Libaneses atingidos por explosão perto de banca em mercado de Beirute | Foto: Reprodução

Ataque remoto israelense, que fez explodir bipes em Beirute e outras cidades, matou nove pessoas e feriu 2800, dos quais 200 em estado crítico.

O ex-agente da CIA/NSA, Edward Snowden, um dos primeiros jornalistas de destaque a se manifestar, classificou de “indistinguível do terrorismo” o ataque cibernético perpetrado por Israel, que fez com que dispositivos de mensagem pagers – conhecidos no Brasil como bipes – explodissem nesta terça-feira (17) no Líbano, causando milhares de vítimas.

As explosões aconteceram no país inteiro, incluindo Beirute, o vale do Bekaa e o sul e, segundo o ministro da Saúde libanês, Firas Abiad, mataram nove pessoas e feriram 2800, sendo que 200 em estado crítico. As vítimas foram levadas para cerca de 100 hospitais, que ficaram superlotados.

Assim como os assassinatos anteriores perpetrados por Israel – até mesmo do principal negociador do Hamas, Ismail Hanyeh, em Teerã –, essa chacina visa impedir que se alcance qualquer acordo de cessar-fogo em Gaza e na região e, ao contrário, tenta estender a guerra ao Oriente Médio inteiro.

Crime perpetrado na tentativa de manter no poder o primeiro-ministro Netanyahu, sob ameaça de prisão por corrupção e rechaçado nas ruas, junto à gangue de assaltantes de terra palestina chefiada por Gvir e Smotrich.

Assim, ao invés de parar o genocídio, fazer acordo de cessar-fogo e trazer de volta os reféns, como exigem insistentemente multidões de manifestantes em Israel, o regime fascista no poder em Israel comete uma provocação atrás da outra, além de perpetrar uma chacina como não se via desde a Segunda Guerra Mundial, coloca em risco a vida dos cerca de 100 reféns israelenses em Gaza.

Entre os mortos, há uma menina de 10 anos e, entre os feridos, o embaixador do Irã no Líbano, Mojtaba Amani. Também foi morto o filho de um parlamentar libanês e o filho de outro ficou ferido. Abiad detalhou em uma coletiva de imprensa que a maioria dos ferimentos foi no rosto, olhos, mãos ou abdômen.

“O que Israel acabou de fazer é, por meio de qualquer método, imprudente. Eles explodiram um número incontável de pessoas que estavam dirigindo (ou seja, carros fora de controle), fazendo compras (seus filhos estão no carrinho atrás dele na fila do caixa), etc. Indistinguível do terrorismo”, disse Snowden.

Para o reconhecido denunciante das ações de terror da CIA, o padrão de ferimentos – consistentemente graves e generalizados – aponta para o uso de explosivos plantados em vez de avarias acidentais. “À medida que chegam informações sobre os bipes explosivos no Líbano, parece agora mais provável que sejam explosivos implantados, não um hack. Por que? Muitas lesões consistentes e muito graves. Se fossem baterias superaquecidas explodindo, você esperaria muito mais pequenos incêndios e falhas de ignição.”

Para especialistas consultados pela Associated Press, provavelmente as explosões se deveram a explosivo previamente implantado no dispositivo e acionado pelo envio de um pulso eletrônico.

Segundo The New York Times, o lote de pagers que explodiram foi fornecido por uma empresa de Taiwan. A onda de explosões durou cerca de uma hora após as detonações iniciais, que ocorreram por volta das 15h45 no horário local.

Imagens das câmeras de segurança de um supermercado em Beirute registraram o momento de duas dessas explosões: uma de um homem que pagava suas compras no caixa e outra perto de uma bancada de frutas. Os hospitais em Beirute rapidamente se aproximaram da capacidade total, quando milhares de feridos foram levados às pressas para as salas de emergência.

O médico libanês Dania El Hallak, relatou, pelas redes sociais, que “uma vítima foi levada às pressas para o pronto-socorro com os intestinos para fora!! Tentamos estabilizá-lo até que finalmente pudéssemos levá-lo para a sala de cirurgia.”

Ele acrescentou que teve “que remover as bandagens apenas para não encontrar nenhum globo ocular no lugar”. “Eu vi pessoas massacradas pela primeira vez. Alguém pode se recuperar de tal cena?”

O primeiro-ministro Najib Mikati afirmou em uma reunião de gabinete nesta terça que o caso “constitui uma violação grave da soberania libanesa e um crime para todos os padrões”, de acordo com o canal de notícias estatal NNA. O governo do Líbano denunciou esse novo crime israelense à ONU.

Em comunicado, o Hezbollah disse considerar “o inimigo israelense totalmente responsável por este ataque criminoso que levou ao martírio de várias pessoas, impactou civis e feriu um grande número de pessoas com vários tipos de ferimentos”.

“Este inimigo criminoso e traiçoeiro definitivamente receberá uma punição justa por este ataque hediondo, tanto de maneiras esperadas quanto inesperadas”.

Os pagers apenas enviam mensagens, não realizando ligações. Anteriores aos celulares, eles são obviamente muito mais baratos e, do ponto de vista da segurança de quem é vizinho ao Mossad, não têm geolocalização, o que explica que haja sido adotado pelo Hezbollah, como um sistema menos suscetível a espionagem e, até aqui, a atentados.

Segundo o portal de notícias norte-americano Axios, a operação de detonação de pagers no Líbano foi aprovada durante reuniões entre o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, membros de seu gabinete e chefes de segurança, de acordo com fontes sob anonimato.

As explosões de pagers ocorrem após o gabinete de Israel ter votado, na segunda-feira (16), para adicionar outro objetivo à guerra em curso: garantir o retorno seguro de 90 mil moradores de comunidades na fronteira com o Líbano para suas casas, que tiveram de abandonar e estão há um ano alojados provisoriamente em Tel Aviv e outras cidades, devido a pequenos ataques pelo Hezbollah na fronteira norte, em ação de desgaste solidária aos palestinos sob genocídio em curso a perto de um ano.

Ao Axios, o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Matthew Miller, asseverou que os EUA “não estavam envolvidos” na série de explosões de pagers no Líbano e “não estavam cientes” de nenhum ataque com antecedência, acrescentando que Washington “ainda está coletando informações” sobre o “incidente”.  

Conforme Miller, é “muito difícil obter uma resolução diplomática no norte sem uma resolução para o conflito em Gaza, sem um cessar-fogo em Gaza, e é por isso que continuamos a pressionar por esse cessar-fogo”, mas acrescentou que não queria “prejulgar o que diremos nos próximos dias”.

Para não perder o costume de, no mínimo aliviar Israel e apoiar o vale-tudo nazi-israelense, Miller projetou o terrorismo de Estado do regime de Netanyahu sobre a resistência libanesa, dizendo que “terroristas são alvos legítimos”.

O ataque ocorreu um dia depois que o enviado dos EUA, Amos Hochstein, visitou Israel para supostamente alertar Netanyahu contra a escalada no Líbano. Várias horas após as explosões no Líbano, o chefe do Pentágono, Lloyd Austin, falou com seu homológo israelense, Yoav Gallant, por telefone sobre a situação.

O secretário Austin “reiterou a necessidade de um cessar-fogo [em Gaza] e um acordo de reféns e a importância de reduzir as tensões por meio da diplomacia para evitar o potencial de um conflito regional mais amplo”, disse o porta-voz do Pentágono, major-general Pat Ryder, a jornalistas. Ele acrescentou que “não há mudança na postura das forças dos EUA” no Oriente Médio após os ataques mortais no Líbano.

De acordo com o Middle East Eye, Netanyahu não esconde “que está buscando uma guerra em grande escala com o Hezbollah”.

“Acho que Hochstein foi enviado para lá porque [Washington] deve ter tido alguma indicação de que Israel estava pensando sobre isso”, disse o ex-funcionário de defesa do governo Reagan, Lawrence Korb, ao Middle East Eye.

Para ele, “esta [nova frente] é de mão única. O Irã tem muito mais influência com o Hezbollah do que com o Hamas”.

A coordenadora especial da ONU para o Líbano, Jeanine Hennis-Plasschaert, afirmou que “os desenvolvimentos de hoje marcam uma escalada extremamente preocupante no que já é um contexto inaceitavelmente volátil”.

Lembrando a seção sobre ataques indiscriminados das Convenções de Genebra de1949, o antropólogo e pesquisador Philip Proudfoot postou:

“Só para esclarecer: Israel causando a explosão de milhares de pagers em todo o Líbano – sem nenhum meio de fingir saber quem estava segurando o dispositivo naquele momento específico, ou onde eles estavam, ou possíveis danos colaterais – é, como seria de esperar, um grave crime de guerra.

Fonte: Papiro