Jô Oliveira, voz plural da periferia, lidera o ranking de vereadores de Campina Grande (PB)

Campina Grande, conhecida como o “Vale do Silício brasileiro” por seu forte polo tecnológico, vive hoje um momento político singular. Em meio a um cenário, tradições dominadas por forças conservadoras — onde nomes como Haddad e Dilma sequer conquistaram votos significativos — uma mulher negra, filha de trabalhadora doméstica, rompe barreiras e se consolida como a parlamentar mais atuante da cidade. Jô Oliveira (PCdoB) não foi apenas a primeira mulher negra eleita na história do município, pois, em 2024, tornou-se a vereadora mais votada entre os 23 parlamentares da Câmara Municipal — um feito iniciado para a esquerda local.
Um levantamento recente do portal Polêmica Paraíba , que analisou a atuação dos vereadores no segundo trimestre de 2025, confirmou o protagonismo de Jô Oliveira: ela liderou o ranking com impressionantes 9,79 pontos , à frente de nomes como Sargento Wellington Cobra (PSB), com 9,48, e Dinho Papa Léguas (PSDB), com 9,14. O índice leva em conta produtividade legislativa, frequência nas sessões e impacto social das propostas.
Com 226 questões apresentadas , sendo 33 Projetos de Lei Ordinária, e 23 iniciativas voltadas às áreas sociais — como saúde, educação, combate à pobreza e direitos da primeira infância —, Jô tem transformado sua bancada em uma ponte direta entre a população histórica e o poder institucional.
“Chegar na Câmara é não chegar só”
Em entrevista, Jô Oliveira destacou que seu mandato é, por definição, coletivo. “A gente não chega só”, afirma. “Toda ação, todo projeto, toda audiência pública é feita com quem está na ponta. Com as mães de crianças atípicas, com as trabalhadoras domésticas, com os conselhos de saúde, com as ONGs ambientais.”
Um exemplo emblemático, segundo ela, foi uma visita recente a um local onde será construída uma nova barragem. Em vez de ir sozinho, como seria comum, eu articulei a presença de escolas municipais e estaduais, comunidades afetadas, entidades ambientais e órgãos públicos. “Foi um momento de escuta ativa, de diálogo real. Não se trata de ir lá para ‘mostrar serviço’. Trata-se de construir com a cidade.”
Esse modelo de atuação, baseado na participação popular e na pluralidade , tem sido a marca registrada do mandato. Jô preside a Comissão de Orçamento e Finanças da Câmara, uma carga estratégica, e tem usado a tribuna para promover audiências públicas, sessões especiais e tribunas livres — espaços onde movimentos sociais, muitas vezes invisibilizados, têm voz.
“É a primeira vez que entra na Câmara”, disse um participante durante uma sessão sobre a primeira infância. “É a primeira vez que compõe uma mesa de honra. É a primeira vez que falo aqui.” Histórias como essa, para Jô, são o verdadeiro indicador de transformação.
Um mandato de frentes amplas
Apesar de representar o PCdoB — partido que historicamente enfrentou resistência em um parlamento majoritariamente evangélico e conservador —, Jô reforça que não se isola. “Na hora do enfrentamento, a gente enfrenta. Na hora do diálogo, a gente dialoga. E na hora de construir, a gente constrói com quem quer avançar.”
Seu mandato é descrito por ela como uma “grande frente ampla”: conta com apoio de militantes do MST, Levante Popular da Juventude, UJS, Associação de Trabalhadoras Domésticas e diversos coletivos feministas e antirracistas. “Somos filhos do povo, e nosso compromisso é com as cartas de compromisso que assinamos com as entidades. Nada disso é negociável: defesa das mulheres, da raça, dos trabalhadores, da classe.”
Ela destaca que, embora o caminho de sua trajetória naturalmente se conecte a pautas de gênero e raça, seu olhar abarca toda a cidade. “Campina Grande é tecnologia, é inovação, é meio ambiente, é transporte, é saneamento, é plano diretor. A gente trata a cidade como um todo.”
Reconhecimento que vai além dos números
O reconhecimento não vem apenas dos indicadores. Nas ruas, nos grupos de WhatsApp, nas redes sociais, a população acompanha e valoriza seu trabalho. “As pessoas dizem: ‘acompanha seu mandato, vi a notícia, você faz diferença’”, relata, emocionada. “Isso alimenta nossa luta e fortalece nosso projeto para o futuro.”
Para Jô, o fato de ser a primeira mulher negra eleita e agora a mais votada não é apenas um marco pessoal, mas um símbolo político. “Coloca o PCdoB em outro patamar. Mostra que é possível avançar com ideias, com ética, com compromisso real com a maioria.”
Ela permite os desafios de atuar sozinha em um espaço onde a esquerda ainda é minoria. “É um desafio diário. Mas nossa prática é clara: não abrimos mão das nossas bandeiras. E, ao mesmo tempo, sabemos construir.”
Transparência e o papel da imprensa
O levantamento da Polêmica Paraíba , embora não tenha validade científica, cumpre um papel essencial: trazer transparência. A falta de atas oficiais das sessões ordinárias na plataforma da Câmara Municipal impede a contabilização de discursos, um dado importante para avaliar a atuação parlamentar. Mesmo assim, a produtividade de Jô é inegável.
“Queremos mais transparência, sim”, diz. “Mas enquanto não tivermos, seguiremos mostrando nosso trabalho nas ruas, nas redes, nos conselhos, nas audiências. Porque nosso mandato não é só nosso — é da cidade.”
Um novo tempo para a política campinense
Jô Oliveira representa um novo tempo na política de Campina Grande — um tempo em que a periferia ocupa o centro, em que a voz das mulheres negras ecoa na tribuna, em que a produção legislativa caminha junto com a mobilização social.
Liderar o ranking dos vereadores mais produtivos não é apenas um prêmio. É uma confirmação de que outra política é possível: plural, participativa, agressiva — e profundamente humana.
“Não estamos aqui para fazer bonito”, diz Jô. “Estamos aqui para fazer história. E a história, agora, está sendo escrita por quem sempre foi excluído.”