A nova ofensiva conservadora e a disputa pelo imaginário brasileiro
Contribuição ao 16º Congresso do Partido Comunista do Brasil – PCdoB
Um projeto de reconfiguração do pensamento crítico
O Brasil vive uma profunda transformação cultural impulsionada pela extrema-direita, que tem buscado remodelar as formas como a sociedade interpreta sua história, valores e identidade. Essa mudança não ocorre de forma espontânea: trata-se de uma estratégia articulada, que passa pela reformulação de conteúdos escolares, pela censura simbólica às artes e pela tentativa de esvaziar o pensamento crítico nas instituições de ensino.
Um exemplo claro disso é o esvaziamento das disciplinas de Humanidades, como Filosofia e Sociologia, especialmente no ensino médio público. Essa redução não é apenas técnica — é política. Ao enfraquecer o estudo sobre conflitos sociais, lutas populares e estruturas de poder, favorece- se a imposição de uma narrativa simplificada, moralista e positivista da realidade.
Essa tentativa de reescrever a memória coletiva também se manifesta na exaltação de personagens ligados ao autoritarismo, enquanto silencia ou despreza os movimentos sociais que lutaram por direitos e democracia. O que está em jogo é uma disputa por quem deve ser lembrado como protagonista da nossa história.
Um ataque orquestrado ao saber científico
Além da reinterpretação do passado, a extrema-direita vem promovendo um verdadeiro ataque à ciência e à racionalidade. Durante a pandemia, esse movimento se evidenciou com a propagação deliberada de desinformação sobre vacinas e tratamentos não comprovados. Essa postura, travestida de “liberdade de opinião”, foi responsável por impactos reais e trágicos.
Mas a negação da ciência vai além do campo da saúde. Trata-se de um método para descredibilizar qualquer conhecimento que desafie a ordem estabelecida ou que incentive a população a pensar de forma crítica e autônoma. A desinformação se espalha por redes digitais em uma velocidade e escala impressionantes, operando como parte de uma engenharia comunicacional voltada à manipulação do senso comum.
A ponte entre conservadorismo cultural e interesses econômicos globais
Não é coincidência que essa ofensiva cultural esteja alinhada com os interesses do capital financeiro, tanto nacional quanto internacional. Ao apresentar o ultraliberalismo como caminho inevitável para o progresso, o discurso conservador ajuda a despolitizar a economia e desmobilizar a resistência popular.
A substituição da análise estrutural da desigualdade por histórias de “superação individual” e figuras “heroicas” legitima a precarização do trabalho, o enfraquecimento de políticas públicas e a concentração de renda. Dessa forma, o projeto conservador-cultural torna-se uma ferramenta essencial para a manutenção do sistema financeiro global, ao mesmo tempo em que desarma qualquer resistência crítica.
A batalha nas redes e o papel estratégico da inteligência artificial
A extrema-direita compreendeu cedo o poder das redes sociais como campo de batalha ideológica. Com o uso cada vez mais sofisticado de tecnologias como inteligência artificial, robôs de engajamento e manipulação de vídeos (deepfakes), tem sido capaz de pautar o debate público e moldar percepções de maneira altamente eficiente.
Diante disso, os setores progressistas precisam se atualizar com urgência. Não basta mais reagir. É necessário investir em formação tecnológica, produção de conteúdo estratégico e presença coordenada nos meios digitais. A inteligência artificial pode — e deve — ser usada para ampliar o alcance das ideias progressistas, desmascarar mentiras e fortalecer vínculos comunitários em ambientes digitais.
Importante destacar, que o recente o uso estratégico da inteligência artificial (IA) e das redes sociais tem ampliado a capacidade da esquerda de disputar narrativas e mobilizar consciências em torno da justiça tributária. Por meio de conteúdos acessíveis e engajantes, produzidos com apoio de tecnologias como IA generativa, cresce a denúncia de um sistema fiscal e regressivo, no qual os mais pobres pagam proporcionalmente mais impostos enquanto grandes fortunas seguem isentas. A justiça tributária, nesse contexto, é apresentada como ferramenta fundamental para enfrentar as desigualdades e financiar políticas públicas com equidade.
Dito isso, observa-se como o uso da inteligência artificial (IA) é eficiente e eficaz na luta ideológica, podendo ser utilizado de forma mais efetiva pelo campo democrático-popular e progressista, frente ao avanço da extrema direita.
Caminhos para uma resposta cultural à altura
Diante desse cenário, algumas estratégias se fazem urgentes e viáveis:
Capacitação tecnológica popular: Criar núcleos de formação em inteligência artificial e comunicação digital voltados para militantes, professores e jovens ativistas.
Redes de verificação comunitária: Desenvolver plataformas colaborativas para checagem de informações, integradas a aplicativos amplamente usados pela população.
Criação de conteúdos culturais engajados: Investir em podcasts, séries, quadrinhos e jogos que recuperem a memória das lutas populares e inspirem novos horizontes de transformação social.
Reocupação dos espaços educativos e culturais: Realizar eventos populares que unam arte, ciência e política de forma acessível e participativa.
Soberania digital e regulação das plataformas: Lutar por políticas públicas que garantam transparência algorítmica, tributação das big techs e infraestrutura digital pública voltada ao interesse coletivo.
Considerações finais
A disputa em curso no Brasil não se resume à arena institucional e/ou eleitoral. É uma luta simbólica, cultural e ideológica, que se trava no cotidiano, na escola, nas telas e nas ruas. A extrema-direita oferece ilusões simples e perigosas, sustentadas pela manipulação do medo e pela despolitização da vida.
Ao campo popular e democrático cabe a tarefa histórica de reencantar o futuro — com justiça social, soberania, cultura e ciência. Para isso, é necessário ousadia política, criatividade estratégica e enraizamento popular. O PCdoB, com sua tradição de organização, formação e inovação, pode e deve ser protagonista nesse processo.
Vencer essa disputa é mais do que derrotar a extrema-direita: é reconstruir o Brasil com o povo e para o povo, num projeto socialista, democrático e profundamente enraizado na realidade brasileira.
É hora de reocupar o imaginário popular com narrativas que valorizem a solidariedade, a justiça social, a soberania e a democracia. Para isso, precisamos combinar tecnologia, memória histórica e ação coletiva. Só assim poderemos frear o avanço da barbárie e reconstruir, com o povo e para o povo, um novo horizonte de futuro.
*Bacharel em Direito e Graduado em Gestão Pública. Membro do Comitê Municipal de PCdoB de Belo Horizonte. Assessor do Vereador Edmar Branco – PCdoB/BH