Festival Vermelho: cultura, luta e revigoramento partidário
O Projeto de Resolução apresentado pelo Comitê Central ao 16º Congresso do PCdoB destaca, entre suas diretrizes para o revigoramento partidário, a centralidade da disputa de ideias e da luta cultural. Nesse contexto, o Festival Vermelho aparece como uma das iniciativas mais ousadas e promissoras, capaz de unir militância, sociedade e cultura em um mesmo espaço político de mobilização. Dialogar com essa formulação significa reafirmar que a construção de um partido contemporâneo, enraizado nas lutas populares e com capacidade de dialogar com a sociedade, exige novos formatos de ação, capazes de expressar valores e convicções em linguagem acessível e ampla. É nessa chave que o Festival Vermelho se apresenta não apenas como um evento cultural, mas como uma estratégia de revigoramento partidário.
O Festival Vermelho, ocorrido pela primeira vez em 2022, no Rio de Janeiro, e em 2024, em Salvador, é em sua essência, um encontro político-cultural promovido pelo PCdoB e pela Fundação Maurício Grabois, que une arte, música, literatura, teatro, cinema, debates e convivência em um ambiente festivo e militante. Ele rompe com a ideia de que a política partidária deve restringir-se ao espaço institucional ou às formas tradicionais de mobilização, mostrando que também na cultura se travam batalhas decisivas pela hegemonia. Inspirado em experiências internacionais como o Festival de Avante, em Portugal, a Fête de l’Humanité, na França e a Fiesta de Los Abraços, no Chile, e dialogando com tradições brasileiras de resistência cultural, o Festival Vermelho se tornou espaço único de encontro entre artistas, intelectuais, militantes, movimentos sociais e o povo em geral. Mais do que um evento, ele é trincheira e celebração: um palco de afirmação dos valores democráticos, de justiça social, soberania nacional e solidariedade internacional.
Entre os objetivos estratégicos do Festival Vermelho, destaca-se em primeiro lugar o papel de reafirmar convicções e promover o encontro da militância comunista. A confraternização entre camaradas de diferentes gerações, acompanhados de suas famílias e amigos, cria um ambiente de congraçamento essencial para fortalecer laços de solidariedade interna. Essa dimensão interna não diminui o caráter externo do Festival, mas o complementa: trata-se de unir formação política, afirmação ideológica e alegria militante em um mesmo espaço. É nesse sentido que o Festival Vermelho se consolida também como momento de reafirmação de uma visão de mundo comum entre comunistas e aliados.
Um segundo objetivo estratégico é apresentar os comunistas brasileiros ao conjunto da sociedade. Pela primeira vez um partido político no Brasil ousou promover um encontro político-cultural de grande porte, com identidade própria, destinado a dialogar com toda a esquerda e com amplos setores progressistas. A imagem projetada pelo Festival contribui para reposicionar o PCdoB no cenário nacional, mostrando um partido contemporâneo, capaz de propor algo novo e dialogar em escala ampla. Esse saldo político não se mede apenas pelo impacto imediato de cada edição, mas pelo acúmulo que se gera entre um festival e outro, consolidando sua presença no calendário cultural e político do país.
Outro elemento central é a promoção da solidariedade internacional. O Festival Vermelho insere-se numa tradição histórica do movimento comunista e progressista mundial, em que festivais culturais também cumprem papel de internacionalismo militante. Cada edição é oportunidade de receber delegações de partidos irmãos, representações governamentais e organizações internacionais, fortalecendo laços de solidariedade e promovendo intercâmbio cultural e político. Para a militância e para o público em geral, esse componente internacional é uma janela para conhecer experiências de luta, expressões culturais e ideias que ampliam horizontes. A médio prazo, o Festival pode evoluir para consolidar um espaço internacional em sua programação, com participação ativa de partidos convidados em debates, exposições e atividades culturais.
Ao mesmo tempo, a experiência das duas primeiras edições evidenciou questões estratégicas que precisam ser enfrentadas. A decisão política de realizar o Festival foi correta e assertiva, mas o pouco tempo de preparação fez com que, em alguns momentos, o processo de formulação ficasse em segundo plano diante da urgência da execução, houve certo descolamento entre o “produto” e o “processo”. Considerando o caráter inédito e pioneiro da iniciativa, é necessário avançar em um esforço consciente de formulação e sistematização, capaz de extrair consequências políticas de cada edição e transformá-las em aprendizado coletivo.
Outro ponto diz respeito à formulação da direção partidária sobre o lugar do Festival Vermelho na estratégia do PCdoB. Apesar do apoio estrutural e financeiro que viabilizou as duas primeiras edições, ainda é insuficiente a reflexão sistemática no âmbito da direção sobre a importância do Festival. Mais do que realizar um evento periodicamente, trata-se de compreender o papel estratégico da cultura na disputa de narrativas em tempos de crise democrática e avanço da extrema-direita. O Festival Vermelho precisa ser entendido como instrumento central da batalha de ideias, capaz de recolocar o PCdoB como referência cultural e política na sociedade.
Por fim, permanece o desafio de construir um modelo de sustentabilidade econômica para o Festival. O investimento feito pelo partido e pela Fundação Maurício Grabois foi decisivo, mas é imperioso avançar em formas de autofinanciamento que garantam a perenidade do projeto. Caminhos possíveis incluem maior utilização das Leis de Incentivo à Cultura, parcerias institucionais, apoio de movimentos sociais e sindicais, bem como estratégias de arrecadação direta e autossustentação. Nesse sentido, uma medida estratégica seria consolidar uma Organização da Sociedade Civil, a Associação Vermelho, para assumir formalmente a realização do Festival, garantindo maior capacidade de captar recursos e estruturar sua sustentabilidade de longo prazo.
Diante de todos esses elementos, torna-se claro que se o PCdoB deseja efetivamente revigorar-se e reposicionar-se na disputa política e cultural da sociedade, é imperioso dar continuidade ao projeto do Festival Vermelho. Sua terceira edição não é apenas uma possibilidade: é uma necessidade histórica. O Festival Vermelho já se consolidou como marca distintiva do partido, como trincheira de luta e espaço de criação, como celebração da militância e projeção pública dos comunistas brasileiros. Se queremos revigorar o partido, precisamos assumir o Festival Vermelho como projeto estratégico, permanente e sustentável, capaz de unir cultura e política em favor de um Brasil soberano, democrático e socialista.