Tarcísio de Freitas durante evento do agronegócio - Foto: Fernando Nascimento/Governo do Estado de São Paulo | Foto: Reprodução

O governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos), em São Paulo, tem executado uma política imoral de regularização fundiária no Pontal do Paranapanema que, na prática, legaliza a grilagem de terras públicas. Sob o argumento de promover segurança jurídica e evitar custos com indenizações judiciais, o Governo paulista consolida uma reforma agrária às avessas — uma espécie de “Bolsa-Latifúndio” — ao conceder até 90% de desconto para a compra de terras devolutas por grandes proprietários rurais e empresas que ocupam essas áreas há décadas.

Estima-se que a área total envolvida na “regularização” atinja cerca de 600 mil hectares — o equivalente a quatro vezes a área da cidade de São Paulo. O custo dessa política aos cofres públicos pode ultrapassar R$ 18 bilhões, de acordo com estimativas técnicas feitas com base nos valores de mercado das terras. Porém, os compradores pagarão frações desse valor, em alguns casos menos de 10%.

De acordo com a coluna de Adriana Ferraz, no UOL, as terras, utilizadas principalmente para criação de gado, cultivo de soja e cana, além da produção de etanol, passaram a ser oferecidas por valores reduzidos desde o início da gestão de Tarcísio, em 2023.

Segundo levantamento realizado pelo portal UOL a partir dos valores mínimos estimados no Mapa de Terras 2023 elaborado pelo INCRA, a área em negociação corresponde a 2,5% do território estadual — quatro vezes o tamanho da cidade de São Paulo.

A medida tem gerado forte reação de movimentos do campo, especialistas em questão agrária e parlamentares de oposição, que denunciam a legalização da grilagem de terras públicas, historicamente destinadas à reforma agrária ou à proteção ambiental. “Uma das maiores doações de terras da história do Brasil”, critica a deputada estadual Mônica Seixas (PSOL). Segundo Mônica, “o governador Tarcísio de Freitas está aplicando mais uma etapa do seu PL da Grilagem, ou lei dos Desmatadores, que ele chama de Lei de Regularização Fundiária”. “Serão mais de um milhão de quilômetros de terras públicas entregues sem nenhuma transparência ou participação popular”, denuncia. 

Ela ressalta que essas áreas deveriam ser destinadas à reforma agrária e ao cumprimento da função social da terra, como prevê a Constituição. “A Constituição brasileira diz que terras públicas, terras devolutas devem servir primeiro para a reforma agrária e segundo para cumprir uma função social”, reforça a deputada. “Tarcísio destrói a lei de Reforma Agrária do Estado de SP e quer entregar para desmatadores”, aponta. “Repito: gente pobre não vai ganhar terra do Tarcísio, só fazendeiro, latifundiário do boi e da cana”, afirma categoricamente. 

O Pontal do Paranapanema é uma das regiões com maior concentração de conflitos agrários no estado de São Paulo. As terras públicas ocupadas por grandes fazendeiros ao longo das décadas deveriam, por lei, ser destinadas à reforma agrária. No entanto, sob a gestão de Tarcísio, essas áreas estão sendo “legalizadas” com benefícios escandalosos aos grileiros históricos, transformando crimes fundiários em negócios altamente lucrativos.

O governador argumenta que os descontos são uma forma de “resolver litígios antigos” e “evitar indenizações bilionárias”. Mas o que se vê é uma verdadeira anistia à grilagem, transformando em banquete milionário para grileiros aquilo que deveria ser tratado como crime contra o patrimônio público.

A prática segue uma lógica perversa: quem ocupou a terra pública ilegalmente por tempo suficiente, agora tem o direito de comprá-la quase de graça. O que era crime se converte em posse legalizada — e com incentivo fiscal.

Relatórios da oposição na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) apontam que a regularização beneficia principalmente grandes fazendeiros, muitos dos quais apoiadores políticos do atual governo. Há também denúncias de que algumas dessas propriedades foram fracionadas entre familiares para burlar limites estabelecidos por lei, mantendo o controle sob diferentes CPFs.

Em alguns casos divulgados, propriedades avaliadas em R$ 6 milhões foram regularizadas com pagamento de menos de R$ 1 milhão ao Estado. O prejuízo aos cofres públicos não se limita à arrecadação direta: com a perda dessas terras, o Estado deixa de poder destiná-las a políticas públicas como reforma agrária, moradia rural e preservação ambiental.

Os valores praticados na regularização revelam um enorme prejuízo aos cofres públicos. Os descontos concedidos incidem sobre os preços estabelecidos pelo Instituto de Economia Agrícola (IEA-Apta), que são significativamente inferiores aos valores mais altos fixados pelo Incra. Desde o início do programa, a arrecadação do governo ficou muito aquém do valor de mercado: foram recolhidos R$ 187 milhões pela venda de 73 mil hectares, enquanto o preço real do hectare no mercado alcança R$ 33,4 mil — mais de 12 vezes acima do valor efetivamente pago pelas terras regularizadas.

Além disso, a falta de transparência no processo de avaliação dos imóveis rurais levanta suspeitas. Os valores usados para calcular os descontos têm sido considerados muito abaixo dos preços de mercado, o que acentua ainda mais o caráter de favorecimento aos grandes proprietários.

Fonte: Página 8