A recente alta da taxa básica de juros para 13,25%, com a previsão de novos aumentos até março de 2025, promovida pelo Banco Central (BC) sob a liderança de Roberto Campos Neto, reacendeu o debate sobre os limites da autonomia da instituição e sua relação com os rumos da economia brasileira. A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), em artigo publicado na Carta Capital, não economizou críticas ao papel desempenhado pelo BC, defendendo uma revisão urgente de sua autonomia.

Para a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) representa uma postura “nonsense” e prejudicial ao desenvolvimento do país, destacando a desconexão entre as diretrizes do Banco Central e os objetivos econômicos e sociais do governo.

Seguindo a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), o aumento em um ponto percentual na Selic foi acompanhado de uma previsão de novos ajustes em breve. A medida foi justificada pela necessidade de conter riscos inflacionários, baseados na premissa de uma economia “aquecida” e “baixo desemprego”, argumentos que Jandira considera desconectados da realidade. “Não faz o menor sentido. O Banco Central, ao aplicar um choque de juros cruel, demonstra que está mais comprometido com especuladores do que com o desenvolvimento do País”, afirmou a deputada.

Os argumentos do Copom são duramente criticados por analistas e parlamentares, que apontam uma contradição: a inflação acumulada nos últimos 12 meses é de 4,87%, dentro da meta definida, enquanto o aumento da Selic impacta negativamente setores produtivos e a geração de empregos.

Impacto no setor produtivo e nas desigualdades sociais

O aumento da taxa de juros impacta diretamente o setor produtivo, já pressionado por custos crescentes e dificuldades de acesso ao crédito. Representantes da indústria, como Rafael Lucchesi, diretor da Confederação Nacional da Indústria (CNI), classificaram a medida como “um ataque especulativo”. A jornalista Flávia Oliveira foi ainda mais contundente, afirmando que “o Banco Central quer produzir uma recessão”. Para Jandira, a política do Banco Central reflete uma agenda que favorece rentistas em detrimento de trabalhadores e empresários.

“Cada ponto percentual da Selic representa 40 bilhões de reais que deixam de circular na economia para alimentar a especulação financeira”, destacou. São valores que poderiam ser direcionados a investimentos em saúde, educação e infraestrutura, mas destinados a pagamentos de juros da dívida pública. “O Banco Central se afastou de seu papel de promover o desenvolvimento sustentável e atua como um instrumento do mercado financeiro para engordar o lucro de especuladores”, afirma.

Esse posicionamento ocorre em um momento de reação apocalíptica por parte do mercado financeiro a medidas do governo Lula, como o ajuste fiscal de R$ 70 bilhões anunciado pelo ministro Fernando Haddad e a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, beneficiando 26 milhões de brasileiros. Para Feghali, a grita do mercado reflete os interesses de uma elite financeira que resiste a qualquer tentativa de redistribuição de renda.

Essa abordagem perpetua as desigualdades sociais. Enquanto setores privilegiados acumulam lucros, medidas que poderiam beneficiar a maioria da população, como a isenção do IR e a taxação de super-ricos, enfrentam resistência feroz do mercado. Segundo a deputada, “os devotos do ‘deus mercado’ se voltam contra qualquer iniciativa de justiça social, colocando seus interesses acima do bem-estar coletivo”.

Autonomia sob escrutínio

A autonomia do Banco Central, celebrada por muitos como garantia de estabilidade econômica, é vista por Jandira como um entrave ao desenvolvimento do País. Para ela, a instituição se distanciou de sua missão original de promover o crescimento sustentável. O atual presidente do BC, Roberto Campos Neto, é descrito como “um fanático do evangelho rentista”, com interesses políticos confessos. Ela aponta ainda para a necessidade de um debate nacional sobre o tema. “É fundamental que o Banco Central esteja alinhado aos interesses do povo brasileiro, não aos de uma elite financeira”.

A parlamentar argumenta que a autonomia do Banco Central, em vigor desde 2021, precisa ser revista para que a instituição esteja alinhada aos objetivos de desenvolvimento do país. Ao abordar as implicações de uma política monetária restritiva, Feghali também alerta para os riscos de uma recessão provocada artificialmente. Ela lembra que a economia não é uma ciência exata, mas uma ferramenta para garantir dignidade e bem-estar à população. “A função do governo não é dar lucro para oligarcas. É promover a felicidade e a qualidade de vida da população”, defendeu.

O futuro da política econômica brasileira

A crítica da deputada também recai sobre o caráter político da gestão de Campos Neto, que já se declarou alinhado a projetos conservadores e chegou a cogitar atuar como ministro da Fazenda em uma eventual candidatura de Tarcísio de Freitas à Presidência. Essa postura levanta questionamentos sobre a neutralidade de sua condução à frente do Banco Central, especialmente em um contexto onde o governo busca implementar políticas redistributivas.

Com a previsão de novos aumentos na Selic, o desafio do governo Lula será equilibrar o impacto das altas taxas de juros com a manutenção de políticas que favoreçam o crescimento econômico e a redução das desigualdades. A popularidade das medidas redistributivas, como a isenção de impostos e a taxação progressiva dos mais ricos, mostra que há apoio popular para um modelo de desenvolvimento mais inclusivo.

A necessidade de um Banco Central mais alinhado às demandas do Brasil, segundo a deputada, será crucial para enfrentar os desafios econômicos e políticos dos próximos anos, especialmente com o país em destaque no cenário global, atraindo investimentos e consolidando seu papel como liderança emergente.

Economia como ferramenta de justiça social

Com uma visão crítica e propostas voltadas à redistribuição de renda, a deputada reforça a necessidade de enfrentar os interesses do mercado financeiro. O fim da autonomia do Banco Central é um dos passos para garantir que a economia brasileira seja conduzida com foco na inclusão social e no desenvolvimento sustentável.

A disputa, entretanto, não se restringe à economia: ela reflete uma batalha ideológica entre o projeto neoliberal, defendido por setores do mercado, e um modelo que privilegia o bem-estar coletivo. “O povo sabe o que quer, mas também quer o que não sabe”, cita Feghali, evocando Gilberto Gil para ilustrar a complexidade das demandas sociais.

(por Cezar Xavier)