando Nunes participou do ato organizado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na Avenida Paulista.

Foi uma estreia tímida. O prefeito não discursou nem pareceu à vontade. Mas alguns de seus interlocutores atribuem seu crescimento nas últimas pesquisas ao apoio mais explícito que recebeu de Bolsonaro. Mesmo ciente de que, ao lado das intenções de voto, o combo bolsonarista inclui o risco de ser associado ao que há de mais fascista na política brasileira, Nunes pagou para ver.

Para usar um linguajar típico do ex-presidente, a paquera virou namoro – ou talvez um pouco mais. Em entrevista ao jornal O Globo, publicada nesta quinta-feira (9), Nunes pôs a mão no fogo para defender o ideário bolsonarista. Embora se autodeclare “de centro”, suas falas mostram um político mais alinhado do que nunca à extrema-direita.

“Eu sempre falei e volto a dizer: o apoio do presidente Bolsonaro é muito importante. A gente vai ter o centro e a direita juntos para vencer a extrema esquerda”, diz ele, ensaiando um discurso eleitoral do medo contra seu principal concorrente na eleição de outubro, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL). Para Nunes, Bolsonaro é moderado, mas Boulos é extremista.

Retórica à parte, esta não foi a parte mais constrangedora da entrevista. Nunes disse não ter uma “relação pessoal próxima” com o ex-presidente. “Assim, conheço o Bolsonaro, já fui na casa dele, ele já foi na minha… Mas a gente se fala? Não.”

A rigor, nem é preciso que se falem. Nunes diz que Bolsonaro é perseguido pela Justiça: “Falaram que ele importunou a baleia. Ele foi chamado, depôs, e concluíram que não importunou. Depois ele foi na Embaixada e disseram que foi para fugir. Mais um caso que acabou arquivado. Acusam ele de ter roubado os móveis (do Alvorada) e, depois, acharam os móveis. Isso é o quê? Se coloque no lugar da pessoa, independente de ser o presidente Bolsonaro”. Entrevistador e entrevistado omitiram que, ao lado desses arquivamentos, houve condenações – tanto que Bolsonaro está inelegível por oito anos.

O prefeito paulistano relativiza também os atos golpistas de 8 de Janeiro. Para Nunes, tudo não passou de “uma depredação”, “um ato de vandalismo”. Nenhum pio sobre os alvos dos manifestantes ou o risco à democracia. Não à toa, o prefeito neobolsonarista já defende anistia aos envolvidos com argumentos risíveis.

“Acho que está muito longe de aquilo ser um golpe”, declara. “Tinha pessoas em situação de rua e idosos. Tem um rapaz que foi preso que tinha uma empresa, está muito longe de ser um golpista”.  Na visão de Nunes, idosos e empresários não cometem crimes.

Ele também acha que o presidente da República é quem deve procurar o prefeito, e não o contrário. De exemplo, cita seus primeiros meses à frente da Prefeitura de São Paulo, após a morte do titular, Bruno Covas (PSDB). Diz Nunes: “Bruno faleceu dia 16 de maio (de 2021). Em julho, o presidente Bolsonaro me ligou, convidando o prefeito da maior cidade para ele conhecer. Eu não tive nenhum convite ainda do presidente Lula para ter um encontro com ele”. Bolsonaro já tem um candidato para chamar de seu em São Paulo.