STF pode condenar Bolsonaro a até 46 anos de prisão
Rio de Janeiro (RJ), 29/06/2023 – O ex-presidente Jair Bolsonaro desembarca no aeroporto Santos Dumont e fala sobre o julgamento no TSE que o tornou inegelível. Foto:Tânia Rêgo/Agência Brasil
Ação penal no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o núcleo central da tentativa de golpe de Estado pode levar à condenação do ex-presidente da República, Jair Bolsonaro, a até 46 anos de prisão, caso a Corte acolha integralmente os argumentos apresentados pela Procuradoria-Geral da República (PGR). A manifestação do Ministério Público, entregue ao relator do caso na noite desta segunda-feira (14), sustenta que o político liderou uma organização criminosa com o objetivo de abolir violentamente o Estado democrático de direito, por meio de ataques às instituições e à Constituição Federal.
Na peça de 517 páginas, a PGR descreve um conjunto de ações coordenadas que teriam se intensificado a partir de 2021, culminando com os atos extremistas de 8 de janeiro de 2023, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas em Brasília. Segundo a acusação, a tentativa de ruptura institucional envolveu a utilização de cargos públicos, acesso privilegiado a informações, mobilização de militares e articulações com setores da sociedade civil radicalizados.
Os crimes e suas penas
A lista de crimes atribuídos ao ex-mandatário é extensa. Caso todas as imputações sejam reconhecidas pelo STF com as penas máximas previstas, a condenação pode ultrapassar quatro décadas. Os delitos são os seguintes:
- Organização criminosa armada: pena de até 17 anos, podendo chegar a 20, por causa da liderança do grupo;
- Tentativa de abolição violenta do Estado democrático de direito: até 8 anos;
- Golpe de Estado: até 12 anos;
- Dano qualificado com violência contra o patrimônio da União: até 3 anos;
- Deterioração de patrimônio tombado: até 3 anos.
No total, a soma pode chegar a 46 anos de reclusão. No entanto, conforme a legislação brasileira, o tempo máximo de cumprimento efetivo de pena é 40 anos, conforme estabelece o chamado pacote anticrime, aprovado durante o próprio governo do ex-presidente.
Prisão domiciliar é considerada provável

Embora ainda não haja condenação, nos bastidores políticos e jurídicos, cresce a percepção de que o eventual cumprimento de pena poderá ocorrer em regime domiciliar. A justificativa mais recorrente é a idade do réu — que completou 70 anos — e seu histórico de problemas graves de saúde, com internações frequentes e sequelas de um atentado sofrido em 2018. A possibilidade de prisão em casa, contudo, depende de decisão da Corte, que avaliará critérios médicos e jurídicos após o julgamento.
Especialistas em direito penal ponderam, em entrevistas por toda a imprensa nacional, que uma condenação máxima é improvável, mas admitem que os agravantes, como a condição de liderança e o uso da máquina pública para fins golpistas, podem elevar significativamente a dosimetria das penas.
Julgamento pode ocorrer até setembro
Com a entrega das alegações finais pela PGR, abre-se agora o prazo de 15 dias para a apresentação das defesas. O primeiro a se manifestar será o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente, que firmou acordo de delação premiada. Os demais réus terão prazo conjunto, também de 15 dias, mesmo durante o recesso do STF, que termina em 31 de julho.
A expectativa é que o julgamento pela Primeira Turma do STF ocorra até setembro. O colegiado é formado pelos ministros Alexandre de Moraes (relator), Cármen Lúcia, Flávio Dino, Luiz Fux e Cristiano Zanin.
Estrutura golpista e articulação direta
A Procuradoria-Geral da República considera que o núcleo acusado atuou com estrutura organizada, divisão de tarefas e acesso a armamento, além de contar com apoio de membros das Forças Armadas e da alta cúpula do governo anterior. Bolsonaro é descrito como “principal articulador, maior beneficiário e autor dos mais graves atos executórios voltados à ruptura da ordem constitucional”.
Além da tentativa de golpe, o MPF aponta o uso indevido de órgãos de inteligência para espionagem de adversários, mobilização de militares e pressão direta sobre autoridades do Judiciário e do Legislativo. O início da radicalização institucional, segundo a PGR, remonta a 2021, quando a popularidade do ex-presidente começou a cair nas pesquisas eleitorais.
Réus do núcleo central da trama
Além do ex-presidente Bolsonaro, outras sete figuras de proa do governo anterior são rés no mesmo processo:
- Ex-ministro do GSI, Augusto Heleno;
- Ex-ministro da Casa Civil, Braga Netto;
- Ex-ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira;
- Ex-ministro da Justiça, Anderson Torres;
- Ex-comandante da Marinha, Almir Garnier;
- Deputado federal, Alexandre Ramagem (PL-RJ);
- Tenente-coronel e delator, Mauro Cid.
Todos são acusados de integrar o núcleo decisório da organização criminosa. A PGR também sustenta que a detenção preventiva de militares em instalações do Exército visou preservar a integridade dos acusados e proteger as investigações.
Desfecho depende do STF
O processo caminha agora para a sua fase final. Após as defesas apresentarem seus argumentos e documentos, caberá ao ministro-relator redigir o voto e liberar o caso para julgamento. A partir de então, os ministros decidirão pela absolvição, condenação parcial ou integral dos acusados.
Se houver condenação, será fixada a pena e o regime de cumprimento. Recursos poderão ser apresentados, mas a execução provisória da pena poderá ser determinada, a depender da gravidade das sentenças.
Caso as penas sejam altas, a forma de cumprimento — seja em prisão especial, unidade militar ou domiciliar — será alvo de intensos debates jurídicos e políticos, com forte repercussão nacional e internacional.
(por Cezar Xavier)