Clara Charf. Foto: MDHC/Divulgação

A militante de esquerda Clara Charf morreu nesta segunda-feira (3), em São Paulo (SP). Integrante da Ação Libertadora Nacional (ALN) e viúva de Carlos Marighella, tinha 100 anos, e sua morte trouxe grande repercussão no meio social e político.

De acordo com a Associação Mulher pela Paz, fundada e presidida por Charf, a ativista estava internada e faleceu por causas naturais.

O velório ocorre nesta segunda no Cemitério São Paulo. Em seguida, o corpo será levado ao Crematório da Vila Alpina.

Trajetória

Nascida em 17 de julho de 1925 em Maceió (AL) e criada em Recife (PE), Charf teve trajetória de luta em defesa da democracia desde a juventude. Filiou-se ao Partido Comunista do Brasil (PCB) aos 21 anos, ocasião em que conheceu Marighella. Com ele, militou pelo comunismo. Em 1967, integrou a Ação Libertadora Nacional (ALN), fundada naquele ano para organizar a resistência à ditadura militar brasileira.

De acordo com a publicação Memórias da Ditadura, Charf e Marighella ficaram juntos de 1948 a 1969, até o assassinato dele, aos 57 anos, pela repressão. Após isso, a militante se exilou em Cuba e passou a trabalhar como tradutora.

Voltou ao Brasil com a Lei da Anistia em 1979, filiando-se no ano seguinte ao recém-criado Partido dos Trabalhadores (PT). Desde então, passou a atuar como uma proeminente militante das causas das mulheres e dos direitos humanos. Ao fundar a Associação Mulheres pela Paz, em 2003, coordenou a indicação de mais de 52 brasileiras à iniciativa coletiva 1000 Mulheres para o Nobel da Paz de 2005.

Marighella e Charf. Foto: Editora Unesp

‘Companheira de caminhada’

O presidente Lula lamentou a morte da militante nas redes sociais: “O Brasil perde uma mulher extraordinária. E eu perco uma companheira de muitas caminhadas.”

“Convivi com a Clara por mais de 40 anos. Aprendi muito com ela sobre política, solidariedade, resistência e humanidade. E hoje me despeço dela com carinho, respeito e gratidão a essa grande brasileira que tanto fez pelo nosso país e por todos nós que tivemos a sorte de tê-la por perto”, completou.

Frei Betto, autor de mais de 70 livros, entre eles Batismo de Sangue (1982), destaca que, na véspera do assassinato de Carlos Marighella, tombado em 4 de novembro de 1969 pela ditadura militar, “parte Clara, sua companheira de vida e de lutas”.

Como observa, “ser mulher de um revolucionário é, muitas vezes, ser silenciada pela narrativa dos heróis. Mas Clara não coube nesse silêncio. Fez da vida um território de cuidado e, da lembrança, um ato político”.

Por fim, Frei Betto acrescenta: “Morreu centenária, vitoriosa, com o mesmo olhar sereno de quem nunca deixou de acreditar que o mundo pode ser melhor. Ao lado de Carlos, continua a sussurrar à história: Nada apaga o que é feito por amor e liberdade.”

A ministra-chefe da Secretaria de Relações Institucionais do governo federal, Gleisi Hoffmann, prestou sua homenagem: “Clara Charf gravou seu nome na história das lutas sociais, da militância política e do feminismo no Brasil. Desde sua participação na Aliança Nacional Libertadora nos anos 1930, enfrentou com coragem a repressão, a ditadura e o exílio, mantendo e espalhando a esperança na construção de um mundo mais justo. Hoje ela nos deixou, mas estará sempre presente na nossa caminhada.”

A Fundação Maurício Grabois, do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), também apresentou suas homenagens à memória de Clara. “Ela foi uma militante monumental da esquerda brasileira no PT, desde cedo ingressando no PCB, exilada, e seguiu sua luta ao lado de Marighella, até seu assassinato. Pessoas assim não morrem, elas persistem em nossa memória como as estrelas que alumiam os caminhos de luta do povo brasileiro, com coerência, abnegação e coragem.”