Rússia acusa EUA de “ato de guerra” após sanções contra petroleiras
Novas sanções dos EUA a petroleiras russas interrompe fluxo de comércio com China e Índia e provoca reações ameaçadoras do governo russo
As novas sanções econômicas impostas pelo governo de Donald Trump contra as duas maiores petrolíferas da Rússia — Rosneft e Lukoil — provocaram uma alta imediata de quase 5% no preço do petróleo internacional e uma escalada nas tensões entre Washington e Moscou. O Brent chegou a US$ 65,50 e o WTI ultrapassou US$ 61, no maior salto em semanas, refletindo o temor de escassez de oferta global, já que a Rússia é o segundo maior produtor de petróleo do mundo.
O impacto foi imediato: refinarias da China e da Índia, principais compradoras do petróleo russo, anunciaram redução ou suspensão das importações. O mercado reagiu com incerteza, e países da Opep prometeram “compensar eventuais déficits de produção”, temendo uma nova crise energética.
“Restringir o petróleo russo vai desestabilizar os mercados e prejudicar o próprio consumidor americano”, alertou o presidente Vladimir Putin, acusando Trump de “agir por impulsos políticos que põem em risco a economia global”.
Moscou reage: “Os EUA são nossos inimigos”
A resposta russa foi imediata e contundente. O ex-presidente Dmitry Medvedev, hoje vice-presidente do Conselho de Segurança e um dos principais aliados de Putin, classificou as sanções como “um ato de guerra” e afirmou que “os EUA entraram de vez no caminho do confronto”.
“O cancelamento da cúpula em Budapeste por Trump. Novas sanções contra o nosso país por parte dos EUA. O que mais? Haverá novas armas, além dos infames [mísseis] ‘Tomahawks’?”, afirmou Medvedev. “Os EUA são nosso inimigo, e o seu falastrão ‘pacificador’ [Trump] agora entrou de vez no caminho da guerra contra a Rússia. As decisões tomadas são um ato de guerra contra a Rússia – e, agora, Trump se solidarizou completamente com a insana Europa”.
As declarações, em tom quase bélico, vieram após o cancelamento da reunião entre Trump e Putin, que seria realizada na Hungria para discutir um cessar-fogo na guerra da Ucrânia. O Kremlin interpretou o gesto como ruptura diplomática e intensificou demonstrações militares — incluindo o lançamento de mísseis balísticos nucleares em testes simultâneos, vistos por analistas como um recado direto a Washington.
Sanções que isolam e inflamam
As medidas do Tesouro dos EUA bloqueiam todos os bens e ativos das empresas russas em território americano e proíbem transações com suas subsidiárias. Mais do que um golpe econômico, especialistas avaliam que as sanções atingem a estrutura central do financiamento da Rússia, já que o petróleo responde por mais de 30% da receita estatal.
Porém, a decisão de Trump não ocorre em um vácuo. Ao mesmo tempo em que tenta pressionar Moscou, o republicano enfrenta crescentes pressões internas e externas: inflação energética nos EUA, críticas de aliados europeus sobre o risco de desestabilização e a perda de credibilidade internacional após sucessivas reviravoltas em sua política externa.
Trump tenta parecer forte diante de Putin, mas age de forma errática e reativa. Suas sanções punem o mundo todo — especialmente os países dependentes de energia —, enquanto alimentam o nacionalismo russo. Trump repete o erro histórico de usar sanções econômicas como arma política, o que penaliza também o consumidor norte-americano.
Petróleo em alta e crise diplomática
A disparada nos preços já provoca efeitos colaterais. Além do aumento do custo dos combustíveis nos EUA e na Europa, a China e a Índia — que vinham sustentando parte das exportações russas — começam a reduzir operações para evitar retaliações de Washington. O bloqueio ameaça desestruturar o comércio global de energia, pressionando economias emergentes e elevando custos de transporte e produção.
Em reação, Putin voltou a defender a diversificação dos parceiros russos, fortalecendo laços com países não alinhados ao Ocidente e com o bloco dos Brics ampliado, no qual o Brasil e a China têm papel estratégico.
O retorno da lógica de guerra
A nova rodada de sanções marca uma inflexão na política de Trump, que até então evitava medidas diretas contra Moscou. Agora, ao endurecer o tom, o republicano reacende uma retórica de confronto entre potências nucleares, com potencial de fragmentar ainda mais a ordem internacional.
O gesto é visto por analistas como um movimento de política interna disfarçado de diplomacia, buscando recuperar apoio entre falcões republicanos e setores militares — à custa de uma escalada perigosa.
“Cada novo ultimato de Trump é um passo em direção ao conflito direto. A diplomacia foi substituída por chantagem econômica”, declarou Medvedev.
A retórica russa ecoa um sentimento crescente de cerco geopolítico, alimentado pela ampliação das sanções europeias e pelo apoio da Otan à Ucrânia. Enquanto isso, a guerra — prestes a completar quatro anos — se arrasta sem perspectiva de paz, e o custo econômico e humano cresce em ritmo alarmante.
Um império em declínio
Ao mirar o petróleo russo, Trump atinge o coração da economia global — mas também expõe as contradições de um país que, em nome da hegemonia, desestabiliza o próprio sistema que criou. Os EUA, que se apresentam como defensores da “liberdade dos mercados”, recorrem cada vez mais ao bloqueio econômico e ao isolamento como instrumentos de poder, transformando aliados em reféns e adversários em inimigos permanentes.
As sanções são o novo campo de batalha da política imperial americana. Mas o mundo multipolar já não se dobra com tanta facilidade.
A ofensiva contra Moscou, somada à crise com a China e ao desgaste com aliados europeus, reforça a imagem de uma potência em decadência, presa a uma política externa errática e movida por impulsos eleitorais.
As sanções de Trump não apenas elevaram o preço do petróleo — mas também acentuaram a guerra de narrativas que define o novo cenário global. Para a Rússia, trata-se de defender sua soberania diante de um cerco ocidental. Para os EUA, de reafirmar sua liderança pela coerção econômica. O resultado, porém, é um mundo mais instável, mais caro e mais perigoso.
Por Cezar Xavier




