O bolsonarista Roberto Campos Neto deixou o Banco Central (BC), mas a política monetária pró-rentismo continua a dar as cartas no País. Nesta quarta-feira (29), na primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC sob a comando de Gabriel Galípolo – indicado ao posto pelo presidente Lula –, o órgão elevou, pela quarta vez seguida, a Selic (taxa básica de juros).

Conforme previsto pelo mercado e antecipado na ata da reunião anterior do Copom, a alta foi de um ponto percentual – de 12,25% para 13,25% ao ano. Com isso, a Selic alcançou seu maior índice desde setembro de 2023.

Não foi apenas a estreia de Galípolo como presidente do Banco Central. Pela primeira vez desde o início do governo Lula, o comitê decidiu a taxa de juros com uma composição mais “lulista” que “bolsonarista” – ou seja, com um colegiado que tem mais membros indicados pelo atual presidente. Essa maioria, no entanto, foi irrelevante.

Além de proclamar a decisão por unanimidade, o Copom já prevê novos aumentos na Selic em decisões futuras. “Diante da continuidade do cenário adverso para a convergência da inflação, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, um ajuste de mesma magnitude na próxima reunião”, apontou o comunicado do comitê. Tudo indica que haverá outro reajuste de um ponto percentual no encontro de 19 de março.

E as ameaças não param por aí: “Para além da próxima reunião, o Comitê reforça que a magnitude total do ciclo de aperto monetário será ditada pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta e dependerá da evolução da dinâmica da inflação, em especial dos componentes mais sensíveis à atividade econômica e à política monetária, das projeções de inflação, das expectativas de inflação, do hiato do produto e do balanço de riscos”.

Do ponto de vista conjuntural, porém, os aumentos não se justificam. Além de manter a inflação abaixo de 5% pelo segundo ano seguido, o governo não vive uma crise real. Ao contrário. Na terça-feira (28), por exemplo, a Receita Federal anunciou que a União arrecadou R$ 2,709 trilhões em 2024 – o que representa um crescimento real de 9,6% em relação a 2023.

Para o economista Marcos Costa, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), essa arrecadação “deveria ter implicações significativas e positivas para um alívio fiscal”. Segundo ele, o BC pode ser um parceiro do governo num projeto de “maior investimento no crescimento econômico impulsionado, principalmente, pelo desenvolvimento industrial”.

Porém, diz Marcos, o “BC ‘independente’ se preocupa mais com os humores do mercado do que com os reais problemas do país. Para manter uma postura restritiva, priorizando o controle de preços, o Banco Central apela para argumentos como ‘os desafios inflacionários’ e a ‘desconfiança do mercado’”.

A CNI (Confederação Nacional da Indústria) também atacou o Copom. De acordo com entidade patronal, “insistir no aumento da Selic, considerando que já tem embutidos juros reais de cerca de 7%, faz com que o setor industrial adie investimentos essenciais, voltados à modernização ou expansão da sua matriz de produção”.

Adilson Araújo, presidente da CTB (Central dos Trabalhadores e das Trabalhadoras do Brasil), também criticou a alta da Selic. “Com essa política de juros escorchantes, o Brasil pode nadar, nadar e morrer na praia. O governo Lula precisa elevar o tom contra o ‘deus mercado’, que não sabe o custo do feijão no supermercado”, afirmou.

De acordo com Adilson, “uma taxa de juros no patamar sugerido pelo Banco Central, endossado pelo Gabriel Galípolo, é o alimento para a especulação, para o grande capital, para a banca rentista, que está patrocinando uma política contrária ao desenvolvimento do país”. O dirigente conclui: “É necessário elevar o tom. É preciso que a sociedade brasileira se convença do quanto se faz necessário o brado retumbante de grandes manifestações pela redução substancial da Selic”.