Com desestímulo ao setor produtivo, política monetária dificulta formalidade trabalhista e negociações melhores. Foto: Helena Pontes/Agência IBGE Notícias

O Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou nesta quarta-feira (17) a manutenção da taxa Selic em 15% ao ano, patamar que mantém o Brasil entre os países com os maiores juros reais do mundo. A decisão, esperada por parte do mercado financeiro, foi recebida com críticas contundentes de entidades sindicais, industriais e especialistas, que apontam prejuízos para o emprego, o crédito e os investimentos.

Segundo cálculos do Dieese, os juros médios cobrados da população saltaram de 36% em 2021 para mais de 56% em 2025. Além disso, a cada 0,25 ponto percentual de aumento, o gasto com a dívida pública cresce em mais de R$ 12 bilhões ao ano.

“Remédio cavalar e falacioso”

O dirigente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Nivaldo Santana, criticou a decisão do Banco Central de manter a taxa básica de juros em 15% ao ano, mesmo diante de cenário de deflação. Para ele, a justificativa do Copom não se sustenta:

Nivaldo Santana, dirigente da CTB

“O BC tem usado o argumento falacioso de que o único remédio para combater a inflação é aplicar doses cavalares de juros. Essa decisão é inexplicável do ponto de vista econômico e perversa para os trabalhadores e para a população de baixa renda.”

Na mesma linha, o vice-presidente nacional da CTB, Rene Vicente, destacou os impactos diretos da política monetária sobre o cotidiano da classe trabalhadora: “Quando financia um imóvel, um automóvel ou busca crédito, o trabalhador paga mais caro. Isso tira poder de compra, enfraquece a economia e compromete o desenvolvimento do país.”

Rene Vicente, vice-presidente da CTB

Rene afirmou ainda que a manutenção da Selic elevada representa submissão do Banco Central ao mercado financeiro: “É lamentável que a autonomia do BC perpetue sua função de servir à especulação, em vez de promover o crescimento. A taxa atual paralisa a economia e sufoca o povo brasileiro.”

“Juros não combatem inflação brasileira”, diz CUT

Juvandia Moreira, vice-presidenta da CUT

Para a vice-presidenta da CUT, Juvandia Moreira, a decisão do Banco Central agrava a crise social e trava a economia.

“O BC diz que precisa manter juros altos para controlar a inflação, mas isso não é verdade para o tipo de inflação que temos. Com Selic em 15%, o crédito fica mais caro, o consumo cai, os investimentos recuam e o país deixa de gerar empregos de qualidade.”

Ela lembrou que nos primeiros anos do governo Lula, o país combinou juros menores, crescimento econômico e pleno emprego.

Força Sindical fala em “era dos juros extorsivos”

Miguel Torres, presidente da Força Sindical

O presidente da Força Sindical, Miguel Torres, foi ainda mais duro:

“Estamos vivendo a era dos juros extorsivos. O Copom continua se curvando aos especuladores, enquanto sufoca o setor produtivo. É preciso baixar os juros já para o Brasil voltar a crescer.”

Torres destacou que a Selic em patamar elevado prejudica as campanhas salariais e mantém a economia “estrangulada”.

Indústria denuncia paralisia nos investimentos

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) considerou a decisão injustificada e excessivamente conservadora. O presidente da entidade, Ricardo Alban, afirmou:

Ricardo Alban, da CNI

“Não existe crescimento sustentável com juros estratosféricos. O que existe é paralisia dos investimentos produtivos e desestímulo à inovação. Já passou da hora de iniciar um ciclo de cortes.”

Alban ressaltou que, enquanto a Selic real supera 10% ao ano, os empresários preferem aplicar no mercado financeiro em vez de investir na produção. A CNI calcula que o crédito para empresas subiu de 20% para mais de 25% ao ano desde 2024, e o consumo industrial segue em queda.

“Indústria em cenário negativo”, alerta economista

Célio Hiratuka, economista

O economista da Unicamp, Célio Hiratuka, avaliou que a manutenção da Selic compromete ainda mais as expectativas do setor produtivo.

“A indústria já enfrenta desaceleração e baixo desempenho. O pior é a sinalização de que os juros devem permanecer altos por tempo prolongado. Isso inibe investimentos e agrava a perspectiva negativa para o futuro.”

Um país paralisado pelos juros

De acordo com o Dieese, nos últimos 12 meses o governo federal desembolsou R$ 928,4 bilhões em juros da dívida, valor que corresponde a mais de cinco vezes o orçamento da Educação e três vezes o da Saúde.

Enquanto isso, o crescimento do PIB desacelerou para 0,4% no segundo trimestre e os indicadores de confiança da indústria acumulam nove meses em queda.

O consenso entre sindicalistas, economistas e empresários é claro: a Selic em 15% asfixia o país, compromete a recuperação da economia e amplia as desigualdades sociais.

(por Cezar Xavier)